Brasil agoniza entre a pandemia e o pandemônio político

Íntegra da reunião ministerial escancarou que, seja pelos discursos, seja pelos silêncios, o governo federal tem aprofundado os impactos da crise do novo coronavírus

Publicado em 26/05/2020 às 06h01
Atualizado em 26/05/2020 às 08h32
Reunião ministerial
Reunião ministerial de 22 de abril, divulgada por decisão do STF. Crédito: Reprodução de vídeo

divulgação na íntegra da reunião ministerial de 22 de abril não trouxe a bala de prata que encerraria a dúvida se o presidente Jair Bolsonaro tinha a intenção de interferir na Polícia Federal. Com os vídeos, no entanto, surgiram outros ataques flagrantes à democracia, que prometem abrir novas frentes de investigação contra membros do governo federal. O que ficou patente é que, além de sofrer com a pandemia, o Brasil também enfrenta um pandemônio.

A crise sanitária do novo coronavírus e o decorrente baque econômico, que são problemas comuns a todos os países neste momento, estão sendo agravados no país com a convulsão política alimentada pelo Planalto. E, o pior, como visto na reunião do dia 22 de abril - ironicamente aniversário do descobrimento do Brasil - não estão no cerne da pauta dos governantes de plantão. Muito pelo contrário. O presidente do Banco do Brasil, Rubem Novaes, chegou a dizer que o pico da Covid-19 já havia passado, num exemplo escancarado do negacionismo que marca os centros do poder.

A pandemia foi tratada como coadjuvante, enquanto os holofotes voltavam-se para populismo, o autoritarismo e assuntos mesquinhos como tomada de três pinos, radares e tacógrafos.

Nelson Teich, que nem havia esquentado a cadeira de ministro da Saúde, limitou-se a traçar linhas gerais. Nas outras raras vezes em que a doença foi citada, o uso foi político. Alheios ao sofrimento da população, obcecados pela agenda ideológica, três dos ministros presentes na reunião já começam a ver suas falas antidemocráticas ricochetearem.

Diante do festival de impropérios, condenados até por governistas, STF, PGR e Comissão de Ética da Presidência já foram acionados para que Ricardo Salles (Meio Ambiente), Abraham Weintraub (Educação) e Damares Alves (Mulher) sejam afastados dos cargos, por crimes de crimes de responsabilidade, difamação e contra a Lei de Segurança Nacional.

O Brasil já é o segundo no ranking das mortes por Covid-19, mas até o momento não tem respostas para questões gritantes. Como realizar mais testes e aumentar a oferta de respiradores, cruciais para embasar tecnicamente o mantra da flexibilização do isolamento? Como viabilizar que a ajuda financeira chegue aos mais de 10 milhões que ainda aguardam pelo auxílio e às pequenas empresas, que estão à deriva? Como equilibrar as contas públicas, em um momento de necessária ampliação de gastos, sem perder de vista o ajuste fiscal? 

A reunião ministerial escancarou que, seja pelos discursos, seja pelos silêncios, o governo federal tem aprofundado uma crise que, sem a necessidade do empurrão desse circo político, já seria dolorosa.

Diante de um Executivo federal cada vez mais diminuto e inebriado por convicções para lá de questionáveis, as demais instituições se veem desafiadas a agir. Judiciário, Parlamento, Estados, municípios, Forças Armadas, empresariado, trabalhadores... Todos devem estar atentos ao que temos pela frente: uma tempestade perfeita que já testa de maneira dura a resistência do tecido democrático do país.

Ataques antidemocráticos, de cara limpa ou não (quem são os responsáveis por boatarias, mentiras e insultos ditatoriais que infestam as redes sociais Brasil afora?), não podem ser tolerados. Tais figuras estão à margem da Constituição, não contribuem em nada ao debate para que atravessemos a pandemia, estabeleçamos o distensionamento político e retomemos a discussão sobre o que fazer para sairmos, de maneira sustentada, da depressão econômica.

Em nota publicada na segunda-feira (25), o presidente Bolsonaro afirma ter compromisso com a democracia e pede a união das instituições. Boas intenções que não podem ficar apenas no papel. Do contrário, enquanto Bolsonaro e seus comandados dançam à beira do precipício, o Brasil caminha a passos largos para a infame liderança de mortandade por coronavírus. É assim que o presidente planeja fazer valer o lema “Brasil acima de todos”?

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