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É especialista em gestão pública e Secretário de Estado de Controle e Transparência

Impasse na duplicação da BR 101 exige discussão aberta e transparente

É absurdo constatar que conflito sobre pequeno trecho de 25 km inviabilize as obras dos demais 237 km de rodovia, ainda mais por nunca ter faltado a contrapartida dos capixabas – o devido pagamento do pedágio

  • Edmar Camata É especialista em gestão pública e Secretário de Estado de Controle e Transparência
Publicado em 08/06/2021 às 02h00
Acidente causou a interdição total da pista na BR 101, km 224, em Ibiraçú
BR 101 no Espírito Santo: imbróglio atrasa duplicação. Crédito: Julio Teixeira (@jotatx)

O mundo trilha há algumas décadas o caminho da concessão rodoviária como forma de reduzir acidentes, dar conforto ao usuário das vias, reduzir tempo de deslocamento, induzir o turismo, dentre tantas outras possibilidades. Já o Brasil parece olhar o pagamento da tarifa de pedágio como forma simplesmente de se desonerar da construção e manutenção de rodovias, pouco importando se as entregas serão feitas.

A par de todos esses obstáculos, governos seguidos não contribuíram para a estabilidade administrativa necessária a esses contratos de longo prazo. Um exemplo é intervenção, em 2019, por meio da Lei dos Caminhoneiros, que, entre outras mudanças, reduziu o valor do pedágio para caminhões que trafegam sem carga. Intromissão indevida rumo ao populismo.

Agora, em nova promessa, o presidente da República, Jair Bolsonaro, informou que haverá gratuidade nas novas concessões para motociclistas. Embora motociclistas estejam envolvidos em cerca de 20,26% dos acidentes nas rodovias concedidas no país, conforme dados da Associação Brasileira de Concessionárias de Rodovias, sendo um custo significativo da assistência pré-hospitalar disponibilizada pelas concessionárias – à qual continuarão tendo direito –, a isenção será custeada por todos os outros usuários.

Motociclistas também respondem por mais de 80% das internações por acidentes de trânsito, conforme dados do governo do Espírito Santo. Tentações populistas que fragilizam a solidez necessária para atrair investimento privado de longo prazo substituem políticas sérias de redução de danos.

A equação do pedágio, contudo, é relativamente simples: se alguém não paga, o investimento será mais longo, a menos que seja pago por alguém. Se, aparentemente, ninguém está pagando por quem deixou de pagar, esse rombo sobrará para todos, numa futura ação judicial da concessionária, suspendendo muitas vezes investimentos importantes, como duplicações.

No caso específico do Espírito Santo, a sociedade capixaba, no momento anterior à concessão, passou por uma década de gestão ineficiente nas rodovias federais tão importantes para o Estado, por meio do órgão rodoviário, Dnit. Restam na nossa memória as reiteradas – e diárias – matérias na TV exibindo acidentes causados – ou agravados – por más condições das pistas, ausência de sinalização e rodovias de pistas simples que já mereciam duplicação há tempos. Trocar uma gestão direta ineficiente pelo pagamento de pedágio que não entrega o produto mais esperado pelos capixabas – a duplicação da maior parte do trecho – é assombroso.

Dessa forma, vamos para dez anos da concessão da BR 101 que entregou parte ínfima do que prometeu, em que pese não ter faltado a contrapartida dos capixabas – o devido pagamento da tarifa. De CPI da Assembleia Legislativa a operação da Polícia Federal na empresa concessionária, já passamos por todos os capítulos de uma novela em que o pano de fundo é a falta de autonomia da agência responsável por regular esse mercado – inclusive fazendo cumprir com independência o contrato assinado. A exemplo do que registra recente editorial de A Gazeta, é absurdo constatar que o impasse sobre 25 km de rodovia inviabilize as obras dos demais 237 km. Falta, sobretudo, uma discussão aberta e transparente com os capixabas.

Este texto não traduz, necessariamente, a opinião de A Gazeta.

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