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Publicado em 14 de abril de 2023 às 16:28
Após a Assembleia Legislativa do Espírito Santo (ALES) aprovar o projeto de lei que define o sexo biológico como único critério para participação de atletas transgênero em competições esportivas, presidentes de federações de esporte do Estado se manifestaram. Para alguns dos dirigentes, o esporte é ferramenta de inclusão social e deve abraçar a todos sem discriminação. Para outros, o ideal é separar os atletas de acordo com o sexo biológico, como diz o projeto da ALES. >
O objetivo da proposta debatida e amplamente aprovada pelos deputados estaduais é que atletas transgênero não participem de competições no Espírito Santo pelo gênero em que se identificam, mas sim, pelo gênero em que nasceram. O texto aprovado é de autoria do deputado Capitão Assumção (PL), e uma proposta idêntica, protocolada posteriormente pelo deputado Vandinho Leite (PSDB), foi anexada à matéria votada.>
A pauta levantada na Assembleia contraria o Comitê Olímpico Internacional, que já sinalizou os critérios técnicos e específicos para a orientação e participação de pessoas transgênero no esporte.>
Monika Queiroz, presidente da Federação de Ginástica do Espírito Santo (Fesg), explica que o esporte deve ser trabalhado com todos, sem discriminação. “Oficialmente, pelas regras da Federação Internacional de Ginástica, nosso esporte é praticado apenas por mulheres [no sexo biológico]. Mas a presença de outros gêneros é totalmente bem-vinda, porque é uma prática que envolve corpo, músicas e aparelhos. A questão de proibições não faz sentido, já que outros países têm competições masculinas extraoficiais com o mesmo espaço e aparelhos estipulados pela regra oficial, ainda destinada somente às mulheres”, frisa.>
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Apesar das regras do órgão regulador da ginástica, Monika afirma que o esporte é uma ferramenta de inclusão social, e não deve afastar, mas sim acolher as pessoas. “É muito importante falarmos sobre as questões de gênero e do respeito às individualidades. Antes de tudo, nosso papel como dirigentes e gestores esportivos é abraçar todas as causas e aquilo que for melhor para o esporte, para estarmos longe de preconceitos e aliados ao respeito”, complementa.>
Já Marcelo Salermo, presidente da Federação de Bodyboard do Estado do Espírito Santo (Febbees), é favorável ao Projeto de Lei votado pela ALES. “Sou totalmente contra essa questão de mudança de gênero no meio do processo [esportivo]. Sei que as pessoas têm suas convicções e seus desejos, mas, na minha opinião, o ideal é vetar em 100% a participação de atletas transgênero, até porque a genética masculina é totalmente diferente da genética feminina e vice-versa”, diz Salermo.>
Cássio Murilo, presidente da Federação Capixaba de Triatlo (Fecatri) defende um aprofundamento maior no assunto, para que não haja discriminação no esporte. >
“Honestamente é um assunto muito polêmico, e justamente por isso, acho que necessitava de um aprofundamento maior. Eu, como pessoa física, e não pessoa jurídica como presidente da Fecatri, não sou a favor, mas mesmo assim acho que as coisas e as pessoas evoluem. E creio que haja a necessidade de uma evolução desse pensamento, mas só com uma grande pesquisa e aprofundamento no assunto. Na verdade, eu sou a favor de um esporte limpo, dentro das regras e onde todos tenham condições de disputar. Então se existe alguma dúvida quanto a isso, é algo que deve ser pesquisado antes de se liberar”, diz Cássio.>
André Schieck, presidente da Federação Capixaba de Atletismo (Fecat), explica que é cedo para que o impacto da participação de atletas transgênero seja mensurado. “É importante salientar que o esporte não se basta apenas a essa dimensão. O esporte pode, e deve ser utilizado como um meio de educação social, de inclusão social e promoção de saúde e lazer”.>
Para Schieck, o esporte possui dimensões que oportunizam a prática para todos na sociedade. “Quando nos referimos ao esporte de competição, este possui suas regras e regulamentos específicos que norteiam o trabalho de todas as instituições de administração do esporte na sociedade”.>
De acordo com André, os debates entre a Fecat, Confederação Brasileira de Atletismo (CBAt) e da World Athletics possuem regulamentos específicos de elegibilidade, e por isso, o órgão capixaba precisa agir consoante as demandas das entidades nacionais e internacionais. "Em relação aos atletas transgêneros, o conselho concordou em excluir atletas transgêneros masculinos para femininos que passaram pela puberdade masculina da competição feminina do Ranking Mundial a partir de 31 de março de 2023.", diz Schieck.>
Para Alberto Muniz, presidente da Federação de Surfe do Espírito Santo (Fesurf), o ideal seria a criação de uma categoria especifica para atletas transgênero, mas sem excluí-los da convivência e colaboração com os atletas cisgêneros (que se identificam com o sexo biológico que nasceram).>
“Acredito que devemos caminhar para a criação de uma categoria conforme o gênero. Se a pessoa nasceu no sexo masculino, mas se identifica como sendo do sexo feminino, ela deveria competir com pessoas que vivem a mesma realidade, e assim creio que haja um equilíbrio”, salienta o dirigente.>
Marcos Duarte, responsável pela Federação de Ciclismo do Espírito Santo (Fesc), explica que a Confederação Brasileira de Ciclismo estuda o assunto para compreender as particularidades de cada atleta dentro das competições, para que inclusão de atletas trans não se torne um tabu.>
“Tem um viés muito grande que precisa ser analisado pela ciência. O ciclismo é dividido em categorias de idade, pensando justamente no esforço e desempenho físico dos atletas. Não é só questão de ser homem ou mulher, mas sim de entender até onde o corpo suporta. Nesse momento, vejo que o mais viável seja a criação de categorias exclusivas para o público trans. Ou seja, as mulheres trans tendo sua categoria, e os homens trans com a sua, até que possamos chegar a um senso, com a ciência, de entender qual a melhor forma de atuação dos atletas diante do desenvolvimento no esporte”. >
Marcos complementa: “É um assunto delicado. Sou a favor da inclusão do público LGBTQIA+ no meio esportivo e que eles precisam de um espaço melhor na sociedade, pois já passam por discriminação e marginalização. Mas considerando a questão esportiva, não podemos pensar apenas na questão de respeito, mas sim a de igualdade no alto rendimento. São questões distintas e o preconceito ainda está no meio”, finaliza o presidente da Fesc.>
Para Pedro Paulo Francelino, da Federação Espírito Santense de Taekwondo (Festkd), os meios de inclusão no esporte não podem ser confundidos com os formatos de competição. “O esporte é para todos, independente de sexo, cor ou religião. Isso é fato, mas os esportes de competição são separados por modalidades masculinas e femininas, para que haja uma igualdade entre os atletas na proporcionalidade de peso, força e afins. A inclusão no esporte se dá por meio de projetos sociais, atendendo todas as classes e isso não depende de sexo ou de gênero”, explica Pedro Paulo. >
As federações capixabas de boxe, natação, vôlei, futebol e handebol também foram procuradas pela reportagem, mas até o encerramento desta matéria, não se pronunciaram.>
Após votado e aprovado pela Assembleia Legislativa, o texto que trata da participação de atletas transgêneros em competições esportivas foi enviado para sanção ou veto do governador Renato Casagrande (PSB). A legislação estabelece prazo de 15 dias para o governo se manifestar, assim que receber a proposta, com base em parecer da Procuradoria-Geral do Estado.>
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