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'A pandemia convocou de volta as forças tradicionais da política', diz cientista político

"A pandemia convocou de volta as forças tradicionais da política", diz cientista político

Antonio Lavareda avalia que os eleitores vão se importar menos com os partidos e mais com o perfil dos candidatos, considerando, principalmente, a experiência deles, o histórico e a confiabilidade. Leia a entrevista

Publicado em 15 de novembro de 2020 às 05:02

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Antonio Lavareda é sociólogo e cientista político
Antonio Lavareda é sociólogo e cientista político. (Divulgação)

Em um ano marcado pela pandemia de Covid-19,  as eleições de 2020 acontecem de forma atípica neste domingo (15). Com mudanças no calendário eleitoral, foi uma campanha curta e repleta de restrições – muitas delas ignoradas pelos candidatos –colocando em evidência a liderança dos atuais gestores. 

Para o sociológo e cientista político Antonio Lavareda, esse cenário deve impactar o resultado nas urnas, favorecendo a reeleição de prefeitos e o retorno de lideranças políticas tradicionais. É uma situação que difere dos últimos pleitos, quando o sentimento antipolítico prevaleceu.

Em entrevista para A Gazeta, Lavareda analisa o pleito deste ano, explica as mudanças no sentimento do eleitor e como a pandemia se sobrepôs à polarização política. Confira abaixo:

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    A principal tendência volta aos olhos para figuras tradicionais da política e/ ou figuras que estão no poder. Podemos incluir tanto os próprios prefeitos que tentam reeleição quanto seus indicados, que surfam na avaliação de gestores bem avaliados. De acordo com as pesquisas, devemos ter uma reeleição de 75% de prefeitos nas capitais. Vemos também ex-prefeitos se destacando, e políticos com experiência em algum mandato. As eleições de 2020 serão eleições mantenedoras, em que, a despeito de uma ou outra alternância, se mantém o padrão nas prefeituras.

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     Sim, completamente. As eleições de 2016 e 2018 têm em comum, na tipologia da Ciência Política, o fato de serem eleições críticas, que promovem o inusual e um importante deslocamento de preferências do eleitorado. Em geral, essas eleições são motivadas pela combinação de alguns fatores como crise econômica, acirramento de posições ideológicas e impulsionamento de forças não tradicionais na composição política eleitoral. A gente viu isso começar em 2016, em Belo Horizonte, por exemplo, com a eleição do [Alexandre] Kalil (PSD), em São Paulo, com o [João] Doria (PSDB), candidatos que se colocavam como outsiders e que desalojaram o PT de grandes centros. Em 2020, nós, cientistas políticos, achávamos que teríamos mais uma eleição como parte desse ciclo crítico, já que a crise econômica continuava e a polarização ideológica também, estimulada pelo presidente. Mas não é isso que as pesquisas nos indicam. As novidades estão sem espaço e não estamos assistindo a nenhum traço da polarização de 2018.

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    A pandemia exerceu um papel de contraposição a todos esses fatores. A crise sanitária e econômica chamou a racionalização do debate, objetivou mais as disputas e convocou de volta as forças tradicionais da política. Ela esmaeceu, diminuiu e secundarizou a polarização ideológica das batalhas eleitorais que vimos nos últimos pleitos, o que levou à eleição de Jair Bolsonaro (sem partido) em 2018. A pandemia permitiu a quem estava no poder se manter em evidência, constituiu, aos olhos do eleitorado, lideranças que às vezes não apareciam tanto. Isso também impediu que muitos grupos políticos se articulassem.

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    Em todos os lugares, há candidatos que buscam uma identificação com o presidente e exploram isso, independentemente do partido. Eles exploram valores e retóricas semelhantes aos de 2018, mas isso destoa do foco do eleitor neste ano, não cabe no momento. Aquela paixão exacerbada, o sentimento antipolítico que a gente viu em 2018 está esvaziado em 2020. E o que vemos é que quem tem feito uso desse discurso, no geral, vai ter um desempenho pífio nas urnas. O sentimento do eleitor é outro.

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    O primeiro olhar é "eu vou ficar com esse candidato porque ele fez", e há um segundo olhar de medo também, de apostar em pessoas novas. O que eu percebo é que, neste ano, os eleitores vão se importar menos com os partidos e mais com o perfil dos candidatos, considerando, principalmente, a experiência deles, o histórico, a confiabilidade. Por isso, vemos um cenário favorável para prefeitos que tentam a reeleição e para políticos que já exerceram mandatos em algum momento.

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    Cada eleição constitui uma batalha entre os partidos e é movida por sentimentos diferentes. Óbvio que as eleições municipais são intermediárias, em meio de mandato, e de uma forma dialogam com as eleições que passaram e as que virão. Isso não faz com que seja uma decorrência, mas tem uma influência. Em 2016, por exemplo, a derrota do PT nas prefeituras antecipou o que veríamos em 2018. As eleições municipais sinalizavam que o pêndulo da política andava para a direita, o que se confirmou com a eleição de Bolsonaro e de muitos governadores. Acredito que vamos ver um enfraquecimento do bolsonarismo nos próximos anos. Quanto ao PT, o partido deve ter um desempenho melhor neste ano, apesar de ainda bastante inexpressivo. Mas começa a tomar um certo fôlego e, se quiser crescer, vai ter que compartilhar o protagonismo da esquerda com outros partidos.

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    O fato de termos prefeitos experientes e já experimentados nas urnas pode ser visto, até certo ponto, como uma vantagem. Mas eles vão estar lidando com um desafio que nunca enfrentaram antes. Eles vão ter que ajudar a organizar as cidades para a fase de vacinação, que deve acontecer no ano que vem, e isso será complexo. Antes disso, há possibilidade desses gestores enfrentarem uma segunda onda do vírus quando assumirem. Há um desafio econômico muito grande, de reconduzir a atividade nas cidades durante os próximos anos. Vai ser um mandato com dificuldades do começo ao fim, onde não será possível fazer grandes mudanças nas cidades e exigirá responsabilidade. 

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