Era madrugada de 7 de abril de 2024 quando um veículo colidiu contra um muro na Avenida Norte Sul, na Serra. O acidente foi o resultado de pelo menos 9 condutas graves cometidas pelo motorista horas antes da tragédia que tirou a vida de duas universitárias de 19 anos e deixou duas outras pessoas feridas.
Foi a conclusão do delegado Maurício Gonçalves da Rocha, titular da Delegacia de Delitos de Trânsito, que conduziu o inquérito. “Foi um dos casos mais violentos e de maior gravidade que investiguei”, resume.
Ao volante estava Daniel Ramos Guedes, que foi acusado de homicídio e tentativa de assassinato. Na última quinta-feira (17), por decisão do Juízo da 3ª Vara Criminal da Serra, se tornou réu em ação penal a partir de uma queixa-crime produzida pelo advogado de duas vítimas (veja abaixo).
Rocha aponta que no acidente foram cometidas todas as “barbaridades que poderiam ser evitadas”. E elenca as 9 condutas que aponta como fatais:
- Bebeu ao longo da noite e madrugada - a investigação policial identificou que ele esteve em pelo duas festas, onde bebeu
- Dirigiu, mesmo sob efeito de álcool - há depoimentos de que ele se recusou a passar o carro para um dos passageiros
- Guiava em alta velocidade - laudos da Polícia Científica calcularam que o veículo trafegava a 108 km/h. O máximo na via é de 60 km/h
- Não reduziu a velocidade - Nem a pedido das vítimas que estavam preocupadas com a situação
- Realizou exibição com o veículo - depoimento de Arthur, uma das vítimas, relata que o motorista acelerava muito. “Que tinha intenção de se exibir, mostrar que sabia correr”
- Tentativas de disputa com outros veículos - não aceitava ser ultrapassado por outros carros que trafegavam na via, e acelerava. Em depoimento, Arthur informou que o motorista “tinha intenção de entrar em uma competição de velocidade”, o que não foi aceito pelos demais motoristas da via
- Mortes - no cenário descrito, perdeu o controle do veículo, colidindo contra um muro, o que levou a morte de duas pessoas
- Lesões - ao provocar o acidente, também causou lesões consideradas graves em duas pessoas
- Assumiu o risco de uma condução perigosa - o inquérito policial aponta que Daniel assumiu o risco dos resultados danosos de sua conduta, considerada “irresponsável e inconsequente”, que além das mortes e lesões, poderia trazer danos a outras pessoas e ao sistema viário
As informações estão presentes na conclusão do inquérito. "O motorista fez todas as escolhas que causaram o acidente. O que aconteceu foi um crime cuja arma foi o carro”, assinala Rocha.
No veículo estavam Luma Alves da Silva e Natiele Lima dos Santos, ambas com 19 anos, mortas de forma brutal. Tiveram lesões graves Luan Alves da Silva e Arthur Barbosa dos Santos.
O caso é um exemplo do quanto o desrespeito à legislação e às regras de trânsito pode ser nefasto. Só no ano passado, 984 pessoas perderam suas vidas em acidentes. Número que supera em 13,4% o volume de assassinatos no Estado — foram 852 em 2024, segundo dados da última sexta-feira (18).
Rocha avalia que a legislação é branda em relação a crimes de trânsito. No caso de Daniel, observa que ele foi indiciado por homicídio, da mesma forma que alguém que atira e mata uma pessoa. “É o mesmo artigo, mas não vejo a mesma resposta pública quando este tipo de crime envolve um acidente. Os pedidos de prisão nem sempre são deferidos, por exemplo”, pondera.
No caso do acidente com as universitárias, o motorista foi conduzido à delegacia e saiu no outro dia. “A sensação de impunidade para os familiares e para as vítimas é terrível. E é uma situação que se repete em outros crimes de trânsito. Isto tem que mudar”, observa.
Fato citado na finalização do inquérito, onde foi dito que a "sociedade clama por justiça". "Espera das autoridades competentes uma resposta responsável e coerente, para que crimes e comportamentos desta natureza não se tornem uma constante em nosso Estado".
Ação rara
O caso é marcado ainda por outra lamentável marca, considerando que Daniel se tornou réu em ação penal a partir de uma queixa-crime produzida pelo advogado Fábio Marçal, que representa duas das quatro vítimas.
Ela teve a função de denúncia, tradicionalmente apresentada pelo Ministério Público e aceita pelo Juízo da 3ª Vara Criminal da Serra. Foi movida diante da inércia da 7ª Promotoria Criminal da Cidade, que deixou o processo paralisado por mais de 90 dias, sem nenhuma manifestação. Fato reconhecido pela justiça local.
Com a demora, pontos da conclusão do inquérito policial não chegaram a ser analisados. Além de indiciar Daniel por dois homicídios e duas tentativas de assassinato, foi solicitada a suspensão de sua habilitação e a sua prisão preventiva. Foi destacado na conclusão do inquérito que o motorista "representa sério risco ao sistema viário, a sociedade".
O advogado de defesa de Daniel não foi localizado, mas o espaço segue aberto a sua manifestação.
LEIA MAIS COLUNAS DE VILMARA FERNANDES
Notou alguma informação incorreta no conteúdo de A Gazeta? Nos ajude a corrigir o mais rápido possível! Clique no botão ao lado e envie sua mensagem.
Envie sua sugestão, comentário ou crítica diretamente aos editores de A Gazeta.
