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Líder quilombola é preso em São Mateus e deputada denuncia tortura

Líder quilombola é preso em São Mateus e deputada denuncia tortura

Antonio Sapezeiro, de 41 anos, foi autuado em flagrante por dano ao patrimônio, ameaça, posse de drogas para consumo e provocar incêndio em mata ou floresta

Publicado em 30 de novembro de 2023 às 13:33

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Momento da abordagem policial à liderança quilombola de São Mateus foi gravado
Momento da abordagem policial a líder quilombola de São Mateus foi gravado. (Reprodução/Instagram)

Um líder quilombola foi preso na comunidade de Nova Vista I, em São Mateus, no Norte do Espírito Santo, na noite da última terça-feira (28). O caso se tornou público após a deputada estadual Iriny Lopes (PT) denunciar, por meio de um post em seu perfil no Instagram, que Antonio Sapezeiro, de 41 anos, foi torturado por seguranças da empresa Suzano, na presença de policiais militares. Segundo a Polícia Civil, o homem foi autuado em flagrante por dano ao patrimônio, ameaça, posse de drogas para consumo e provocar incêndio em mata ou floresta, e encaminhado a um presídio.

O local onde ocorreu a prisão fica na região de Sapê do Norte, área entre São Mateus e Conceição da Barra. No post, a parlamentar informou que Antonio, que recentemente havia passado por uma cirurgia na clavícula, foi atacado por um cachorro da empresa, depois teria sido jogado no chão, algemado e colocado no camburão para ser levado até a delegacia.

Ainda na publicação feita pela deputada há um vídeo que teria sido gravado por um companheiro de Antonio e que mostra um trecho da abordagem policial e da segurança da empresa. Iriny Lopes ressaltou na publicação que a comunidade é certificada pela Fundação Palmares e pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), “o que confere legitimidade à comunidade quilombola de retomada de suas terras”.

O que diz a PM

Segundo informações da PM, equipes foram acionadas para prestar apoio na área de uma empresa de celulose. Vigilantes relataram aos militares que o homem teria ateado fogo em pilhas de madeiras já cortadas e em plantações de eucalipto. Disseram ainda que ele teria também hostilizado funcionários de uma outra empresa, que estavam no local para conter um incêndio criminoso.

“No momento da chegada das guarnições, os militares visualizaram um homem alterado, que tentava agredir os funcionários da empresa, que para resguardar a própria integridade física realizaram o uso dos cães para impedir a ação do homem, que insistia em se aproximar dos vigilantes e dos cães. Em determinado momento, o indivíduo esticou o braço a fim de agredir os profissionais, sendo de imediato repelida a agressão pelo cachorro que atingiu o antebraço direito do homem”, informou a PM em nota.

A corporação informou que deu voz de abordagem ao indivíduo, que se negou a permanecer na posição de segurança, “sendo necessário fazer o uso de técnicas de imobilização para contê-lo. Posteriormente, ele foi algemado e colocado no compartimento de segurança da viatura”, afirmou.

A PM informou ainda que o homem, a todo momento, ameaçava a equipe de segurança, dizendo que iria matar os vigilantes, pois eles teriam acionado a polícia. De acordo com a corporação, em buscas pessoais, os policiais encontraram duas buchas de maconha.

Antonio foi encaminhado primeiramente ao Hospital Estadual Roberto Silvares, em São Mateus, e, após receber alta médica, foi levado para a Delegacia Regional do município.

O que diz a Suzano | Nota na íntegra

A Suzano informa que mantém equipes de vigilância patrimonial que atuam no monitoramento e segurança das áreas pertencentes à companhia. Os profissionais contratados para essa atividade são treinados e orientados para adotarem sempre uma abordagem educativa e orientativa e jamais agressiva, não usam armas de fogo e tem como premissa o acionamento das autoridades policiais competentes para tratamento de qualquer conduta criminosa. 

Foi o que ocorreu na noite da última terça-feira (28 de novembro), na comunidade de Nova Vista, em São Mateus, quando uma equipe de brigadistas da companhia foi impedida de atender a uma ocorrência de incêndios em área privada, pertencente à companhia, inclusive com a constatação de que uma das pessoas ateava fogo em um talhão florestal. 

A região sofre com o aumento significativo de incêndios, potencializados pela onda de calor, mas com fortes indícios de ação criminosa. No período de 27 a 29 de novembro, foram ao menos 17 focos de incêndio, atingindo entre áreas de plantio e áreas de preservação ambiental. 

Os profissionais da empresa foram ameaçados com arma branca e pedras, o que gerou o acionamento da força policial. Ao chegar ao local, a Polícia Civil que atendeu ao chamado juntamente com a Polícia Militar, presenciou uma tentativa de agressão contra os colaboradores da Suzano, realizando a abordagem e condução do suspeito. Já com relação à suposta agressão da guarda canina, as evidências demonstram que o cão, que tem objetivo de resguardar a integridade física do vigilante condutor, foi incitado e provocado pelo suspeito. 

A companhia tem atuado de forma colaborativa com as autoridades, se colocando à disposição e oferecendo todas as informações que dispõe no tratamento dessa e de outras ocorrências similares, que colocam em risco a sociedade local.

Destaca ainda a relevância de sua presença nas regiões onde atua, assim como a importância e os direitos legalmente constituídos das comunidades tradicionais. Esse relacionamento é direcionado por sua Política de Relacionamento com Povos Indígenas e Comunidades Tradicionais. 

Para isso, busca manter uma relação pautada no diálogo aberto, frequente e transparente, de maneira amigável e equilibrada. Especificamente no norte do Espírito Santo e na região de Nova Vista, mantém relacionamento constante com as lideranças da associação comunitária dessa comunidade e com as comunidades quilombolas vizinhas, que também tem se mobilizado contra os incêndios criminosos na região.

O que diz a comunidade quilombola

“Iniciamos um processo de retomada de terras que historicamente são nossas. A retomada é um manifesto que fazemos na nossa luta territorial, uma luta pela reparação de nossos direitos. A empresa fala que é um território dela, quando a gente alega que é nosso. 

Estamos tendo muita interferência da PM, PC e da segurança patrimonial da empresa, mas temos reconhecimento da Fundação Palmares e do Incra. Temos a nossa história nessas terras. Fazemos tudo de forma pacífica, com a plantação de banana e mandioca e também colocamos cercas. 

 O Antonio foi ao local após saber que estavam derrubando a cerca que colocamos. Ele foi falar para os vigilantes não quebrarem a cerca e lá tiveram um desentendimento. Ele ficou à flor da pele e levaram ele preso. Disseram que o Antonio estava colocando fogo, mas eles não tinham testemunhas.

O Antonio permanece preso no CDP de São Mateus. Tivemos a informação de que o juiz arbitrou uma fiança de R$ 2 mil. Estamos nos mobilizando para tentar juntar esse dinheiro e libertá-lo”

Natival da Conceição Aires - liderança da comissão do território quilombola do Sapê do Norte

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