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É advogada especialista em Direito Corporativo e sócia do escritório Cavagni, Penner, Pimentel & Veloso Law

Pejotização no Supremo: é o fim da hipossuficiência presumida?

Apesar de parecer, por um olhar histórico de hipossuficiência do trabalhador, que a visão insistente e sistematicamente adotada pela justiça trabalhista brasileira seja benéfica, ela representa, na prática, um risco para nossa economia

  • Katharina Pinto Guimarães É advogada especialista em Direito Corporativo e sócia do escritório Cavagni, Penner, Pimentel & Veloso Law
Publicado em 03/05/2025 às 10h00

No dia 14 de abril de 2025, o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Gilmar Mendes determinou, em razão do reconhecimento da repercussão geral, a suspensão de todos os processos, individuais e coletivos, em âmbito nacional que versem sobre a controvérsia da pejotização.

Em um breve regresso aos idos de 2018, quando o STF analisou a constitucionalidade da terceirização de atividade-fim e de atividade-meio por meio da ADPF nº 324, de relatoria do ministro Roberto Barroso, restou sedimentado o entendimento de que é lícita a terceirização de toda e qualquer atividade, meio ou fim, não se configurando relação de emprego entre a contratante e o empregado da contratada desde que verificada a idoneidade da relação contratual e a capacidade econômica do contratado – terceirizado. No referido julgamento restou também definido ser de competência da contratante a opção pela terceirização, respondendo esta subsidiariamente pelo descumprimento das normas trabalhistas, bem como por obrigações previdenciárias.

A ADPF foi um marco histórico ao reconhecer a licitude da contratação de trabalhador autônomo ou pessoa jurídica para a prestação de serviços, a chamada “pejotização”, dado o histórico protecionista da Justiça do Trabalho brasileira, que tendia – ou tende? - a reconhecer vínculo trabalhista em toda e qualquer relação contratual em que haja entre as partes atividades laborais.

Fachada do prédio do Supremo Tribunal Federal (STF)
Fachada do prédio do Supremo Tribunal Federal (STF). Crédito: Valter Campanato/Agência Brasil

Não é novidade no meio jurídico e empresarial brasileiro a tendência da Justiça do Trabalho à presunção de hipossuficiência e o consequente reconhecimento de vínculo trabalhista entre as partes em quase todo modelo de contratação.

Todavia, o STF trouxe um novo olhar para essas relações desde o julgamento da ADPF 324, em 30 de agosto de 2018, trazendo uma diretriz, de observância obrigatória, aos órgãos julgadores trabalhistas no sentido de reconhecer a constitucionalidade de vínculos de prestação de serviço por autônomos e pessoas jurídicas sem que se caracterize vínculo trabalhista.

Nesse sentido. vale mencionar que a ADPF - Ação de Descumprimento de Preceito Fundamental - é um instrumento jurídico previsto na Constituição Federal Brasileira que permite ao STF atuar como guardião dos princípios mais essenciais da ordem constitucional, e seu entendimento deve valer como orientação a todas as instâncias julgadoras em território nacional, representando o entendimento máximo de nossos tribunais sobre a matéria em discussão.

Ocorre que a Justiça do Trabalho vem sistematicamente contornando o entendimento sedimentado pelo Supremo e reconhecendo vínculo trabalhista de forma quase automatizada em contratos de prestação de serviço por meio de pessoas jurídicas e autônomos.

Esse cenário, como bem destacou o ministro Gilmar Mendes, configura um “descumprimento sistemático da orientação do Supremo Tribunal Federal pela Justiça do Trabalho e  tem contribuído para um cenário de grande insegurança jurídica, resultando na multiplicação de demandas que chegam ao STF, transformando-o, na prática, em instância revisora de decisões trabalhistas”.

Assim, para interromper esse embate entre a orientação do Supremo Tribunal Federal consolidado por meio da ADPF 324 e o entendimento dos julgadores da esfera trabalhista, o ministro se valeu da faculdade que lhe é reservada, na qualidade de relator, à luz do art. 1.035, § 5º, do CPC, nos autos do Recurso Extraordinário com Agravo 1.532.603, para suspender os julgamentos sobre a temática em âmbito nacional para, reconhecida sua repercussão geral, dar fim a esse conflito de entendimentos.

O que os contratantes, desde pequenas empresas aos grandes grupos, esperam é que a insegurança jurídica gerada por uma visão protecionista – ou poderíamos dizer paternalista? - da nossa Justiça do Trabalho, que trabalha com um conceito próximo à presunção de ilicitude seja finalmente freado. E que, assim, a legítima e regular contratação de trabalhadores autônomos ou pessoas jurídicas para a prestação de serviços seja realizada sem tantos riscos e casos isolados de fraudes sejam tratados, devidamente, como exceções e não regra.

Apesar de parecer, por um olhar histórico de hipossuficiência do trabalhador, que a visão insistente e sistematicamente adotada pela justiça trabalhista brasileira seja benéfica, ela representa, na prática, um risco para nossa economia, pois sem segurança jurídica não há empresa que sustente seu crescimento.

Este texto não traduz, necessariamente, a opinião de A Gazeta.

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