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CEO do Banco dos Brics: "Brasil vai virar a Arábia Saudita dos alimentos"

Marcos Troyjo esteve em Vitória e disse acreditar que o forte crescimento de China e Índia vão beneficiar muito o Brasil, que deve ver sua renda crescer

Publicado em 16/07/2022 às 03h59
O diplomata Marcos Troyjo faz palestra em Vitória
O diplomata Marcos Troyjo faz palestra em Vitória. Crédito: Arthur Tavares/Divulgação

Marcos Troyjo, presidente do Novo Banco de Desenvolvimento (NDB), mais conhecido como Banco dos Brics (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul), esteve em Vitória na semana que passou em evento realizado pela consultoria Vieira & Rosenberg e Valor Investimentos. Embora reconheça que o momento seja de muitas turbulências, ele está otimista. "Esse tipo de cenário internacional que se descortina é muito favorável para o Brasil. O mundo vai precisar de comida e infraestrutura".

Troyjo faz, entretanto, um alerta sobre as necessárias reformas estruturantes. "O Brasil pode se reconfortar nessas rendas adicionais que virão na forma de superávit comercial e não fazer as mudanças estruturais ou, pelo contrário, pode usar essa injeção de recursos para fazer a diversificação da sua economia, e aumentar o nível de investimentos em pesquisa e desenvolvimento que é o grande motor do aumento da produtividade".

Sobre as eleições de outubro, o diplomata afirma que as potencialidades brasileiras são mais fortes e atraentes do que os ciclos políticos.

Estamos em um momento bastante intrincado no planeta. Pandemia, guerra, inflação, crise econômica, populismo... Mas mesmo assim o senhor se mostra otimista. Quais são os motivos?

Estou olhando as coisas a partir de uma perspectiva brasileira. Há uma mudança estrutural no mundo, em que a principal fonte de crescimento serão as economias emergentes com grande contingente populacional e com renda média baixa. Quando o crescimento se dá a partir de um nível tão baixo, esse espaço entre o momento atual e o momento futuro é um espaço em que a renda adicional é direcionada para o consumo de alimentos e ao investimento em infraestrutura. David Ricardo, um economista do século XIX, dizia que países tinham vantagens comparativas. Quais são as do Brasil? O agronegócio e a produção de insumos para a indústria siderúrgica. Portanto, esse tipo de cenário internacional que se descortina é muito favorável para o Brasil. O que pode acontecer: o Brasil pode se reconfortar nessas rendas adicionais que virão na forma de superávit comercial e não fazer as mudanças estruturais ou, pelo contrário, pode usar essa injeção de recursos para fazer a diversificação da sua economia, e aumentar o nível de investimentos em pesquisa e desenvolvimento que é o grande motor do aumento da produtividade. As condições externas são muito boas para o Brasil. Não é para todo mundo, mas é para o Brasil.

O senhor diz que o Brasil pode virar a Arábia Saudita dos alimentos. O que isso significa?

É isso mesmo, o Brasil vai virar a Arábia Saudita dos alimentos. Muitos países do Oriente Médio viraram países de alta renda - Catar, Emirados Árabes, Arábia Saudita, Bahrein, Omã - baseados na produção e exportação de combustível fóssil. No caso do Brasil, a principal fonte de receita será o comércio de alimentos. Num cenário em que países com grande população vão crescer muito, o Brasil está "fadado" a acumular sucessivos superávits comerciais ao longo do tempo. Isso ajudará o Brasil a ter os recursos necessários para fazer os investimentos em capacitação e requalificação da sua força de trabalho na sua neo-industrialização. Claro, se bem utilizados os recursos, afinal, o Brasil pode desperdiçar essa oportunidade assim como já desperdiçou em outras ocasiões.  

Marcos Troyjo

CEO do Banco dos Brics

"Num cenário em que países com grande população vão crescer muito, o Brasil está "fadado" a acumular sucessivos superávits comerciais ao longo do tempo"

O que fazer para não desperdiçar? Onde precisamos mexer?

Reforma tributária. Não pela questão de quanto pagamos, mas, sobretudo, é preciso mexer na complexidade do sistema. Temos a questão do ambiente de negócios. Recentemente tivemos a lei da liberdade econômica, que diminuiu muito o tempo para abertura e fechamento das empresas, mas é importante prosseguir na agenda. O Brasil também precisa de mais acordos internacionais de comércio. É uma agenda que pode destravar, por exemplo, os investimentos em tecnologia e inovação. O Brasil está investindo, há algum tempo, 1% do PIB no setor. Os países da OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico) investem 2,5%. Isso que dá aumento de produtividade, quanto mais produtividade tivermos, mais teremos razões internas para aumento de renda, que é o que interessa ao Brasil. Ao longo do tempo o Brasil cresceu muito por conta do consumo do mercado interno, isso vai continuar, temos 210 milhões de habitantes, mas é preciso diversificar. O consumo do mercado externo vai nos ajudar e os investimentos em infraestrutura, que já estão contratados, também. E aí vem uma quarta força, que gera os maiores ganhos, que é o crescimento por inovação. Aqui, infelizmente, o Brasil não tem feito a sua lição de casa, são várias as dificuldades. É o que está faltando para termos um crescimento sustentado.

Como o senhor enxerga esse cenário de polarização política no país e de que maneira as eleições de outubro influenciam este cenário traçado?

No caso do Brasil, as potencialidades serão sempre mais fortes e atraentes do que as oscilações naturais dos ciclos eleitorais.

Então o senhor não enxerga nenhuma possibilidade de ruptura ou quebra de ciclo?

O Brasil está numa rota para continuar sendo um dos cinco maiores destinos de investimento estrangeiro direto.

Marcos Troyjo

CEO Banco dos Brics

"E aí vem uma quarta força, que gera os maiores ganhos, que é o crescimento por inovação. Aqui, infelizmente, o Brasil não tem feito a sua lição de casa, são várias as dificuldades"

O senhor é presidente do Banco dos Brics. Como o Brasil está sendo percebido lá fora?

O Brasil é uma superpotência agrícola, é uma superpotência ambiental, tem dimensões continentais, é um líder regional, é quarta maior economia do mundo emergente, é a oitava maior economia do mundo, portanto, não importa o tabuleiro em que você esteja jogando, o Brasil é um jogador importante. Em tempos mais recentes há uma questão adicional que é a dimensão da pujança brasileira como fornecedor de dois elementos fundamentais para você atacar a dupla crise: segurança alimentar e segurança energética. O Brasil tem a matriz energética mais limpa do mundo, tem uma adoção consolidada de combustíveis alternativos e, hoje, de cada cinco pratos de comida servidos no mundo, um é produzido no Brasil.

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