É assessor de investimentos da Valor/XP Investimentos. É mestre em Direito e professor de pós-graduação.

Holding familiar: solução para o patrimônio ou modismo?

Saiba como fazer o planejamento patrimonial, reduzir conflitos entre herdeiros e proteger bens

Vitória
Publicado em 14/08/2025 às 10h28

Há algum tempo, a expressão “holding familiar” vem se popularizando entre operadores do direito, empresários, planejadores financeiros e curiosos. Como em toda trend do momento, espalham-se nas redes os ditos “especialistas” que a receitam como a fórmula mágica, universal e infalível para resolver todos os problemas.

Mas, afinal, a holding familiar entrega o que os “experts” prometem ou é apenas mais um dos inúmeros modismos incrementados pelas redes sociais? A resposta é uma daquelas sofríveis palavras lacônicas, mas ora necessária: depende! Como muitas ferramentas jurídicas e financeiras, a utilidade de uma holding depende do caso concreto, da estrutura do patrimônio envolvido e, especialmente, do que se espera dela.

documentação, imóvel, advogado
A holding familiar é uma empresa constituída para gerir o patrimônio de uma mesma família. Crédito: Shutterstock

Ao contrário do que possa parecer, o conceito de holding familiar não é novo. Seu formato contemporâneo inspira-se na prática do século XIX nos EUA e na Europa, quando se desenvolveu o conceito de concentração empresarial. Empresas passaram a ter como sócias outras empresas e essas estruturas jurídicas adaptaram-se para absorver o patrimônio pessoal e familiar de seus fundadores e sócios, buscando uma camada de proteção especialmente útil em períodos de crises e guerras. No Brasil, as holdings foram normatizadas na década de 1970, com a Lei das Sociedades Anônimas.

Na prática, a holding familiar é uma empresa constituída para gerir o patrimônio de uma mesma família. A pessoa jurídica criada para essa finalidade (geralmente uma sociedade limitada ou uma S/A) passa a administrar os imóveis, participações societárias, aplicações financeiras, obras de arte, ativos no exterior ou quaisquer outros bens que antes estavam sob a propriedade das pessoas físicas. O patrimônio individual passa ao controle da holding e cada membro da família passa a deter quotas ou ações desta empresa (e não mais os bens diretamente).

Mas, por que alguém que possui bens em seu próprio nome (pessoa física) deveria transferir seu patrimônio para uma empresa familiar (pessoa jurídica)?

Simples: organização e otimização patrimonial.

Ter uma holding não significa que, automaticamente economizará tributos, tampouco que terá o patrimônio familiar salvaguardado em qualquer hipótese. Mas, quando bem planejada, é uma ferramenta interessante para famílias que possuem patrimônio significativo ou com alguma complexidade (imóveis em comum, múltiplos herdeiros, negócios familiares, dentre outros). A holding não é a solução de todos os problemas, mas pode evitar muitos.

Os mais óbvios são os conflitos pela sucessão post mortem. É possível antecipar-se ao natural e desgastante processo de inventário para estabelecer a divisão de bens ainda em vida, de modo planejado, permitindo-se a adaptação de instrumentos de proteção patrimonial como cláusulas de incomunicabilidade ou usufruto das quotas sociais, por exemplo, de modo a evitar que se dissipe futuramente o patrimônio da família com a chegada de membros agregados, inclusive com hipóteses de reversão ao instituidor no caso de morte prematura de beneficiários.

A antecipação da partilha é capaz de evitar disputas intermináveis entre herdeiros e ainda permitir economia de tributo, por não se saber qual será a alíquota de ITCMD no momento futuro.

Do ponto de vista da proteção patrimonial, ainda que não seja imune a credores e muito menos a fraudes, a holding pode servir como uma camada de separação entre as esferas pessoal e familiar em eventuais disputas judiciais com terceiros. Afinal, até onde a questão envolve um membro familiar isolado ou acarreta consequências para o conjunto familiar?

Pela otimização tributária, a depender do caso, a centralização do patrimônio por meio de uma holding poderá reduzir o impacto da tributação, conforme o regime de tributação a ser adotado no modelo empresarial.

Apesar de algumas vantagens diretas, deve-se observar que a estruturação de holdings demanda custos e eventual mudança de paradigma na relação familiar e na administração de patrimônio. Adotá-la sem o diagnóstico prévio de um profissional de confiança – apenas por modismo, por promessas de redução de carga tributária ou mesmo por “indicação da internet” – é desaconselhado. Nessas situações, criam-se estruturas complexas e eventualmente desnecessárias.

Outro erro comum é ignorar o aspecto comportamental e relacional do patrimônio. Uma holding mal pensada, com cláusulas rígidas ou sem consenso entre os membros da família, pode se tornar mais um foco de litígio, ou seja, exatamente o que se pretendia evitar.

Enfim, holdings familiares não são a solução mágica prometida por alguns, mas também não são ilusão passageira. O essencial é cercar-se de informação, ter clareza sobre os objetivos, fazer um bom mapeamento jurídico-tributário e, sobretudo, respeitar a estrutura familiar.

Cada lar possui suas próprias regras, tradições e necessidades. Quando alinhadas à realidade e aos valores da família, as holdings podem ser o alicerce para a harmonia e a continuidade de uma história que se deseja preservar.

A Gazeta integra o

Saiba mais
Família Patrimonio Leonardo Pastore

Notou alguma informação incorreta no conteúdo de A Gazeta? Nos ajude a corrigir o mais rápido possível! Clique no botão ao lado e envie sua mensagem.

Envie sua sugestão, comentário ou crítica diretamente aos editores de A Gazeta.