Um catuque — uma espécie de recado — entregue em um presídio do Espírito Santo revelou um crime brutal: um traficante teve a cabeça cortada, o corpo foi queimado junto com o carro, e depois os criminosos foram beber e assistir a um jogo de futebol. Pelo assassinato, nove pessoas foram denunciadas e vão enfrentar o júri popular na próxima segunda-feira (13).
A vítima é um traficante que atuava na Serra, Fernando Monteiro Telles, integrante da facção criminosa Primeiro Comando de Vitória (PCV). A morte dele envolve traições, emboscadas e delações. Foi planejada e executada, segundo o Ministério Público do Espírito Santo (MPES), pelos seguintes denunciados:
- Ícaro Santana Soares
- Isac Nunes de Aguiar
- Igor de Jesus Alves da Cruz
- Filipe Santana Pereira
- Bruno Alexandre da Silva Cruz
- Deivison Borges dos Santos
- Edmaycon Guss Ferreira
- Frank William de Moraes Leal Horácio
- Fernando Moraes Pereira Pimenta, o Marujo
O crime aconteceu em 28 de março de 2019. Era final de tarde quando Fernando Telles, confiante de que poderia reverter o quadro de denúncias contra ele, decidiu ir ao Bairro da Penha, em Vitória, participar de um “desembolo”. Foi acompanhado de duas pessoas que considerava amigas, conversar com Marujo.
Mas sua morte, revelaram as investigações, havia sido planejada e encomendada dias antes, no presídio de Guarapari, onde Ícaro estava detido. Naquela noite, Fernando Telles foi espancado, decapitado e enrolado no tecido impermeável de uma piscina. Posteriormente seu corpo foi transferido para o seu carro e abandonado às margens da Rodovia Audifax Barcelos, na Serra, onde foi incendiado.
A vítima estava envolvida em várias traições. Ele tinha sido encarregado de cuidar da boca de fumo de Ícaro e repassar os lucros para a mulher dele. Mas acabou tendo um relacionamento amoroso com ela.
Revoltado com a situação, o traído determinou a morte do casal. A informação é de que a ordem teria sido levada pelo advogado Frank William.
O objetivo era que a mulher caísse em uma emboscada e fosse pega e morta. Fernando Telles descobriu e a avisou. Mas acreditou que poderia reverter sua situação e decidiu ir ao encontro das lideranças, onde acabou sendo morto.
A revelação do crime em um catuque
O catuque com informações sobre o crime, a que a coluna teve acesso, foi citado em outra denúncia do MP, realizada pelo Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco) contra a facção criminosa PCV e suas principais lideranças.
O texto inclui a mensagem de Marujo enviada a Carlos Alberto Furtado, o Nego Beto, principal liderança do grupo criminoso, e que foi transferida, com outros quatro criminosos, para o presídio federal em Rondônia.
Marujo relata que ele e mais alguns parceiros receberam Fernando Telles. “Estávamos geral reunidos como sempre ficamos e foi triste pro Fernandinho”.
Logo depois acrescenta que mataram a vítima, sem nenhum tiro, para não “queimar a favela”. Na sequência diz que o bairro ficou tranquilo e que eles foram beber. “Como nada tivesse acontecido depois disso até bebemos e secamos o Vasco jogando (sic)”. E completa: "Domingo vai ter a final e vamos ser campeão".
Informa ainda que o grupo do Ícaro estava na missão de localizar e executar a mulher que o traiu com a vítima. Além do recado, a equipe do Gaeco conseguiu fotos do dia do crime.
Contestações
A inclusão no processo do catuque de Marujo vem sendo questionada pelas defesas, com o argumento de que não foi dada oportunidade para que analisassem e se manifestassem sobre o documento.
Há, inclusive, uma decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ) determinando que o Tribunal de Justiça analise um habeas corpus apresentado pela defesa de Frank Willians, onde foi pedido a reabertura do prazo para apresentação dos argumentos finais. No mesmo sentido há uma manifestação do Ministério Público Federal (MPF).
O júri está agendado para às 9 horas desta segunda-feira (13), no Fórum Criminal de Vitória. A expectativa é de que sejam necessários pelo menos cinco dias de sessão. A maior parte dos réus está presa há seis anos.
O que dizem as defesas
A advogada Paloma Gasiglia faz a defesa de Igor de Jesus Alves da Cruz. Ela destaca que segue confiante de que a justiça será feita. “Temos convicção de que as provas vão traduzir a inocência do Igor”, assinala.
A defesa de Frank William é realizada por Hugo Miguel Nunes, que informou que não se manifesta sobre o júri.
Os advogados dos demais réus não foram localizados, mas o espaço segue aberto às suas manifestações.
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