Publicado em 18 de fevereiro de 2020 às 15:38
Por 4 votos a 2, a Comissão de Ética Pública da Presidência de República arquivou nesta terça-feira (18), mesmo sem instaurar uma investigação, denúncia sobre conflito de interesse que envolve o chefe da Secom (Secretaria Especial de Comunicação Social), Fabio Wajngarten.>
?Como noticiou a Folha de S.Paulo em 15 de janeiro, o secretário recebe, por meio de uma empresa da qual é sócio majoritário, a FW Comunicação, dinheiro de TVs e de agências de publicidade contratadas pelo próprio órgão que ele comanda, ministérios e estatais do governo Jair Bolsonaro.>
Mesmo havendo indícios contra o secretário, que levaram a Polícia Federal a abrir um inquérito contra ele para investigar práticas de corrupção e peculato, a maioria do colegiado o autorizou a prosseguir no governo ?apesar de deter 95% das cotas da empresa.>
No placar, votaram a favor de Wajngarten o relator do caso, Gustavo Rocha, os conselheiros André Tavares e Milton Ribeiro e o presidente Paulo Henrique Lucon. A favor da abertura da investigação se posicionaram Erick Vidigal e Ruy Altenfelder.>
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Segundo Lucon, o fato de Wajngarten não exercer mais cargo na gestão da empresa é o suficiente para que ele possa continuar como sócio majoritário. Ele ponderou, no entanto, que o caso pode ser retomado caso surjam novos indícios na investigação da PF.>
?Não pesou na questão ética. Na análise da legislação cabível, não pesou. Neste momento, em razão das funções que a empresa exerce de controle da concorrência, não haveria qualquer conflito de interesse na visão da Comissão de Ética?, disse.>
A defesa do secretário já havia apresentado os seus argumentos escritos para o órgão federal. Mesmo assim, foi autorizado ao advogado de Wajngarten, Fernando Fernandes, participar do encontro desta terça-feira.>
Segundo relatos de presentes, durante uma espécie de exposição oral, ele acusou a Folha de S.Paulo de tentar ?forçar uma decisão? junto à Comissão de Ética e disse que a imprensa persegue o secretário de comunicação.>
Questionado, Lucon disse que a presença do advogado, o que não era comum em gestões anteriores, faz parte de um procedimento recente de abertura de defesa prévia. Segundo ele, o argumento da defesa contra a imprensa não pesou na decisão.>
?Esta Comissão de Ética não pode se pautar pela imprensa. Evidentemente, que o papel [da imprensa] é importante, prestando informações. É relevantíssimo, levamos em consideração o que foi noticiado. Mas é claro que a análise tem que ser objetiva e dentro da norma existente?, disse.>
A denúncia contra Wajngarten, baseada em reportagens da Folha de S.Paulo, foi ingressada pelo PT, PSOL e PC do B. O relator do caso, Gustavo Rocha, foi ministro dos Direitos Humanos da gestão Michel Temer e, atualmente, é secretário de Justiça e Cidadania do Distrito Federal, na gestão de Ibaneis Rocha (MDB).>
Após a decisão da Comissão de Ética, Wajngarten utilizou a comunicação oficial da Presidência da República para divulgar uma nota em sua defesa. O texto avalia a não abertura da investigação como um "marco na defesa" do chefe da Secom.>
"Prevaleceu a verdade e o bom senso. Não há nada de aético ou ilegal na atuação do secretário Fábio Wajngarten, à frente da Secretaria de Comunicação. A denúncia arquivada é um atestado de idoneidade a ele", ressaltou.>
O texto ainda acusa a Folha de S.Paulo de fazer uma "insidiosa campanha" contra Wajngarten com "calúnias" e "difamações" que, segundo ele, "se revelaram infrutíferas".>
Entre os contratantes da empresa de Wajngarten, a FW, estão Record e Band, além da agência Artplan. As três passaram a ser contempladas com percentuais maiores da verba da Secom na gestão de Wajngarten, que começou em abril passado. O secretário nega a existência de conflito de interesses.>
A legislação vigente proíbe integrantes da cúpula do governo de manter negócios com pessoas físicas ou jurídicas que possam ser afetadas por suas decisões.>
A prática implica conflito de interesses e pode configurar ato de improbidade administrativa, se demonstrado benefício indevido. Entre as penalidades previstas está a demissão do agente público. >
Reportagem da Folha de S.Paulo desta segunda-feira (17) já antecipava a tendência de arquivamento. Isso porque tinha ganhado força a ideia de arquivamento, sem apuração ou julgamento do mérito, sob a justificativa de que a PF conduz investigações a respeito, de caráter criminal.>
Após as revelações da Folha de S.Paulo, a PF abriu inquérito para apurar o envolvimento de Wajngarten em supostas práticas de corrupção passiva, peculato (desvio de recurso por agente público) e advocacia administrativa (patrocínio de interesses privados na administração pública).>
Os precedentes da comissão de ética, em casos como o do secretário, são de aplicar uma advertência e recomendar que o agente público deixe a sociedade. Em ao menos um caso a proposta da comissão foi a de propor exoneração de servidor que ocultou seus negócios das autoridades.>
Ao assumir o cargo, Wajngarten omitiu informações sobre as atividades e os contratos de sua empresa em declaração entregue à comissão.>
Até a semana passada, em conversas reservadas, integrantes do colegiado aventavam a abertura de uma investigação ou a aplicação imediata de advertência.>
A lei que busca prevenir o choque entre os interesses público e privado na administração federal veda ao servidor de qualquer escalão exercer atividade que implique ?a prestação de serviços ou a manutenção de relação de negócio com pessoa física ou jurídica que tenha interesse em decisão dele ou de colegiado do qual participe?.>
Ela também proíbe o agente público de ?praticar ato em benefício de interesse de pessoa jurídica de que participe o agente público, seu cônjuge, companheiro ou parentes, consanguíneos ou afins, em linha reta ou colateral, até o terceiro grau, e que possa ser por ele beneficiada ou influir em seus atos de gestão?.>
O secretário nega haver conflito de interesses. Em sua defesa ao colegiado, ele propôs transferir suas cotas para a própria mulher, Sophie Wajngarten, que tem participações em empresas do setor de publicidade.>
Em 2013, no governo de Dilma Rousseff, o então diretor de Gestão da ANS (Agência Nacional de Saúde Suplementar), Elano Figueiredo, pediu demissão após a Comissão de Ética Pública recomendar sua exoneração por conflito de interesses.>
Figueiredo foi acusado de esconder que, antes de assumir o cargo, tinha trabalhado para uma operadora de planos de saúde, mesmo setor que o órgão fiscaliza.>
No ano seguinte, o então ministro da Saúde de Dilma, Arthur Chioro, esteve na mira da comissão por ser dono de uma empresa de consultoria na área de saúde, a Consaúde.>
Inicialmente, ele havia passado suas cotas para o nome da esposa, mas a comissão só arquivou uma denúncia contra o ministro após ele comprovar que a empresa foi desativada.>
O colegiado recomendou a Chioro "observar, em especial, que, na eventualidade da retomada das atividades da empresa Consaúde, evite a configuração de conflito de interesse tal como previsto" na lei.>
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