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Números da Secom contradizem Wajngarten sobre verbas para TVs

Números da Secom contradizem Wajngarten sobre verbas para TVs

Como mostrou série de reportagens da Folha de S.Paulo, na gestão de Wajngarten a secretaria tem privilegiado TVs alinhadas com o governo Jair Bolsonaro na distribuição de verbas

Publicado em 10 de fevereiro de 2020 às 19:35

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Fabio Wajngarten, secretário especial de Comunicação Social (Secom) da Secretaria de Governo da Presidência. (Marcelo Camargo/Agência Brasil )

O chefe da Secom (Secretaria de Comunicação Social da Presidência), Fabio Wajngarten, disse em entrevista divulgada na madrugada desta segunda-feira (10) que a discrepância na distribuição de verbas publicitárias para TVs abertas se deve ao fato de a Globo, líder de audiência, não fazer merchandising para governos (propaganda inserida em programas), o que a difere das concorrentes. 

Os números da própria secretaria, no entanto, contradizem a afirmação. 

O merchandising foi usado pelo governo Jair Bolsonaro na campanha da reforma da Previdência, feita em fases. Na primeira, veiculada entre fevereiro e abril do ano passado, o investimento nesse formato de publicidade correspondeu a 5% do total destinado às emissoras.

Na segunda, aprovada pela equipe de Wajngarten e que foi ao ar entre abril e julho, o percentual foi de 25%. Os dados constam dos planos de mídia da campanha, obtidos pelo jornal Folha de S.Paulo.

Os números mostram que, mesmo quando se desconsidera o valor pago em merchandising, canais de menor audiência ficaram com mais dinheiro do que a emissora da família Marinho.

Como mostrou série de reportagens da Folha de S.Paulo, na gestão de Wajngarten a secretaria tem privilegiado TVs alinhadas com o governo Jair Bolsonaro na distribuição de verbas.

Record e Band, duas das mais beneficiadas com o rateio, são contratantes da FW Comunicação, empresa privada que o secretário mantém em paralelo à atividade pública. Já o SBT foi cliente da empresa até o primeiro semestre do ano passado.

O merchandising foi direcionado a apresentadores que têm a simpatia de Bolsonaro e frequentemente são escolhidos por ele para dar entrevistas e divulgar dados positivos de sua gestão. É o caso de Ratinho (SBT) e José Luiz Datena (Band).

Questionado sobre as disparidades na distribuição de recursos, Wajngarten justificou: "Quando da reforma da Previdência, a gente utilizou um formato de publicidade que é o merchandising". "Esse fator, dentre outros fatores, foi causado porque a emissora líder não permite na sua política comercial a utilização de seus apresentadores e membros de seu cast em campanhas de utilidade pública."

A declaração foi dada em entrevista de Wajngarten ao programa Poder em Foco, do SBT.

A Globo faz o merchandising apenas para clientes privados. Na primeira fase da campanha, houve investimento de R$ 255,1 mil em merchandising. No total, as TVs receberam R$ 5 milhões.

Na segunda fase, Globo, Record, SBT, Band, Rede TV! e TV Brasil receberam R$ 16,9 milhões, dos quais R$ 4,3 milhões para testemunhos elogiosos dos apresentadores à nova Previdência. 

O investimento em propaganda nos intervalos comerciais foi de R$ 12,3 milhões. A Globo recebeu R$ 2,6 milhões, menos que Record (R$ 4,7 milhões) e SBT (R$ 3,6 milhões), embora tenha mais audiência que as duas concorrentes somadas.

Na entrevista, o chefe da Secom admitiu ter pensado em sair do cargo depois de as reportagens da Folha de S.Paulo, publicadas a partir de 15 de janeiro, mostrarem que ele se mantém como sócio da FW, com 95% das cotas, e que a empresa recebe dinheiro de TVs e agências de publicidade contratadas pelo órgão que ele comanda, ministérios e estatais.

"Pensei. Não estou pensando mais e nunca considerei desistir", disse Wajngarten. "Sabe por quê? Porque eu tenho muito orgulho do presidente, um presidente que supera uma facada, três cirurgias e, mesmo assim, governa e saiu vitorioso de uma eleição tão combativa. Que direito eu tenho de desistir?"

Ele voltou a se dizer perseguido pela Folha de S.Paulo e sugeriu que, ao fim de investigações de que é alvo, o jornal doe recursos a instituições de caridade.

O secretário é investigado pela Polícia Federal, a pedido do Ministério Público Federal em Brasília, por suspeitas de corrupção, peculato (desvio de recursos por agente público) e advocacia administrativa (patrocínio de interesses privados na administração pública).

Também é alvo de processo administrativo no TCU (Tribunal de Contas da União), que mira os critérios de distribuição de recursos. A Comissão de Ética Pública da Presidência avalia o caso dele por possível conflito de interesses.

Na entrevista, Wajngarten repetiu os argumentos de sua defesa e garantiu que seguiu todas as determinações da Presidência, pois se afastou de atividades gerenciais na FW. Na avaliação dele, não há nenhuma relação entre os serviços prestados por sua empresa e as atividades que realiza na Secom. 

"Nunca tive um processo em 44 anos de vida. Nunca entrei em um tribunal", ressaltou, após lembrar que foi convidado para o cargo por Bolsonaro por causa do seu histórico profissional.

Wajngarten usou o argumento do orçamento restrito do governo para justificar os investimentos da Secom. Questionado se não seria mais eficaz, mesmo com o orçamento minguado, usar os veículos com mais abrangência, o secretário reagiu: "Todos os veículos abrangem de forma similar".

Ele usou uma metáfora para explicar sua linha de pensamento. Disse que é possível cobrir toda uma mesa com um tapete persa, mais caro, ou com pedaços de tapetes mais baratos, o que seria mais econômico. "Você terá o mesmo efeito, com gasto menor."

Após definir as críticas feitas à sua gestão pela mídia como levianos, ele insinuou, sem dar nomes, ser vítima de chantagens. "Muitos tentaram fazer isso. Tentam coagir através de ataques contínuos. Isso não será tolerado e isso não nos abalará."

Wajngarten disse ainda que a regionalização e a descentralização estão no centro da política de comunicação do governo Bolsonaro e isso explicaria as decisões sobre uso dos recursos da Secom.

Na campanha da reforma, no entanto, o critério da regionalização, usado a título de baratear a publicidade, foi usado apenas para a Globo. O secretário sustentou que o mercado publicitário está satisfeito com a sua presença no cargo. 

"Para o mercado publicitário, que conhece a minha reputação, a história de vida, a história profissional da minha empresa, 100% está do meu lado", disse. 

Os ataques de Bolsonaro a jornalistas foram minimizados pelo secretário. Na opinião dele, o presidente age com agressividade porque é alvo de críticas o tempo todo, assim como seus filhos, irmão e ministros. "A gente vive a era da manchete escandalosa, em busca do clique a qualquer custo", opinou. 

Ainda durante a entrevista, o secretário elogiou a atriz Regina Duarte, nomeada para a Secretaria Especial da Cultura, e também Roberto Alvim, que ocupava o cargo antes do escândalo provocado por um vídeo em que copiou frases de Joseph Goebbels, ministro da Propaganda da Alemanha nazista.

"Regina é uma amiga, dispensa apresentações. Vai trazer muita coisa boa para o governo Bolsonaro", disse. "Alvim errou sem intenção. Reitero que ele é boa pessoa e não teve a intenção de agredir ninguém com aquele vídeo."

Sobre seus próximos passos, o secretário revelou que há a intenção de unificar as estratégias de comunicação no governo federal. "A comunicação tem que ser uniforme e robusta. Não adianta um ministro caminhar para um lado e outro ministro caminhar para outro."

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Ele não revelou detalhes sobre essa unificação, disse apenas que há previsão de reuniões semanais entre os diversos órgãos para alinhar a comunicação.

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