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País perde R$ 8 bilhões com cancelamento de festas do Carnaval, diz CNC

País perde R$ 8 bilhões com cancelamento de festas do Carnaval, diz CNC

Cerca de 25 mil empregos temporários não serão criados, segundo a CNC (Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo)

Publicado em 11 de fevereiro de 2021 às 17:21- Atualizado há 3 anos

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Comissão de Frente da Mocidade Unida da Glória no Carnaval 2020: foto estará presente na exposição
Comissão de Frente da Mocidade Unida da Glória no Carnaval 2020: foto estará presente na exposição. (Bruno Barros)

O cancelamento do Carnaval para conter aglomerações e o contágio da Covid-19 não suspenderá apenas a folia nacional. Haverá impacto sobre a geração de riqueza e de postos de trabalho.

Dados reunidos com base nos festejos de 2020 indicam que pelo menos R$ 8 bilhões deixarão de circular na economia. Cerca de 25 mil empregos temporários não serão criados, segundo a CNC (Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo).

De acordo com Fábio Bentes, economista da CNC, por causa de sua capilaridade, é até complicado dimensionar a suspensão do Carnaval.

Pesquisa da entidade com 3.800 municípios mostra que a arrecadação da festa em 2020 cresceu 20% em relação a 2019, e a projeção antes da pandemia era de ascensão desse mercado.

Lembrando: no ano passado, a data ocorreu antes de o coronavírus ser oficialmente registrado no país. Na sequência, o turismo afundou.

"O Carnaval é considerado o Natal do setor de turismo. Mesmo com cancelamentos de pontos facultativos em alguns municípios, onde alguma receita ainda poderá ser gerada, a perda neste ano é drástica", afirma Bentes.

No Rio, 10 milhões de turistas movimentaram R$ 4 bilhões no ano passado. Como a festa carioca é mais longeva e tradicional, a sua suspensão é um baque, especialmente para o turismo de estrangeiros.

Em 2020, a ocupação de hotéis na capital fluminense foi de 98% no Carnaval. Neste ano, a expectativa é que seja de pouco mais de 50%, conta Alfredo Lopes, presidente do Sindicato dos Meios de Hospedagem do município.

Segundo a Sebastiana, associação de blocos de rua que representa 11 entidades do Rio, a festa emprega 5.000 trabalhadores com os bloquinhos.

A costureira Regina Nistaldo é um deles –ou era. Trabalhava havia mais de uma década produzindo roupas para a escola de samba Salgueiro.

"Desde fevereiro do ano passado não tenho costura para Carnaval. Para não dizer que não fiz nada, em novembro fiz uma roupa de porta-bandeira para um Carnaval virtual", diz. "Mas a gente aprende a se reinventar: ganho hoje por volta de R$ 2.000 por mês vendendo salpicão e empadão no condomínio da minha filha e faço faxina também."

Na Bahia, a estimativa é que haja pelo menos cem trios elétricos parados. Em Salvador, a estimativa da prefeitura é que a festa tenha, no ano passado, movimentado R$ 1,8 bilhão, gerando cerca de 215 mil empregos temporários.

Em 2020, a cidade recebeu 850 mil turistas no Carnaval, segundo a Saltur, empresa de turismo da capital baiana.

Dono de dois dos maiores trios elétricos de Salvador, José Barreto Góes afirma que o cancelamento será mais um baque para o setor de entretenimento, que está parado desde março do ano passado.

Ele diz que optou por manter sua equipe de 20 funcionários que trabalham diretamente com os trios elétricos, que inclui de motoristas a engenheiros de som. O custo anual com a equipe é de R$ 320 mil.

"Se demitir, você perde sua equipe. E não dá para abrir mão de profissionais que são altamente especializados", diz.

No Recife, o movimento em lojas de fantasia caiu até 70%.

Maria Isabel Moreira, dona de uma das lojas, diz que começou a migrar para decoração de festas infantis.

"Estamos estimulando o uso de fantasias em festas de aniversários. Produzimos o que a pessoa deseja. É a lei da sobrevivência", afirma.

Robson Sena, dono de uma empresa que monta estruturas e palcos, deixou de faturar R$ 1 milhão e está migrando para a construção civil.

"O impacto é enorme para as empresas que trabalham montando a estrutura para apresentação dos artistas. Estamos fazendo, agora, pequenas obras. Tive que migrar."

Segundo a Aspeine (Associação Pernambucana das Empresas de Infraestrutura de Eventos), o impacto da não realização do Carnaval é da ordem de R$ 100 milhões.

Na capital paulista, a suspensão interrompe um momento de ascensão da folia. Os bloquinhos ganharam espaço nos últimos quatro anos e transformaram a cidade em um novo ponto turístico carnavalesco.

No ano passado, foram 15 milhões de foliões pulando em 678 blocos. "São Paulo é nosso maior emissor [de turistas], e, como apertou as medidas restritivas, o movimento deve cair", diz Alfredo Lopes, presidente do Sindicato dos Meios de Hospedagem do município.

As lojas paulistanas, que vendem fantasias e adereços para várias partes do país, sentem a retração com mais força. As vendas nas lojas da Abrakadabra Fantasias, que tem quatro unidades na capital paulista e duas no interior de São Paulo, caíram 90%.

A gerente da loja do bairro de Pinheiros, na zona oeste, Silvana Duque, conta que, prevendo queda na demanda, a loja não fez estoque para o Carnaval. "Como já prevíamos, neste ano a gente quase não está tendo procura na loja", afirma.

O comércio popular, como o da rua 25 de Março, é o mais afetado. Nos Armarinhos Fernando, também não há procura de produtos que costumam atrair interesse dos foliões. O gerente Ondamar Ferreira diz que os clientes nem perguntam se tem item de Carnaval.

Quem trabalha na festa também foi afetado. Wallacy Vinicyos trabalhou nos últimos dez Carnavais, mas ficou sem trabalho ao longo da maior parte de 2020 em razão das incertezas dos desfiles.

"Nós que trabalhamos com cultura tivemos que dar um jeito. Como eu sou cabeleireiro, consegui retomar a profissão e obter uma renda. O auxílio emergencial também ajudou."

Por causa do aumento no número de casos de Covid-19, São Paulo fará os desfiles de escolas de samba em julho. Bentes, da CNC, diz que essa transferência não vai ajudar. O planejamento do Carnaval precisa ocorrer com dez meses de antecedência e, por causa das incertezas sobre a imunização, o setor de turismo prefere dedicar esforços para o Carnaval de 2022.

Para apoiar as atividades de blocos de rua de São Paulo, a Secretaria Municipal de Cultura irá realizar, de 12 a 28 de fevereiro, o evento virtual "Tô me guardando", com 300 atividades.

O historiador Milton Teixeira, do Instituto Venturo, lembra que, em outros momentos, governos tiveram dificuldade para interferir no Carnaval. Em 1912, a folia no Rio foi transferida para julho por causa da morte do Barão do Rio Branco, e os passistas pularam em fevereiro e em julho. No meio do surto de gripe espanhola, em 1919, ocorreu um Carnaval histórico.

"A ditadura militar tentou fazer o possível para acabar com o Carnaval de rua, e tinha até lei que botava em cana quem usasse máscara", afirma. "É difícil mexer com festa popular."

Como boa parte dos eventos carnavalescos no século 21 exige autorizações do poder público, a expectativa é que, desta vez, os foliões vão ficar em casa.

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