Publicado em 9 de fevereiro de 2022 às 15:13
- Atualizado há 4 anos
Enquanto o governo federal e o Congresso Nacional se debruçam sobre diversos textos possíveis para uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que reduza os impostos sobre combustíveis e energia, o Banco Central alertou que o tiro pode sair pela culatra. Na ata da última reunião do Comitê de Política Monetária (Copom), o colegiado chama a atenção para medidas que na verdade podem contribuir para deteriorar o cenário fiscal, levando a um aumento das projeções de inflação logo à frente.>
As propostas para reduzir a tributação de combustíveis no ano eleitoral podem ter efeito negativo sobre a taxa de câmbio, levando a uma inflação mais alta e, consequentemente, à necessidade de uma taxa básica de juros ainda mais elevada. A avaliação, que já era praticamente consenso no mercado e no Ministério da Economia, foi explicitada nesta terça-feira (8) pelo Banco Central.>
Apelidada na equipe econômica de "PEC Kamikaze" e considerada uma "bomba fiscal" pelo ministro da Economia, Paulo Guedes, a medida tem impacto total superior a R$ 100 bilhões ao ano, nas contas da equipe econômica.>
Na ata do Copom, documento em que explica a decisão da semana passada de elevar os juros para 10,75% ao ano, a instituição não cita as propostas que estão em discussão no governo e no Congresso, mas afirma que "mesmo políticas fiscais que tenham efeitos baixistas sobre a inflação no curto prazo podem causar deterioração nos prêmios de risco" e levar ao "aumento das expectativas de inflação e, consequentemente, um efeito altista na inflação prospectiva".>
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Em um momento em que muitos analistas temem que o presidente Jair Bolsonaro (PL) tome novas medidas para aumentar os gastos para tentar a reeleição, o BC afirma que políticas fiscais que impliquem impulso adicional da demanda podem impactar negativamente preços de ativos importantes --leia-se, o dólar.>
No Congresso, há pelo menos duas propostas para mudar a Constituição e permitir o corte de tributos sobre combustíveis. A medida tem alto impacto fiscal e seu efeito sobre os preços ao consumidor é incerto.>
A "ata dos recados", como foi classificada por alguns analistas, também trouxe uma mensagem mais dura sobre os próximos passos do Copom. A instituição indicou que vê a necessidade de subir os juros além dos 12% projetados pelo mercado a partir de maio e que a taxa pode demorar mais a cair - talvez somente em 2023.>
O BC também sinalizou que ainda haverá pelo menos mais duas altas de juros, mesmo que em magnitude inferior ao 1,5 ponto percentual da semana passada.>
"O ciclo de aperto monetário deverá ser mais contracionista do que o utilizado no cenário de referência", disse o Copom ao citar as previsões do mercado para os juros na pesquisa Focus, usadas como referência nas projeções de inflação do BC.>
O BC também reforçou a preocupação com as expectativas para o IPCA (índice de preços ao consumidor). Nas últimas semanas, as projeções de inflação para 2022 e 2023 têm subido. Para este ano, já é previsto um novo estouro da meta. Para o próximo, a projeção está ligeiramente acima do objetivo central de 3,50%.>
Para alguns economistas, os dados de atividade e mercado de trabalho mais fracos podem mudar o plano de voo do Copom, desde que questões eleitorais e medidas populistas não revertam a tendência de valorização do real das últimas semanas.>
"O melhor comentário da ata é o destaque para medidas e políticas fiscais que poderiam ter uma boa intenção de curto prazo de reduzir a inflação, mas que têm um custo muito elevado. Isso vai trazer mais juros e mais inflação lá na frente. É um custo fiscal muito alto para uma medida de baixo retorno para a sociedade", afirma Rafaela Vitoria, economista-chefe do banco Inter.>
Ela afirma discordar da avaliação do BC e de grande parte do mercado de que é necessário levar os juros para mais de 12% para segurar a inflação, pois grande parte do aumento da Selic realizado desde março do ano passado ainda não foi sentido na economia real.>
"Vamos chegar a uma Selic maior que o necessário, e isso pode levar ao início da discussão de queda de juros mais breve do que a curva precifica. A gente vai começar a sentir esse impacto da política monetária nos próximos dados, mercado de trabalho mais fraco, indústria negativa, varejo com dificuldade.">
Segundo Caio Megale, economista-chefe da XP Investimentos, o discurso mais rígido "coloca um viés inequívoco de alta para a taxa Selic terminal", projetada pela instituição, até então, em 11,75%. Ele também destaca a preocupação do BC com medidas de impacto fiscal para frear a inflação.>
"O Banco Central parece reconhecer o potencial impacto negativo de iniciativas relacionadas a isenções fiscais, como as relativas aos preços dos combustíveis que vêm sendo discutidas nas últimas semanas", disse o economista-chefe da XP Investimentos.>
O Bank of America também recalculou suas projeções para as próximas reuniões. O banco elevou sua expectativa para a Selic até maio deste ano para 12,25%, prevendo uma alta de 1 ponto percentual em março e 0,5 ponto percentual no encontro seguinte. A estimativa anterior da instituição era de 11,25%. O Itaú Unibanco revisou a projeção de juros para 12,50% ao ano.>
Luis Otavio de Souza Leal, economista-chefe do Banco Alfa, afirma que, embora o BC tenha indicado que os juros terão que subir para mais de 12%, mantém a avaliação de que a instituição pode rever a ideia de continuar o processo de elevação dos juros quando chegar na reunião do Copom de maio, devido aos dados de atividade do primeiro trimestre mais fracos que o esperado.>
"Obviamente que a questão política pode fazer com que a nossa suposição não se verifique. Como o BC deixou claro, se a PEC dos Combustíveis, ou outras medidas de impacto duradouro sobre a política fiscal e temporário sobre a inflação, prosperarem, voltamos ao cenário básico indicado na ata", afirmou.>
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