Fica difícil não relacionar, dadas as devidas proporções, o relato de Tucker May, marido norte-americano da cineasta capixaba Barbara Marques, sobre a prisão dela há cerca de duas semanas pelo Serviço de Imigração (ICE) dos Estados Unidos, com o filme que venceu o Oscar de Melhor Filme Estrangeiro neste ano, o brasileiríssimo "Ainda Estou Aqui".
Tão assustador quanto ver a cena em que Rubens Paiva, interpretado por Selton Mello, é tirado do seio familiar sem nenhuma explicação e levado para a prisão — e desde então nunca mais foi visto com vida — é saber que Barbara teria sido sorrateiramente tirada de perto do marido e da advogada, durante uma entrevista do processo de pedido de residência permanente, para só então saber que estava sendo presa. Como diz a reportagen da BBC Brasil, Barbara foi – e nunca voltou. Mas há de voltar.
As situações mostram contextos, épocas e lugares diferentes, mas se encontram na violação de direitos e na perda de garantias que são basilares da democracia. É o devido processo legal que está, ao que tudo indica, sendo negado não só à capixaba, mas aos imigrantes que estão sofrendo detenções e deportações em massa sem direito à defesa. Os EUA têm o direito de aplicar suas regras, mas precisam também garantir direitos fundamentais a quem acusa.
Não entramos aqui obviamente no mérito da imigração ilegal, uma violação civil nos EUA, mas na forma arbitrária como as medidas estão sendo tomadas. O motivo da detenção teria sido a ausência da cineasta em uma audiência de regularização de visto em 2019, o que teria gerado uma ordem de deportação. Sua defesa alega que não houve notificação sobre a audiência e que Barbara deveria ter recebido um prazo de 30 dias para resolver a pendência.
É espantoso saber que ela foi levada para uma sala, sem saber que seria presa. É espantosa a transferência para prisões em estados distantes no país, sem paradeiro certo, impedida de se comunicar com sua defesa. E isso mesmo sendo ela casada com um cidadão norte-americano, o que dá a dimensão do desrespeito que pode estar sendo cometido com quem não tem o mesmo vínculo.
O mínimo que se espera é saber o que está acontecendo, sem medidas desproporcionais. O governo brasileiro, por meio do Itamaraty, deve pedir explicações sobre o tratamento recebido pela cidadã brasileira e fornecer o devido amparo legal.
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