Publicado em 27 de agosto de 2020 às 10:39
Considerada uma reviravolta, a rejeição do adiamento da Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) nesta quarta-feira (27) no Senado surpreendeu empresas, que até consideravam o risco de a lei passar a valer, mas esperavam que a Casa mantivesse o entendimento da Câmara e adiasse a norma para 2021. >
Na terça (25), a Câmara havia votado por adiar o início da vigência das regras para o último dia deste ano. A Medida Provisória (MP) apresentada pelo governo vencia nesta quarta, e as mudanças foram derrubadas pelos senadores. Agora, a medida será encaminhada para sanção. Se receber aval do presidente, entrará em vigor.>
Por meio de uma frente chamada "Em Defesa da LGPD e da Segurança Jurídica", mais de 50 associações empresariais de diversos setores defenderam que a lei fosse postergada sob o argumento de que traz insegurança jurídica se não vier acompanhada da Agência Nacional de Proteção de Dados (ANPD), que depende de decreto do presidente Jair Bolsonaro (sem partido).>
Além do argumento da autoridade, o setor privado alega que a pandemia forçou mudança no direcionamento interno de recursos. Enquanto tentam segurar funcionários, consideram pesados os gastos com segurança da informação (contra ataques cibernéticos, por exemplo) e com a implementação de processos para supervisionar o tratamento de dados pessoais de clientes e funcionários.>
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Do outro lado, defensores da data original da vigência da lei sustentam que as empresas tiveram tempo suficiente para fazer adequações, que a proteção de dados pessoais é importante para a garantia de mais direitos nas eleições e que o governo federal sempre irá postergar a criação da autoridade se a lei não estiver vigente.>
Multas só poderão ser aplicadas em agosto de 2021, embora a lei já sirva de suporte a consumidores e usuários que sintam que seus dados foram lesados - se Bolsonaro optar pela sanção.>
Entre as grandes empresas - em especial as de tecnologia e as redes sociais, que já precisaram se adequar ao Regulamento de Proteção de Dados da União Europeia (GDPR) -, a implementação de novos processos já é uma realidade. Isso explica porque o WhatsApp divulgou a revisão de suas políticas de privacidade nos últimos dias, por exemplo.>
As menores e com menos recursos estão em diferentes estágios de adaptação. Para essas, a falta de orientação da ANPD pode pesar.>
"Vários pontos dependem de autoridade e carecem de orientação. A lei é boa, mas a entrada em vigor sem autoridade, não é o cenário ideal", diz Flávia Rebello, sócia do Trench Rossi Watanabe.>
Com a lei em vigor, as empresas precisarão prestar esclarecimento caso clientes peçam informações sobre como ela trata seus dados e quais são as medidas de proteção, por exemplo.>
De modo geral, os titulares precisarão consentir se os setores público e privado queiram usar dados para um fim muito distinto do da coleta original, atendendo a princípios que seriam orientados pela ANPD.>
"Somos favoráveis à lei, o grande problema é a ausência da ANPD. A gente que lida com inovação e tecnologia tem todas as questões de insegurança jurídica inerentes ao negócio. As questões ainda serão levadas à Justiça comum, que nem sempre tem entendimento necessário", diz Kiko Afonso, diretor-presidente do Dínamo, movimento de articulação na área de políticas públicas focada em startups.>
O desenho da ANPD ainda é uma das principais incógnitas. Nos últimos dias, cresceu a expectativa de que a autoridade seja vinculada à Casa Civil, como nos moldes definidos pelo ex-presidente Michel Temer ao sancionar a lei em 2018.>
O Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) surgiu como uma das opções no debate após circulação de documento em que defendeu a ANPD em suas atribuições na semana passada. Poucos dias depois, o governo respondeu que o decreto está pronto e que pode ser publicado a qualquer momento.>
Em webinar do site Jota, Jorge Oliveira, ministro-chefe da secretaria-geral da Presidência, disse na quinta (20) entender que a proposta do Cade não é viável do ponto de vista jurídico.>
Para a ANPD, Bolsonaro precisa indicar cinco nomes para a direção. Os servidores serão realocados de outros quadros, já que o órgão não deve criar novas despesas à União.>
Organizações da sociedade civil aprovaram a decisão de não adiar a lei novamente. Promulgada em 2018, a norma já foi adiada duas vezes e tem uma das maiores vacâncias da história jurídica recente.>
A leitura é que a entrada em vigor da lei vai pressionar um movimento do Executivo para a criação da ANPD. Outro argumento é a proteção de dados de cidadãos durante as eleições.>
"Nas eleições, usuários terão mais garantias para saber como seus dados foram cruzados entre data brokers [empresas que captam e vendem dados] e campanhas políticas e como foram posteriormente usados nas redes sociais, para o direcionamento de anúncios", diz Brunas dos Santos, consultora independente e representante da Coalizão Direitos na Rede.>
A lei de proteção de dados traz regras para o tratamento de dados online e offline de pessoas jurídicas e físicas pelos setores público e privado. Fica excluído o uso de dados realizados para fins jornalísticos, artísticos, acadêmicos, de segurança pública e defesa nacional.>
Quando a lei entrar em vigor, haverá a possibilidade de usuários solicitarem acesso a seus dados, além de pedirem que informações sejam corrigidas ou excluídas. Informações sensíveis, como posição política, opção religiosa e vida sexual receberão tratamento mais rigoroso.>
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