Felipe Storch Damasceno é economista com mestrado e doutorado em Administração e Contabilidade. É professor de Economia e pesquisador dos impactos sociais e econômicos de políticas públicas. Também é consultor, palestrante e comentarista na CBN Vitória

Geopolítica, inflação e a trava no crescimento brasileiro

Cenários interno e externo vêm dificultando o trabalho das economias emergentes, e o Brasil, claro, não escapa dessa maré; entenda

Publicado em 25/06/2025 às 08h49

O Brasil vive um daqueles momentos em que, mesmo quando faz a lição de casa, o boletim global atrapalha o desempenho. O mundo atravessa um novo ciclo de incerteza geopolítica: conflitos prolongados no Oriente Médio, tensões comerciais entre China e Estados Unidos, a guerra na Ucrânia que insiste em não acabar e, agora, em meio a tudo isso, a expectativa de uma eleição polarizada nos EUA. Esse cenário externo vem dificultando o trabalho das economias emergentes, e o Brasil, claro, não escapa dessa maré.

O impacto mais imediato dessas incertezas é a pressão sobre os preços das commodities e a volatilidade no fluxo de capitais. Petróleo e alimentos ficam mais caros. Investidores ficam mais avessos ao risco e retiram recursos dos países periféricos, depreciando moedas e reacendendo o risco inflacionário. Em resposta, os bancos centrais, como o nosso, precisam adotar posturas mais conservadoras, e o Brasil, que já tem uma das taxas reais de juros mais altas do mundo, vê-se obrigado a manter uma política monetária contracionista por mais tempo do que seria desejável.

Incertezas internas que se somam às externas impactam o Brasil . Crédito: Shutterstock
Incertezas internas que se somam às externas impactam o Brasil . Crédito: Shutterstock

Mas o problema não está só no cenário externo. Internamente, a política fiscal do governo federal tem dificultado ainda mais a atuação da política monetária. A combinação de arrecadação estagnada, gastos elevados e um arcabouço fiscal que perdeu credibilidade aos olhos do mercado tem pressionado as expectativas de inflação futura. Isso porque, se os agentes econômicos não acreditam que o governo será capaz de equilibrar suas contas, a confiança na estabilidade dos preços também se enfraquece.

Com as expectativas inflacionárias desancoradas (acima da meta do Banco Central no médio e longo prazo), os instrumentos da política monetária perdem parte de sua eficácia. O Copom, mesmo que deseje iniciar um ciclo de cortes mais expressivos nos juros para estimular o crescimento, acaba limitado pela necessidade de manter os preços sob controle em um ambiente de desconfiança crescente. 

Além disso, o horizonte político não promete aliviar essa tensão. Em 2026, teremos eleições presidenciais. E o ano anterior é tradicionalmente um momento de disputas intensas por espaço orçamentário. Um governo com baixa popularidade, pressionado por um Congresso fragmentado e sedento por emendas e recursos, tende a abrir mão de compromissos fiscais mais firmes para garantir sustentação política. O resultado? Mais gastos, mais ruídos e mais obstáculos à queda sustentável dos juros.

Em um cenário global já adverso, a previsibilidade se torna um ativo valioso. O problema é que o Brasil entra no novo ciclo com uma série de incertezas internas que se somam às externas. A imprevisibilidade fiscal, os riscos políticos, a polarização crescente e a fragilidade das âncoras macroeconômicas reduzem o espaço para uma recuperação vigorosa. Com juros altos, o crédito continua caro. O consumo desacelera, os investimentos minguam e o crescimento perde força.

Isso ocorre justamente quando o país poderia aproveitar janelas de oportunidade, como o realinhamento das cadeias produtivas globais, o interesse crescente por fontes de energia limpa (onde temos grande potencial) e o movimento de busca por diversificação de fornecedores por parte de países desenvolvidos.

Em outras palavras, o Brasil poderia estar atraindo mais investimentos, estimulando sua indústria, modernizando sua infraestrutura e colhendo frutos de uma transição energética global. Mas, sem estabilidade macroeconômica, previsibilidade fiscal e segurança institucional, essa oportunidade se esvai. 

A tarefa agora é dupla: reconquistar a confiança do mercado com responsabilidade fiscal (não apenas no discurso, mas na prática) e proteger a estabilidade monetária com prudência e firmeza, mesmo em ano pré-eleitoral. Se não for possível agir em conjunto, corremos o risco de continuar girando em falso: política monetária apertada para compensar o descontrole fiscal, crescimento medíocre e perda de oportunidades.

O Brasil já mostrou que sabe crescer quando há clareza de rumo. Mas, para isso, é preciso colocar a política a serviço da economia e não o contrário.

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