Até o momento que concluímos este artigo, a crise comercial entre o Brasil e os Estados Unidos ainda não apresenta um caminho claro de diálogo e construção de alternativas. Pior, assistimos a uma escalada da polarização da política local, num momento em que precisamos de unidade para defender o interesse nacional, nossas empresas, o emprego e a vida da nossa gente.
Deflagrada por uma carta do presidente Donald Trump, em 9 de julho, direcionada ao presidente Lula anunciando tarifas de 50% sobre todos os produtos brasileiros a partir de 1º de agosto, a crise escalou com a abertura de uma investigação com base na Seção 301 da Lei de Comércio Americana, envolvendo temas diversos como etanol, comércio digital e o PIX, desmatamento ilegal, medidas anticorrupção, propriedade intelectual (citando explicitamente a Rua 25 de Março), além de tarifas consideradas injustas e preferenciais.
A elevação das tarifas norte-americanas pesará fortemente sobre o Espírito Santo. Temos um grau de abertura para o comércio exterior superior à média nacional. Somos o segundo estado brasileiro que mais exporta para os EUA. Cerca de 28,5% das nossas exportações são destinadas para lá. Na última terça-feira, nosso governo instituiu um grupo de trabalho para avaliar os impactos e medidas mitigadoras para economia capixaba.
Diversos arranjos econômicos estão sendo afetados. Siderurgia, celulose, café, gengibre, pimenta do reino, frutas, macadâmia, pescado e rochas ornamentais que são segmentos importantes da nossa economia, por serem grandes geradores de trabalho e emprego para os capixabas.
Grande parte desses arranjos são liderados, no caso do agro, pela produção familiar, e nas rochas ornamentais, por um vasto número de pequenas e médias empresas. Em 2024, mais de 65% dos produtos industrializados do setor de rochas ornamentais tiveram como destino os EUA. O segmento argumenta ter cerca de 1.500 contêineres prontos para serem embarcados, mas as operações foram suspensas pelos clientes até uma definição clara desse conflito.
Os impactos setoriais também devem ser sentidos de forma aguda em diversos dos nossos municípios. Serra e Aracruz, em função da siderurgia e da indústria de celulose, Cachoeiro de Itapemirim e Nova Venécia, em função das rochas ornamentais, e em diversos municípios que sediam arranjos produtivos de pequenos produtores. É o caso do gengibre em Santa Leopoldina, Santa Maria de Jetibá e Domingos Martins. Cerca de 40% da produção da raiz é exportada para os Estados Unidos e com a manutenção do conflito esses municípios vão sofrer com perda de arrecadação e desemprego.
O que mais chamou atenção na iniciativa norte-americana foi a ausência de fundamentos econômicos que justificassem tais medidas. A balança comercial deles com o Brasil é superavitária e não o contrário. Desde 2009 as exportações norte-americanas são maiores que as importações.
O tema tem monopolizado o debate nacional, multiplicando as análises mais profundas sobre as possíveis causas dessa radicalização, da posição americana em relação ao Brasil. O que nós precisamos é de uma defesa intransigente da nossa soberania, conciliando com o pragmatismo comercial. Nada além disso!
O radicalismo, as ideologias, a polarização sem limites e até mesmo a utilização desse conflito como escalada eleitoral é um desserviço aos interesses da população brasileira e capixaba.
De um lado o governo federal errou ao não construir pontes com o governo Trump e agora a radicalização ideológica ameaça empresas, empregos e o próprio desenvolvimento nacional e capixaba. O interesse do povo, da sociedade e do bem público precisa estar acima das ideologias. Nossas escolhas coletivas devem contemplar a escuta de diferentes visões e estar sempre baseadas nos fatos e no conhecimento que temos da realidade.
Por determinação do governador Renato Casagrande, ao lado de outros colegas do governo, vamos coordenar grupo de trabalho que vai diagnosticar os reflexos dessas medidas em nossa economia, avaliando extensão e impactos. Estamos em movimento agindo preventivamente, em linha com os segmentos empreendedores, para medidas mitigadoras. Na segunda-feira (28) estão programadas rodadas de diálogos com os setores do agro e de rochas.
Três coisas julgo inegociáveis nesse debate: o equilíbrio das contas públicas do Espírito Santo e a manutenção da capacidade de investimentos do nosso governo, assim como o nosso desenvolvimento.
A ideologia sem limites pode nos levar, fatalmente, ao abismo.
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