O Brasil passa por um momento peculiar, de amadurecimento na concepção de seu modelo de infraestrutura. A visão atávica que muito nos atrasou, no sentido de que o poder público deveria ser o condutor e protagonista dos grandes projetos, parece ter sido superada, mesmo nos rincões ideológicos mais agudos.
Apenas para o ano de 2025, o Ministério dos Transportes projeta a realização de 15 leilões de rodovias, com a expectativa de investimentos no valor de R$ 161 bilhões. Dessa quantia, R$ 93 bilhões (CAPEX) serão destinados a realização de obras e melhorias nas rodovias brasileiras, como duplicações, construções de viadutos e pontes, além de R$ 68 bilhões com despesas operacionais (OPEX).
Até 2026 a projeção é ainda maior. O governo federal planeja realizar 44 leilões rodoviários.
O impacto social positivo desses investimentos é inquestionável. O desenvolvimento da infraestrutura vai permitir a melhora na circulação de bens e mercadorias, o incremento da segurança no transporte, e fundamentalmente a redução de custos, com impactos positivos para toda a economia.
Tantas obras assim, todavia, podem trazer também impactos negativos para parte da sociedade. Milhares de pessoas, que hoje ocupam indevidamente áreas públicas afetadas pelas concessões, deverão ser desalocadas, inclusive de áreas – não raro – ocupadas indevidamente por décadas.
Além disso, milhares de indivíduos, proprietários de áreas atingidas pelos grandes projetos, deverão ter seus direitos de propriedade afetados por uma grande quantidade de ações de desapropriação.
No caso de concessões, as próprias empresas privadas, concessionárias, passam a ter autorização especial para selecionar as áreas privadas das quais desejam se apropriar e destinar ao projeto de infraestrutura, podendo, inclusive, obter ordem judicial para imissão imediata na posse, mediante depósito de indenização.

Embora na primeira leva de leilões não existam áreas novas para concessões de rodovias no Espírito Santo, a grande novidade agora se mostra relacionada às ferrovias. No fim do ano passado, a Vale firmou com a União acordo para viabilizar a construção do trecho ferroviário da EF 118, entre Santa Leopoldina e Cariacica até Anchieta, numa extensão total de 90 quilômetros, sendo que 80 km até Anchieta e 10 km de alça até o porto de Ubu, conforme já noticiado em A Gazeta.
Os municípios de Santa Leopoldina, Cariacica, Vila Velha, Guarapari e Anchieta deverão ter suas áreas rurais cortadas por uma nova ferrovia, cujo trajeto, para se viabilizar, dependerá antes da expropriação de uma grande quantidade de áreas particulares. Muitos proprietários poderão ser forçados a cederem suas propriedades para a realização desse projeto, com relevantes impactos pessoais.
Não há dúvidas de que o interesse público, na melhora da vida social e no desenvolvimento do país, deve ser predominante e, de fato, justifica o sacrifício individual, inclusive do direito de propriedade. Todavia, a sociedade capixaba precisa se preparar para tratar adequadamente desse desafio, de modo que os direitos individuais sejam resguardados e que todo esse processo, salutar, seja realizado com equilíbrio e dentro das regras do Direito.
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