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É advogado especialista em Direito Médico

Médico e paciente: de quem é o ônus da prova nos tribunais

Recentemente, a 2ª Câmara de Direito Civil do Tribunal de Justiça de Santa Catarina (TJ-SC) acolheu o recurso de um médico e afastou a inversão do ônus da prova que havia sido aplicada contra ele em primeiro grau

  • Celso Papaleo É advogado especialista em Direito Médico
Publicado em 24/06/2022 às 13h57

Em regra geral, de acordo com o Código de Processo Civil, em uma ação cabe ao autor provar os fatos constitutivos de seu direito, enquanto que o réu contra-argumenta. Na relação médico e paciente, sendo considerada de consumo, a lei permite uma mudança: a inversão do ônus da prova, situação em que o médico deverá demonstrar que não errou, que praticou o ato profissional dentro dos protocolos técnicos e científicos e que a obrigação de indenizar não deve prosperar.

O Código de Defesa do Consumidor não prevê a inversão automática do ônus da prova, ficando a cargo do juiz, pelos seus próprios critérios, analisando o caso concreto, identificar se o paciente pode ser considerado hipossuficiente, seja por questões financeiras, seja por questões técnicas e, só assim, determiná-la.

O que observamos, no dia a dia forense, é um exagero do uso dessa medida, tornando regra algo que deveria ser aplicado com mais critério, após a análise da real condição do autor em produzir as provas para alcançar seu direito.

A certeza da concessão desse benefício, aliado ao fato de que, devido ao benefício da justiça gratuita, o autor não arcará com custas processuais e honorários de sucumbência, tem incentivado pacientes mal intencionados a processar médicos, mesmo não tendo a convicção de que existe um direito a ser alcançado, tornando essa prática um excelente negócio.

Recentemente, a 2ª Câmara de Direito Civil do Tribunal de Justiça de Santa Catarina (TJ-SC) acolheu o recurso de um médico e afastou a inversão do ônus da prova que havia sido aplicada contra ele em primeiro grau.

Nesse caso, os desembargadores acolheram a tese de que não houve a comprovação da hipossuficiência do autor na ação. Segundo eles, “há paridade de condições de produção de provas pelas partes, pois o paciente teve acesso ao prontuário médico e o juiz permitiu a prova pericial”.

O argumento predominante no sentido de legitimar a inversão do ônus da prova é que o médico possui maior condição de produzi-las, seja por deter maiores informações, maior capacidade econômica, de status social e de espírito de corpo da profissão.

No entanto, essas diferenças nem sempre são identificadas entre paciente e médico. Vale lembrar que os pacientes têm acesso ao prontuário, exames, laudos relatórios, anamnese e demais documentos, onde constam notas, evoluções, resultado de exames e observações acerca do tratamento, ou seja, possuem todo o arcabouço documental necessário e eficaz para poder apontar suas razões e produzir suas provas de maneira conveniente e justa.

Além disso, há a previsão de que ambas as partes se utilizem da figura do assistente técnico para subsidiar argumentos para a defesa, devendo ficar a aplicação da inversão do ônus como medida excepcional e nunca automática.

É com satisfação que percebo que alguns tribunais, a exemplo do de Santa Catarina, decidem de forma técnica e acertada sobre um tema que gera implicações substancias na defesa do profissional médico, analisando, de fato, o caso concreto e trazendo verdadeiro equilíbrio ao processo.

Este texto não traduz, necessariamente, a opinião de A Gazeta.

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