Joaquin Phoenix pode levar o Oscar este ano por sua atuação brilhante em Coringa, que tem como marca uma gargalhada meio sinistra. Pela primeira vez, o famoso vilão é retratado como alguém que sofre um problema de saúde caracterizado por risos incontroláveis - algo que ele mesmo tenta explicar para as pessoas que presenciam as crises. Ou seja, não seria por pura maldade.
Mas o que seria essa doença capaz de causar surtos de risadas sem razão alguma? Especialistas diversos começaram a especular as razões. Seria um transtorno mental? Um distúrbio neurológico? Há quem afirme que seja um tipo raro de epilepsia.
O neurocirurgião Alexandre Teixeira dos Santos é mais dessa linha, aventada por outros especialistas mundo afora, e acha que um problema provável que pode acometer o personagem do filme seja a chamada epilepsia gelástica. É um tipo de epilepsia muito raro. Nunca atendi nenhum caso. Mas a pessoa tem crises que podem durar segundos ou se perpetuar por minutos, uma risada um tanto quanto perturbadora e compulsiva. Ela fica rindo de forma repetitiva, descontrolada. É como uma epilepsia parcial, pois não há perda de consciência. Ela só ri, não consegue falar, explica o médico.
É algo difícil de diagnosticar e pode ser confundido com qualquer problema psiquiátrico. "Não se sabe a hora em que a pessoa vai ter a crise. Nem sempre vai ser na frente do médico para que seja feito o diagnóstico", afirma o neurocirurgião.
Em caso positivo, o Coringa poderia buscar ajuda. "Seria possível tratar com anticonvulsivos orais que não vão curar o problema, mas vão mantê-lo sob controle", comenta ele.
De acordo com o neurologista Leonardo Maciel, outra hipótese levantada seria de transtorno de afeto pseudobulbar, que seria um problema derivado de outros, como lesão cerebral, AVC, doenças neurodegenerativas etc. É um quadro associado ou decorrente de uma doença primária, geralmente neurológica e grave, progressiva ou sequelar, diz.
No transtorno de afeto pseudobulbar, ocorre choro inconsolável e infundado, ou menos frequentemente, risos incontroláveis, e muitas vezes os dois alternados.
De qualquer forma, aponta o médico, o riso não tem relação com o humor do paciente.
Para Maciel, a risada patológica de Arthur Fleck pode ainda ter como motivo a síndrome de Tourette, um distúrbio de movimento e neurocomportamental comum em crianças que pode persistir no adulto, caracterizado por múltiplos tiques motores e vocais.
Nele, a pessoa pode sofrer de condições como transtorno de deficit de atenção e hiperatividade, transtorno obsessivo-compulsivo e outros problemas comportamentais e psicossociais. Pode ter, por exemplo, ataques de raiva, com linguagem obscena ou gestos. Lembro que no filme há cenas em que o Coringa aparece xingando pessoas do nada, comenta o neurologista.
A hipótese de uma síndrome epiléptica é interessante, segundo ele. No entanto, há dúvidas A citada epilepsia gelástica é uma doença rara. Tem esses ataques de riso incontroláveis e sem motivo aparente. Mas também apresenta outros tipos de crises e comprometimento mental progressivo. Após os ataques, os pacientes tendem a se queixar de fraqueza e ficam confusos, que não é o caso. E na maioria das vezes, crises epilépticas são paroxísticas, isto é, sem um fator desencadeante, mesmo sob as situações e estresse psicológico por que passa o personagem, destaca Maciel.
Mas o que deve haver mesmo com o Coringa, na visão do neurologista, é uma junção de quadros patológicos.
Seria muito interessante se pudéssemos nomear uma única doença para o personagem. Isso implicaria que poderíamos ter uma cura, tratamento ou pelo menos um paliativo. Ou mesmo poderíamos determinar o prognóstico, para onde ou até onde o personagem vai. Mas na minha opinião a licença poética permitiu aos roteiristas adicionar sintomas neurológicos de doenças degenerativas a um quadro psicótico ou perverso. Acho que é uma junção entre um quadro neurológico e uma psicopatia em progressão, por sinal, muito bem escalonada, apesar de não ser minha área e de haver muitas críticas de colegas psiquiatras, observa o especialista.
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