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0km mais caro: entenda por que o Brasil não vende mais carros populares

0km mais caro: entenda por que o Brasil não vende mais carros populares

Questionamos as entidades responsáveis e especialista do mercado para descobrirmos por que os carros novos estão tão caros ultimamente

Publicado em 3 de abril de 2023 às 10:39

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Renault Kwid 2023 chega ao mercado a partir de R$ 59.890
Modelos mais baratos de carro, atualmente, beiram quase R$ 70 mil. (Renault/Divulgação)

A verdade dói, mas temos de encará-la: o "carro popular" não existe mais no Brasil. Aqueles modelos direcionados para a classe média e média baixa são quase impossíveis de serem achados nas concessionárias, visto que até mesmo os automóveis da categoria "de entrada" das montadoras beiram, no mínimo, a quase R$ 70 mil. Mas o que explica os preços desses carros novos estarem tão caros nos últimos anos? Questionamos as entidades que representam o mercado automotivo para saber o que alegam.

Ainda que o termo “carro popular” tenha sido criado na década de 1990 para ampliar a parcela da população apta a adquirir um veículo zero km, ter um carro novo no Brasil nunca foi barato. No entanto, atualmente, parece que esse acesso vem ficando ainda mais difícil no país, fazendo com que o consumidor opte, na maioria das vezes, pelo seminovo ou usado.

Em nota, a Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea) explicou que o programa do carro popular surgiu durante o governo do presidente Itamar Franco, e há muito tempo deixou de existir. “Eram projetos antigos, com IPI reduzido e despojados de equipamentos, que não tinham nem retrovisor do lado direito, por exemplo”, exemplificou.

Com o aprimoramento das leis de segurança, de emissões e de eficiência energética, os carros, mesmo os de entrada, tiveram de passar por uma modernização sem precedentes, inclusive nas questões de motorização e de estrutura para deformação da carroceria em colisões. Itens como airbags, freios ABS e controle eletrônico de estabilidade agora são obrigatórios. E, proporcionalmente, o custo deles faz mais diferença no preço de um carro de entrada do que em um carro de maior valor agregado.

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Some, ainda, a demanda dos clientes por mais itens de conectividade e aos aumentos de custo de insumos provocados pela pandemia, pela alta do dólar e pela crise global de componentes. O exemplo mais gritante são os semicondutores.

Anfavea
Em resposta a Motor
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Todavia, os fatores que contribuíram para o encarecimento dos carros estão longe de serem só isso. Na avaliação do personal car e colunista de A Gazeta, Gabriel de Oliveira, outras questões explicam essa mudança no mercado de automóveis, mas o crescimento da exigência do público é um consenso.

“Você compraria hoje um carro sem ar-condicionado ou sem direção hidráulica ou elétrica? Abriria mão dos vidros elétricos e do fechamento das portas por meio do controle na chave?”, aponta.

Porém, ao deixar os carros mais equipados, as montadoras fazem mais do que atender aos desejos dos compradores e, quanto mais tecnologia é envolvida na produção de um carro, maior é a oportunidade de lucro das fabricantes. “Se, de um lado, os métodos de produção mais modernos tornaram a fabricação mais barata, de outro, as exigências dos compradores e as regulamentações fiscais e ambientais dos governos exigem cada vez mais conteúdo, o que faz com que os valores aumentem consideravelmente”, observa.

A Anfavea aposta, no entanto, que se os preços dos carros populares dos anos 1990 forem atualizados pela inflação, eles custariam praticamente o mesmo que os carros de entrada dos dias de hoje, mesmo com toda a diferença de nível tecnológico.

O que dizem as entidades responsáveis pelo tema?

O Sindicato dos Concessionários e Distribuidores de Veículos do Espírito Santo (Sincodives), quando procurado por Motor, alegou a mesma insatisfação dos consumidores: “Estamos procurando fechar acordo com as montadores e com instituições nacionais para um esforço mútuo para diminuir os preços dos carros de entrada. Os juros altos do financiamento certamente estão impedindo o mercado automotivo de trazer de volta a fatia que perdeu a possibilidade de mobilidade”, afirmou.

Já a Federação Nacional da Distribuição de Veículos Automotores (Fenabrave) foi demandada, mas até a publicação desta matéria, não enviou resposta. Caso a entidade responda, atualizaremos com o posicionamento.

Posicionamentos oficiais

Gabriel crê, no entanto, que o problema real está na margem de lucro que as montadoras brasileiras têm atualmente. “A título de comparação, a média de lucro nos Estados Unidos fica na faixa dos 3%. Enquanto isso, no Brasil, o lucro das montadoras fica na casa dos 10%. Ou seja, mais do que o dobro, se compararmos os dois países”, reflete.

Já a Anfavea justifica que oferecer ao mercado um carro de custo reduzido requer também uma série de ações do ponto de vista tributário por parte do governo, aliado a uma oferta de veículos despojados de alguns equipamentos que não sejam os de caráter obrigatório — basicamente itens de comodidade e conectividade.

“Os preços dos carros nos últimos anos subiram de forma praticamente alinhada à inflação. O que subiu mesmo foi o ticket médio (indicador que mensura a performance de vendas da empresa), já que a oferta e as vendas de veículos de entrada caíram, enquanto a procura por modelos como SUVs e picapes cresceu exponencialmente", frisou a associação, em nota.

A Anfavea destacou também que uma medida que pode ajudar é a melhoria das condições de financiamento, incluindo a redução da taxa de juros. "Hoje, apenas 30% das vendas de automóveis são financiadas. Há 10 anos eram 70%”, indicou.

Será mesmo que as vendas caíram?

Em janeiro, a Bright Consulting analisou o desempenho de vendas em 2022 e concluiu que a indústria automobilística se manteve estável nos últimos três anos e o encerramento do ano passado trouxe esperanças de um ano melhor em 2023.

Em outras palavras, por mais que a parcela de brasileiros com uma renda menor esteja com menos poder de compra de veículos novos, isso não parece estar atrapalhando tanto o crescimento do ramo.

De acordo com as informações da pesquisa, o ano fechou com 1,95 milhão, 1,2% inferior a 2021. É o terceiro ano consecutivo em que a indústria fecha levemente abaixo dos 2 milhões, consequência da pandemia, da crise logística, da falta de semicondutores, do aumento de preços e do aumento da taxa de juros.

Outro ponto interessante de analisar é que todos os equipamentos de auxílio à condução cresceram em 2023, com destaque para a câmera traseira, o turbo, o controle de cruzeiro adaptativo (ACC) e o retorno de navegação embarcada, no qual os veículos contam com centrais multimídia com GPS, sem a necessidade de conexão com o celular.

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