É advogado. Doutor e Mestre em Direito pela Universidade de São Paulo (USP)

À mesa com os corruptos

Em sociedades desenvolvidas, mesmo se “descondenados”, corruptos não assumem cargos de poder, não se abraçam em fotografias, não são convidados para aniversários nem se sentam à mesa de pessoas honestas

Vitória
Publicado em 03/07/2025 às 03h30

Caro leitor, gostaria de pedir licença para ser um pouco mais filosófico, e sair do escopo pragmático desta coluna. É que, de tanto viver o Direito, e sua aplicação real, menos acredito na possibilidade de o Direito regular universalmente a sociedade.

O modo de ser das leis, dos juízes e dos tribunais é pouco eficiente. E isso não é uma crítica. Para se usar do poder do Estado de punir, privar alguém de seus bens ou liberdade, é necessário sempre trabalhar com uma enorme margem de erro.

É para isso que serve o devido processo legal, assegurando o respeito às leis, a presença de um juiz imparcial, que decide de modo fundamentado em ambiente de contraditório e com base nas provas obtidas licitamente.

Daí, nem sempre as coisas dão certo. Muitos problemas podem ocorrer no meio do caminho, por limitações estruturais, ou mesmos desvios à lei, de modo que o resultado da aplicação do Direito nem sempre condiz com a realidade, com o que aconteceu no mundo real.

Para os propósitos de nosso texto: nem sempre os corruptos públicos e sabidos são condenados ou sequer processados. E, mais raramente ainda, quando o são, sofrem efetiva sanção civil ou perda de sua liberdade, por decorrência dos ilícitos que cometeram.

Precisamos, sim, fazer ajustes nas leis, e nas mentes dos aplicadores do Direito. De modo a incrementarmos a eficiência dos nossos mecanismos estatais de aplicação de sanção, mas, ainda assim, a margem de erro exigida pelo devido processo legal representará, sempre, uma possível dissonância entre corruptos e condenados, entre mundo real e mundo do Direito.

Corrupção
Corrupção. Crédito: Freepik

Como então podemos responder a essa incongruência inafastável?

A resposta deve ser social. Condenados ou não, aqueles que desviam suas condutas devem sofrer no convívio social a sanção mais evidente. Uma rejeição de imagem, de acolhimento, pode ser muito mais eficaz que o sistema punitivo. A reprovação social no voto, no apoio, na admissão dos círculos sociais e íntimos, deve estar alinhada a critérios morais e éticos, e não exclusiva e necessariamente a critérios jurídicos.

A presunção de inocência pode, e deve, servir a tribunais. Todavia, a incapacidade de punir, por parte do Estado, não pode impedir a condenação social dos corruptos. Em sociedades desenvolvidas, mesmo se “descondenados”, corruptos não assumem cargos de poder, não se abraçam em fotografias, não são convidados para aniversários nem se sentam à mesa de pessoas honestas. Que tal aplicarmos os mesmos conceitos por aqui?

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