O Ministério Público do Espírito Santo (MPES) instaurou um inquérito para apurar o arquivamento do projeto de resolução que reduzia o número de assessores de gabinete na Câmara de Vitória. A proposta havia sido aprovada, em maio de 2020, pelos vereadores em plenário e aguardava apenas a redação final para a publicação da nova regra. O texto, no entanto, foi "enterrado" por duas vezes em dezembro pela legislatura passada.
Na portaria de instauração do inquérito civil, publicada na segunda-feira (11), o MPES informa que o questionamento sobre a ação do Legislativo foi apresentado no sistema de Ouvidoria do órgão e determina que um ofício deve ser expedido à presidência da Câmara da Capital, para que se manifeste sobre o arquivamento da proposta.
O MPES também pede que a Casa encaminhe cópia de todos os documentos relativos à resolução que reduziria a verba estipulada para o gabinete de vereadores, bem como o número de cargos comissionados por gabinete. O inquérito tramita na Promotoria de Justiça Cível de Vitória.
Aprovado em maio, o projeto previa que o número de assessores de gabinete seria reduzido de 15 para oito. Na ocasião, foi divulgado pelos vereadores como a principal medida de contribuição da Câmara para poupar recursos diante da pandemia de Covid-19.
Sete meses depois, sem a publicação da redação final, que faria valer a medida, o presidente da Casa na época, Cleber Felix (DEM), arquivou o projeto, justificando que uma emenda substitutiva teria inviabilizado a proposta.
Na última sessão do ano passado, após pressão da sociedade civil, o presidente desarquivou a proposta. Mas vereadores se ausentarem e, por falta de quórum, o requerimento de urgência para análise da redação final não foi analisado.
Um dos autores do projeto de redução de assessores de gabinete, o ex-vereador Roberto Martins (Rede) afirmou que o arquivamento do texto pela Câmara foi um "escárnio" com a sociedade e que a investigação do MPES traz "esperança".
"É um sopro de esperança. O arquivamento do projeto representou um escárnio com a opinião pública, e uma ilegalidade que ameaça a própria democracia. Um projeto aprovado pela maioria dos vereadores não poderia ser arquivado pelos presidentes (da gestão passada e desta gestão)", disse.
O ex-vereador chegou a publicar o projeto, no último dia do ano passado, em um jornal de circulação no Estado, na tentativa de que pudesse se tornar válido. Já na atual legislatura, a Procuradoria da Câmara entendeu que a resolução que reduziria o número de assessores para oito não tem validade e os gabinetes, portanto, podem ter 15 comissionados.
Procurada por A Gazeta para se manifestar sobre o inquérito, a Câmara de Vitória, comandada agora por Davi Esmael (PSD), citou o parecer da Procuradoria e informou que a manifestação precisa ser feita pela antiga gestão.
Questionado, o ex-presidente da Câmara, Cleber Felix, disse que está à disposição do MPES para esclarecer qualquer dúvida e afirmou que só vai se manifestar sobre o tema à imprensa se receber alguma notificação do órgão porque "ainda não sabe do que se trata".
Para obter mais detalhes sobre quanto tempo o inquérito deve durar e quais são os próximos passos, a reportagem também acionou o MPES, que não respondeu à demanda até a publicação deste texto.
O projeto, de autoria dos então vereadores Roberto Martins (Rede) e Mazinho dos Anjos (PSD), tramitava desde 2019. A proposta era reduzir o número de assessores de gabinete de 15 para 10.
O texto foi aprovado no início de maio de 2020, por oito votos a quatro, com uma emenda do então vereador Max da Mata (Avante), que passava para oito o número de comissionados.
Os contrários foram Dalto Neves (PDT), Luiz Paulo Amorim (PV), José Amaral (Podemos) e Neuzinha de Oliveira (PSDB). Dos que votaram contra, apenas Dalto e Luiz Paulo Amorim foram reeleitos.
Também foi aprovada, na ocasião, uma emenda do vereador Davi Esmael (PSD), para que houvesse a obrigação de que metade dos assessores tivessem nível superior.
A projeção era de corte de 105 assessores na Câmara, gerando uma economia de R$ 2,5 milhões.
De acordo com o projeto, a verba anual de gabinete de todos os vereadores representa um gasto de R$ 7,1 milhões em salários, somados a R$ 11,5 mil por mês de auxílio-alimentação.
Os assessores de gabinete são cargos comissionados, portanto de livre nomeação de cada vereador, para atuar auxiliando o mandato de cada um deles.
O arquivamento do projeto é considerado ilegal por juristas ouvidos pela reportagem de A Gazeta. De acordo com eles, essa atitude não poderia ter sido tomada após a aprovação do texto em plenário.
"A atribuição para manifestar pela validade e constitucionalidade de uma matéria é da Comissão de Constituição e Justiça", afirmou o advogado constitucionalista Cláudio Colnago na ocasião do primeiro arquivamento. Como o projeto já havia passado até pelo plenário da Casa, composto por todos os vereadores, o ciclo já estava completo.
"Uma vez aprovado, o processo legislativo deve ser promulgado. A partir dessa promulgação, caso constatado vício, poderia imediatamente se fazer uma outra resolução para revogar essa anterior, ou utilizar os mecanismos judiciais, acionando o Judiciário", explicou, na época, o professor de Teoria da Constituição na FDV, Anderson Sant'Ana Pedra.
Notou alguma informação incorreta no conteúdo de A Gazeta? Nos ajude a corrigir o mais rapido possível! Clique no botão ao lado e envie sua mensagem
Envie sua sugestão, comentário ou crítica diretamente aos editores de A Gazeta