> >
Avanço da IA deve gerar mais obstáculos para mulheres no mercado de trabalho

Avanço da IA deve gerar mais obstáculos para mulheres no mercado de trabalho

Estudos apontam que 79% das mulheres no mundo estão em ocupações suscetíveis à automação; entre as soluções está o desenvolvimento de políticas que apoiem a inclusão

Publicado em 16 de junho de 2025 às 15:21

Fernanda Modolo, advogada
Em palestra, Fernanda Modolo apresentou desafios e perspectivas do uso da IA no mercado de trabalho para mulheres Crédito: Divulgação

Muito se fala sobre a inteligência Artificial (IA) e os impactos que essa tecnologia pode gerar no mercado de trabalho. Mas quando as análises são feitas sob a perspectiva de gênero, as mulheres aparecem em desvantagens em relação aos homens. Isso porque, para elas, haverá mais obstáculos do que portas abertas. 

A transformação do trabalho por conta das tecnologias é tão relevante que a Organização Internacional do Trabalho (OIT), vinculada à Organização das Nações Unidas (ONU), realiza pesquisas sobre o assunto desde o ano de 2023. O estudo aponta que 79% das mulheres no mundo estão em ocupações suscetíveis à automação.

Para a advogada trabalhista e digital Fernanda Modolo, o resultado dos estudos não são nada animadores para o público feminino. Segundo ela, as desvantagens vão desde o machismo até a falta de incentivo para que elas ocupem lugares também nessas áreas tecnológicas.

9,6% das mulheres

serão mais atingidas pela IA, em comparação com 3,5% dos homens

“As pesquisas mostram efetivamente que as mulheres serão as mais impactadas negativamente pela IA. E isso tem uma razão de ser. O setor de programação, por exemplo, é composto normalmente por homens brancos e heterossexuais. E eles vêm com toda uma bagagem cultural que naturalmente passa para os sistemas de IA. Se a gente analisar o grupo de mulheres negras e o grupo LGBTQIAPN+, o quadro é ainda pior e discriminatório. A solução é incluir esses grupos até para ter um olhar mais diferenciado na hora de fazer a programação do sistema IA”, constata.

O assunto foi abordado por Fernanda Modolo em uma das palestras do 35º Conexa H, congresso promovido pela Associação Brasileira de Recursos Humanos, seccional Espírito Santo (ABRH-ES), no início de junho.

Reflexos negativos

Com o tema "A inteligência artificial vai abrir portas ou criar novos obstáculos para as mulheres no mercado de trabalho?", Fernanda Modolo tratou dos reflexos negativos para as mulheres e lembrou que o resultado tem a ver com a construção de uma sociedade machista em que as mulheres ainda ganham menos que os homens e têm menos possibilidades de ocupar cargos de liderança.

Fernanda ressalta que essas desvantagens se refletem também na questão de programação do sistema IA. Ela cita o estudo feito por uma professora da Universidade de Brasília (UnB) que analisou a inserção das meninas nos cursos de engenharia de computação. A pesquisadora concluiu que a participação feminina ainda é muito pequena.

"Culturalmente, as mulheres nunca foram incentivadas a estudar matemática. Então, lá na ponta, vão faltar profissionais femininas de programação, o que acaba trazendo todo um viés masculino na construção desse sistema IA"

Fernanda Modolo

Advogada

Para reverter este quadro, Fernanda acredita ser necessário desenvolver ações que integrem as mulheres no ramo da tecnologia. Uma alternativa seria, ainda no ensino médio, construir uma base garantindo a elas que são capazes de ingressar neste segmento.

“Vem da raiz a questão da exclusão das mulheres no mercado de trabalho. Acredito que as organizações governamentais e não governamentais precisam traçar políticas públicas e legislativas para desenvolver programas que incentivem as empresas a contratarem profissionais femininas na área de tecnologia. Sozinhas elas não conseguem, mas quando se trabalha em grupo, com iniciativas de inserção, é possível sentir a diferença sendo feita”, defende. 

Sobre a IA acabar com os empregos, Fernanda salienta que a tecnologia deve transformar o mercado de trabalho, principalmente em áreas específicas. As maiores sequelas devem ser sentidas nos setores de finanças, programação de software e mídias.

Para a advogada, o sistema de IA deve substituir os trabalhadores que exercem atividades de repetição, sobretudo em áreas urbanas, e mulheres. Por outro lado, Fernanda salienta que cargos de gestão e de liderança não serão tão afetados assim, bem como os profissionais liberais, como médicos, arquitetos, contadores, advogados, engenheiros, entre outras posições.

A inteligência artificial, na avaliação da especialista, tem mais probabilidade de aumentar do que destruir os empregos. “Outro ponto importante é que haverá melhor qualidade dos postos de trabalho, e não uma redução da quantidade”, estima. 

Ela lembra ainda que existe uma expressão no mercado chamada de letramento digital, que é efetivamente a educação midiática, a instrução para trabalhar com as questões tecnológicas.

Entre as iniciativas já em vigência a Lei 14.533, de 2023, cujo objetivo é aprimorar o acesso e o uso de recursos digitais pela população, especialmente em áreas como educação, inclusão e desenvolvimento de habilidades digitais.

Esse trabalho, segundo Fernanda, começa nas escolas, nas universidades e indica como as empresas recebem os profissionais, ou se essas organizações percebem que os colaboradores não estão educados nessa perspectiva digital. A organização precisa também trazer um treinamento específico para esses profissionais, com destaca a advogada.

“A ideia é treinar as crianças, adolescentes e universitários a chegarem no mercado de trabalho com qualificações específicas para trabalhar em sistemas IA.”

Com um mundo cada vez mais tecnológico, as organizações precisam se proteger para não haver vazamento de dados. Neste caso, Fernanda orienta que, ao contratar um sistema de gestão de pessoas, por exemplo, é preciso verificar a política de privacidade deste software.

“Se, eventualmente, acontece algum tipo de vazamento ou utilização indevida dos dados pessoais dos seus trabalhadores, quem responde é o empregador. Então, antes de contratar o serviço, é necessário conferir se o sistema de IA tem políticas robustas de cumprimento à Lei de Proteção de Dados (LGPD). Caso não tenha, a orientação é comprar de outro fornecedor ou desenvolver um sistema a fim de reduzir os riscos”, comenta.

Este vídeo pode te interessar

  • Viu algum erro?
  • Fale com a redação

Tópicos Relacionados

Mulheres Mercado de trabalho

A Gazeta integra o

The Trust Project
Saiba mais