Uma queixa-crime produzida por um advogado foi aceita pelo Juízo da 3ª Vara Criminal da Serra — responsável pelo Tribunal do Júri —, o que tornou réu um motorista acusado por morte e lesões graves em um acidente. Com a medida, ele assumiu o papel que tradicionalmente é desempenhado pelo Ministério Público do Espírito Santo (MPES), cuja inércia apontada em decisão judicial fez com que o processo ficasse paralisado por mais de 90 dias.
O caso envolve a 7ª Promotoria Criminal da Serra, que em 14 de abril foi intimada a se manifestar sobre a conclusão de um inquérito policial que tratava de um acidente com morte em que o motorista foi indiciado. Mas, nos meses que se seguiram, nada foi feito.
“Até a presente data não ofereceu denúncia, tampouco requereu o arquivamento ou novas diligências, configurando a inércia”, é relatado na decisão da 3ª Vara Criminal da Serra.
Na sequência, foi recebida a queixa-crime apresentada pelo advogado Fábio Marçal, que representa as vítimas. O que tornou o motorista Daniel Ramos Guedes réu em ação penal, sob a acusação de homicídio e tentativa de assassinato, ambos triplamente qualificados, por motivo fútil, sem dar chance de defesa às vítimas e causando perigo a outras pessoas (veja detalhes abaixo).
Também foi determinado que os fatos sejam comunicados ao procurador-geral de Justiça (PGJ), Francisco Berdeal, chefe do MPES. “Para adoção das providências que entender cabíveis”.
Ação considerada rara
Segundo o advogado Fábio Marçal, que representa as vítimas, a Constituição garante a atuação diante da omissão estatal. “O que fizemos foi propor uma ação penal privada subsidiária da pública, a queixa-crime, diante da omissão da 7ª Promotoria Criminal da Serra, que não ofereceu denúncia no prazo legal”.
Marçal representa duas das quatro vítimas do acidente. Uma delas morreu e a outra sofreu lesões graves.
Explica que, ao contrário dos demais casos em que MP é o titular da ação penal, nesta situação ele atuará como uma espécie de fiscal da lei, cabendo à Marçal o papel de conduzir a ação.
“Tenho um imenso respeito e admiração pelo Ministério Público, com quem atuei incansáveis vezes ao lado dos promotores como assistente de acusação. No entanto, é dever nosso seguir zelando sempre por quem mais precisa”, assinala.
Acrescenta que acredita e confia na atuação do MP. “Com seus preceitos de excelência, continuará atuando com a firmeza de sempre”.
Em relação à queixa-crime que propôs, destaca que é rara no Judiciário brasileiro. “É uma conquista não só jurídica, mas principalmente moral para os familiares das vítimas”.
O que diz o MP
Por nota, o MP informou que “reconhece a gravidade do caso e a dor das famílias envolvidas”, e reafirma seu “compromisso com a atuação célere, responsável e eficiente na apuração dos fatos e na responsabilização dos autores de crimes”.
Em relação aos fatos ocorridos na 7ª Promotoria Criminal da Serra, informa que está apurando as circunstâncias relacionadas à tramitação interna do processo, os prazos e providências adotadas, e que tomará as medidas necessárias caso seja identificada qualquer falha funcional. “Ressaltamos que a atuação ministerial está submetida ao regime de controle e fiscalização institucionais, com os devidos mecanismos de apuração de condutas e responsabilidades”.
Reitera ainda que são prioridades institucionais a proteção dos direitos das vítimas e o respeito ao devido processo legal. E que está adotando as providências necessárias para assegurar o regular prosseguimento do caso. “E a devida responsabilização penal, com estrita observância à legalidade e ao interesse público”.
A tragédia
O acidente aconteceu em 7 de abril do ano passado. Duas universitárias de 19 anos morreram em uma colisão na Rodovia Norte Sul, na altura do bairro Jardim Limoeiro, na Serra.
Luma Alves da Silva e Natiele Lima dos Santos, estavam no banco de trás e morreram na hora. Uma delas chegou a ser arremessada para fora do veículo. Arthur Barbosa dos Santos e Luan Alves da Silva sobreviveram com lesões graves. Dos quatro, Luma e Luan são representados por Marçal.
O carro era guiado por Daniel Ramos Guedes, que segundo a queixa-crime assumiu a direção após ingerir bebida alcoólica. “Em alta velocidade, realizou disputa automobilística, perdendo o controle do automóvel e colidindo contra um muro”, informa o texto.
É acrescentado que o comportamento do motorista foi considerado imprudente na conclusão do inquérito policial, e que ele assumiu o risco da ocorrência de mortes e lesões.
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