Felipe Storch Damasceno é economista com mestrado e doutorado em Administração e Contabilidade. É professor de Economia e pesquisador dos impactos sociais e econômicos de políticas públicas. Também é consultor, palestrante e comentarista na CBN Vitória

Ajuste fiscal: o ponto de partida para um Brasil mais competitivo

No novo cenário global, não há espaço para o improviso: só com equilíbrio fiscal, o Brasil poderá competir em cadeias globais de maior valor agregado

Publicado em 06/08/2025 às 08h45

O mundo está redesenhando suas estratégias econômicas. Grandes potências como Estados Unidos, União Europeia e China têm investido massivamente em política industrial, subsídios e reestruturação de cadeias produtivas. A nova geopolítica econômica combina tecnologia, segurança e competitividade e coloca em xeque modelos liberais puros baseados apenas em abertura comercial. No Brasil, no entanto, o debate parece travado entre respostas pontuais e propostas fragmentadas. Enquanto o mundo subsidia, o Brasil ainda paga caro para funcionar. E o custo que nos paralisa tem nome: juros altos.

A taxa básica de juros brasileira é uma das mais elevadas do planeta. Isso não é fruto de uma decisão arbitrária do Banco Central, mas do risco fiscal estrutural que o país carrega há décadas. O déficit público persistente, a dívida em trajetória ascendente e a instabilidade das regras fiscais pressionam o prêmio de risco e obrigam a política monetária a ser mais restritiva do que o desejável. Nesse contexto, qualquer tentativa de reindustrialização, aumento de produtividade ou inserção em cadeias globais de valor esbarra na mesma barreira: o custo do capital.

Vista aérea de navio carregado de contêineres no TVV, no complexo do Porto de Vitória
Vista aérea de navio carregado de contêineres no TVV, no complexo do Porto de Vitória. Crédito: Thiago Có/Log-In Divulgação

Discutir política industrial sem enfrentar o problema fiscal é ignorar o centro da equação econômica brasileira. Nenhuma economia cresce de forma sustentável com juros reais elevados, investimento privado reprimido e contas públicas desorganizadas. A melhor política de desenvolvimento que o Brasil pode adotar neste momento é uma agenda clara de consolidação fiscal, com controle efetivo das despesas obrigatórias, revisão de subsídios ineficientes e qualificação do gasto público. Essa não é apenas uma questão contábil: é a chave para mudar o patamar de confiança, reduzir o custo do crédito e destravar o investimento de longo prazo.

Com um ambiente macroeconômico mais previsível, o país pode finalmente romper o ciclo vicioso de baixo crescimento, baixa produtividade e informalidade crescente. A redução estrutural dos juros permitiria que mais empresas investissem em modernização, inovação e expansão. Ao mesmo tempo, o Estado poderia direcionar recursos escassos para áreas com elevado retorno social, como educação básica, infraestrutura e pesquisa aplicada. O ajuste fiscal, portanto, não é um fim em si mesmo, mas um meio para criar as condições para crescimento com qualidade.

A falta de uma política econômica coerente tem implicações diretas para a inserção do Brasil no novo mapa da economia global. Enquanto outros países constroem políticas industriais articuladas, sustentadas por estabilidade fiscal e coordenação entre entes públicos e privados, o Brasil ainda tropeça em ruídos políticos, falta de metas de produtividade e conflitos entre políticas monetária e fiscal. Não é possível competir em cadeias globais de maior valor agregado sem um ambiente doméstico propício ao investimento produtivo.

O Espírito Santo, com sua vocação exportadora e presença em cadeias intensivas em capital e logística, como mineração, siderurgia e celulose, é um exemplo claro das oportunidades que podem ser ampliadas com um cenário de juros mais baixos e previsibilidade macroeconômica. A redução do custo do capital beneficiaria a expansão de projetos industriais e de infraestrutura portuária, criando empregos de maior qualificação e elevando a arrecadação pública. O mesmo vale para setores como petróleo, energia e tecnologia, que dependem de horizontes longos e estabilidade institucional para atrair investimentos robustos.

É fundamental compreender que juros menores e crédito mais acessível são consequência de um equilíbrio fiscal duradouro, e não de decretos ou pressões políticas. A autonomia do Banco Central é importante, mas não resolve sozinha os fundamentos da política econômica. Se o governo federal quiser induzir crescimento, gerar emprego e estimular a competitividade da economia, deve começar por onde mais importa: reconstruindo a credibilidade fiscal.

Há quem defenda que o Brasil deveria seguir o exemplo dos Estados Unidos e Europa, com políticas industriais ativas e subsídios amplos. Mas é preciso reconhecer as diferenças de contexto. As potências globais podem emitir moeda em grande escala, têm sistemas de financiamento profundo e contam com credibilidade construída ao longo de décadas. O Brasil, com histórico de instabilidade e inflação, não dispõe do mesmo grau de liberdade. Por isso, a estratégia nacional precisa ser pragmática e responsável: só com equilíbrio fiscal será possível colher os frutos de uma política de desenvolvimento consistente.

O país precisa parar de buscar atalhos. A trajetória sustentável de crescimento passa pelo aumento da produtividade, e este só virá com investimentos em capital físico e humano, que por sua vez exigem juros baixos e crédito de longo prazo. Ajuste fiscal não é sinônimo de austeridade indiscriminada, mas de escolhas estratégicas. É a base sobre a qual se constrói um projeto de país com mais inovação, mais empregos formais e mais oportunidades para todos.

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