Publicado em 18 de maio de 2023 às 14:59
Um relacionamento conturbado, de acordo com relatos de parentes e vizinhos, terminou tragicamente na tarde da última segunda-feira (15). Ana Carolina Rocha Kurth, de 24 anos, foi morta a facadas dentro de um apartamento no Centro de Vitória. O suspeito é o companheiro da jovem, Matheus Stein Pinheiro, 24, que se apresentou à polícia nesta quarta-feira (17) e horas depois foi preso.>
"Soube que ela havia deixado o emprego, a pedido dele (namorado). Ele, supostamente, era bastante controlador, ciumento", disse Daniel Rocha, primo da estudante universitária, em entrevista à TV Gazeta. "No prédio, os vizinhos falavam que havia brigas recorrentes, inclusive com a polícia sendo chamada", acrescentou.>
O assassinato da universitária levanta, mais uma vez, a discussão sobre relacionamentos abusivos, que, muitas vezes, dão sinais de perigo antes mesmo do ato de violência física em si.>
Mas então, como é possível saber que a relação é tóxica e pode ter consequências até fatais? A dúvida surge, principalmente, porque muitas vítimas sentem medo, vergonha e têm a autoestima atacada por seus parceiros, fazendo com que demorem a perceber ou denunciar a violência sofrida.>
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De acordo com especialistas, não é raro que acusados de feminicídio e de agressões domésticas tenham ficha limpa na polícia e sejam vistos pela sociedade como pessoas acima de qualquer suspeita. O comportamento violento vai aparecendo de forma progressiva e sutil.>
É comum, também, que, ainda durante o período de conquista, os homens se apresentem com um perfil romântico, compreensível e cuidadoso. Com o passar do tempo, no entanto, começam a mostrar sinais de quem realmente são, por meio de situações de ciúme, domínio e opressão. É aí que representam um risco à integridade emocional, física e psicológica das companheiras.>
Esse sentimento de posse começa a aparecer quando o homem passa a tomar decisões pela mulher e controlar seus horários, roupas e atividades. A professora da Ufes e coordenadora do Laboratório de Pesquisas sobre Violência Contra a Mulheres no Espírito Santo, Brunela Vincenzi, ressalta que a Lei Maria da Penha lista cinco tipos diferentes de violência: física, psicológica, patrimonial, moral e sexual.>
"Mostro na minha aula que pedir o salário da mulher no fim do mês, por exemplo, é um tipo de violência, a patrimonial. É necessário admitir os fatos e conscientizar as pessoas", disse.>
Em relacionamentos tóxicos, o homem é agressivo nas palavras, faz constantes ameaças, xinga durante discussões e faz ataques à confiança e autoestima da mulher. Ele ainda pode ser manipulador ao inverter situações de briga, se colocar como vítimas e fazer a mulher acreditar que é culpada pelas agressões que sofre.>
O comportamento da vítima também é fruto do abuso no relacionamento, que piora gradativamente. Em muitas situações, quando os comportamentos tóxicos começam, as mulheres passam a se isolar, entram em depressão e desenvolvem, até mesmo, fobia social.>
Juliana Saadeh
Titular do Delegacia Especializada Atendimento à Mulher (Deam) de VitóriaA orientação é: ao perceber qualquer um desses sinais, a mulher precisa buscar ajuda e denunciar o agressor. Mas, infelizmente, essa situação nem sempre é realidade. Muitas mulheres que sofrem abusos silenciam-se e sentem dificuldades em buscar ajuda para sair desses relacionamentos. >
Chefe da Divisão Especializada de Atendimento à Mulher, a delegada Cláudia Dematté explica que esse silenciamento muitas vezes é motivado por vergonha. "Muitas se calam por vergonha da própria família, dos vizinhos, dos amigos, de ser julgada, por causa dos filhos.">
Colocar um ponto final nessa relação, no entanto, não está nas mãos apenas da vítima. Ela precisa de suporte, tanto da família e amigos quanto do poder público. Com acolhimento, sem julgamentos.>
Renata Bravo, mestra em Direitos e Garantias Fundamentais e idealizadora do coletivo Juntas e Seguras, diz que o grupo criado para dar apoio a meninas e mulheres é uma alternativa, inclusive com indicações de locais para buscar ajuda. >
Renata Bravo
Mestra em Direitos e Garantias FundamentaisRenata reconhece, no entanto, que não se trata de uma tarefa simples. >
"Não é só arrumar as coisas e sair de casa porque, além da dependência emocional, muitas vezes também há a dependência econômica; é ele quem controla o dinheiro. A forma de saída para essa mulher é mais um movimento externo que dela. O que quero dizer é que toda a sociedade, os coletivos, a mídia, como neste projeto Todas Elas, têm que dizer 'se está em um relacionamento abusivo, tem muita gente para te apoiar'.">
A mulher, orienta Renata, deve sempre ter uma amiga, uma colega de trabalho de quem seja confidente e possa contar o que se passa na relação. O problema, na maioria das vezes, é que em uma união marcada por abusos, um dos atos de violência é justamente afastar a companheira da família e amigos, a deixando isolada.>
"Sendo amiga ou parente de uma mulher numa relação abusiva, é importante que se faça presente, ainda que não concorde com o relacionamento. Nossa tendência é nos afastar, afirmando 'estou falando e ela não enxerga'. Mas é fundamental mudar essa postura e dizer 'quando precisar, estou aqui'. A rede de apoio não é só do Estado, de quem é dever amparar, mas somos todos nós", frisa.>
Saiba onde denunciar casos de violência contra mulher no Espírito Santo
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