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Publicado em 13 de maio de 2025 às 15:52
O conclave que resultou na eleição do papa norte-americano Robert Francis Prevost trouxe à memória do capixaba uma lembrança que aproxima o cardeal do Espírito Santo. Uma rua em Vitória homenageia um personagem com o mesmo sobrenome do pontífice – ou tenta homenagear, já que o nome foi redigido errado e segue assim há quase 80 anos.
Situada na Praia do Canto, a Rua Chapot Presvot ganhou esse nome em 27 de setembro de 1948, por meio da Lei nº 21, sancionada pelo prefeito da época, Ceciliano Abel de Almeida.
O nome faz uma homenagem ao cirurgião Eduardo Chapot-Prévost, responsável pela primeira cirurgia de separação de gêmeas siamesas do mundo, envolvendo duas capixabas. Ocorre que, na redação da lei, o sobrenome do médico foi escrito de forma diferente ao original, sem hífen e com a letra “s” em outro lugar, como explica o historiador Fernando Achiamé.
Fernando Achiamé
HistoriadorAntes, a via era chamada Cachoeiro de Itapemirim. As ruas do bairro tinham nomes de cidades capixabas nessa época, mas, depois da lei de 1948, passaram a homenagear personalidades.
Foi quando a Rua Santa Teresa passou a ser chamada Aleixo Neto; a Rua Alegre virou Constante Sodré; e a Rua Vila Velha ganhou o nome de Joaquim Lírio, entre outras alterações feitas na Capital.
Em 10 de setembro de 2007, uma nova lei foi sancionada em relação à rua, dessa vez, pelo então prefeito João Coser (PT), para tratar dos limites da via. Ficou estabelecido que o início seria na Avenida Saturnino de Brito, no bairro Praia do Canto, e o término, sem saída, após o cruzamento com a Rua Constante Sodré, no Barro Vermelho. O sobrenome, no entanto, não foi corrigido.
“Tem que recorrer a algum analogista para ver o parentesco do Eduardo Chapot-Prévost com o atual papa”, brinca o historiador.
Chapot-Prévost dá nome também a uma maternidade localizada na Zona Leste de Manaus, no Amazonas. A unidade hospitalar, diferentemente de Vitória, tem a grafia mais correta, com exceção do hífen, que também não foi colocado.
A ligação de Chapot-Prévost com o Espírito Santo não se restringe à cirurgia, segundo Fernando Achiamé, uma vez que o cirurgião chegou a morar em Vitória na adolescência.
“Os pais dele eram o cirurgião dentista Louis Chapot-Prévost, de nacionalidade francesa, e a belga Louisa Lend Chapot-Prévost. Ele nasceu em Cantagalo, na então província do Rio de Janeiro, em 1864, mas passou a adolescência aqui. Inclusive, estudou no Ateneu Provincial, no que chamamos hoje de segundo grau, onde hoje é a Escola Estadual Maria Ortiz, ao lado do Palácio Anchieta."
O historiador sugere que seja protocolado um novo projeto de lei para corrigir o nome da rua em Vitória.
Dá nova denominação a logradouros públicos.
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O cirurgião ganhou notoriedade mundial ao realizar, pela primeira vez na história, em 1900, na Casa de Saúde São Sebastião do Rio de Janeiro, uma cirurgia para separação de duas meninas toracoxifópagas.
“Maria e Rosalina eram capixabas, nascidas em Afonso Cláudio, e tinham 7 anos na época, ligadas pelo fígado. Foram levadas ao Rio de Janeiro porque eram parentes de um político importante da época, o deputado federal José Pinheiro Júnior”, contextualiza o historiador.
Segundo a Academia Nacional de Medicina, as irmãs ficaram em observação por um ano. Foram aplicados remédios em uma delas a fim de verificar se a outra sentia os efeitos. Foi dessa forma que Chapot-Prévost concluiu que o órgão que as ligava era o fígado. Como não havia radiografia naquela época, foram necessários vários meses para descobrir se elas possuíam um único fígado ou não.
Chapot-Prévost esculpiu em gesso, no tamanho natural, o modelo das irmãs. Após realizar minuciosos estudos, esgotando os métodos de investigação e exame possíveis, o cirurgião criou processos para as várias fases da cirurgia, incluindo uma mesa cirúrgica desenhada por ele especialmente para essa operação.
Fernando Achiamé afirma que, na cirurgia, Chapot-Prévost usou, pela primeira vez, a máscara, que hoje é de uso universal. Naquela época, os processos da assepsia eram limitados, mas o cirurgião foi rígido, exigindo preparo e cuidados de higiene, que incluíam desde a apurada imunização da sala até banhos de lisol do cirurgião e seus auxiliares.
Maria faleceu cinco dias após a cirurgia, vitimada por um quadro infeccioso que a medicina da época não dispunha de meios para debelar. Porém, a sobrevivência de Rosalina atestou o êxito do procedimento e serviu de tema a várias conferências médicas pelo mundo.
Em 1894, durante a quinta pandemia de cólera do século XIX, que durou de 1891 a 1896, Chapot-Prévost e o médico sanitarista Oswaldo Cruz foram convidados para chefiar o Instituto Sanitário Federal, criado pelo governo da época para enfrentar a doença.
Os estudos deram origem a um amplo programa de saneamento implementado em regiões estratégicas do Rio de Janeiro, São Paulo e Minas Gerais. Segundo a FioCruz, esse trabalho feito com o cirurgião inaugurou a trajetória de Oswaldo Cruz como sanitarista.
O cirurgião foi eleito Membro Honorário Nacional da Academia Nacional de Medicina, em 1905, devido ao sucesso da cirurgia envolvendo as siamesas capixabas, que ultrapassou as fronteiras do Brasil.
Após a operação, ele escreveu vários artigos sobre o caso e passou a participar de conferências pelo mundo. Em 1901, partiu para a Europa, para aperfeiçoar os estudos no Instituto Pasteur.
Rua em Vitória tem mesmo sobrenome do novo papa
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