Publicado em 26 de maio de 2020 às 21:32
O Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) vai abrir um Processo Administrativo Disciplinar (PAD) para investigar a conduta de um promotor de Justiça do Espírito Santo que recorreu de uma sentença que reconhecia a dupla paternidade do filho adotivo do senador Fabiano Contarato (Rede-ES) com seu marido Rodrigo Grobério. No recurso, Clóvis Barbosa Figueira argumentou que o "conceito constitucional de família não é outro senão entre homem e mulher". >
A decisão do CNMP, nesta terça-feira (26), de apurar possíveis infrações administrativas cometidas pelo promotor foi unânime. O processo agora será distribuído a um relator e, depois, julgado.>
O senador Fabiano Contarato adotou seu filho Gabriel, hoje com cinco anos, em 2017, antes de casar-se com Rodrigo Grobério. Após o casamento, eles ingressaram com ação na Justiça na 1ª Vara da Infância e da Juventude de Vila Velha pedindo o reconhecimento de dupla paternidade. >
Em dezembro de 2018, a juíza da Vara deu decisão favorável ao senador e ao marido, reconhecendo ambos como pais da criança. Contudo, o promotor que acompanhava o caso, Clóvis Barbosa Figueira, discordou da decisão judicial e entrou com um recurso alegando que a lei, quando menciona pais no plural, refere-se ao pai e à mãe. O recurso foi negado. Somente no ano passado o nome de Rodrigo foi incluído na certidão de nascimento como pai de Gabriel.>
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Para o promotor, não haveria "autorização legal para que um ser humano venha a ter dois pais, como pretendido, ou, pior ainda, duas mães". >
O casamento homoafetivo é reconhecido no Brasil por decisão do Supremo Tribunal Federal desde 2011 e também por Resolução 175 do Conselho Nacional de Justiça (CNJ). >
Apesar da vitória na Justiça, o senador entrou com uma representação contra Clóvis Figueira, alegando que ele agiu de forma preconceituosa em sua justificativa para recorrer da decisão. >
Nesta terça, os conselheiros do CNMP referendaram, por unanimidade, a decisão do corregedor Nacional do Ministério Público, Rinaldo Reis Lima, que, após analisar a representação do senador Fabiano Contarato, havia determinado a abertura do processo administrativo disciplinar. De acordo com Lima, o promotor faltou com respeito aos membros da instituição e seus pareceres são "preconceituosos", "dotados de índole negativa", além de atentarem contra a "dignidade institucional do cargo". >
O conselheiro Marcelo Weltzel também classificou a interpretação do promotor de Justiça como preconceituosa e disse que era um retrocesso para a sociedade. "Isso é um retrocesso hediondo nos termos que foi colocado. Apoio abertura [do processo administrativo], não há sentido que um agente do Estado, em suas manifestações, faça uso de preconceitos de qualquer natureza ainda mais em pleno século XXI em uma sociedade plural como a nossa", destacou. >
Em seu pronunciamento, o presidente da sessão, Humberto Jacques de Medeiros, ressaltou que a independência funcional é de direito do membro do Ministério Público, mas que foi extrapolada no caso relatado. "Não é a independência de entender algo diferente do entendimento dominante, mas como alguém se porta em suas posições pessoais no exercício da profissão. É necessário um processo disciplinar para aclarar todos os elementos desse fato ocorrido para apurar desvio ou abuso.">
Emocionado, o senador Fabiano Contarato acompanhou toda a sessão virtual. Ele disse que é preciso lutar pelo direito das minorais e o fim do preconceito na sociedade.>
Fabiano Contarato
Senador"Eu esperei muito por esse dia e acredito que esta decisão de abrir um processo administrativo contra um membro do Ministério Público é histórica. Eu estou muito feliz, porque isto representa um avanço na luta pela igualdade, não só pra mim mas para toda a população LGBTI+", finalizou. >
O advogado da Associação Espírito-Santense do Ministério Público, Renan Sales, que faz a defesa do promotor Clóvis Barbosa Figueira, disse que aguarda a intimação formal da decisão do Conselho Nacional. "Recebemos com respeito a decisão, muito embora não concordemos com a acusação. Vamos esperar sermos intimados para que a gente possa fazer uma análise e pensar o melhor caminho para exercer a ampla defesa dele. Não posso comentar o caso em si porque o processo administrativo está em sigilo", declarou. >
Ao final, o PAD que apura a conduta do promotor pode ser arquivado e não acarretar nenhuma punição. Já as possíveis penas vão de advertência a disponibilidade, que é quando o membro do MPES continua sujeito às vedações constitucionais, não pode advogar, por exemplo. Mas fica sem trabalhar, com vencimentos proporcionais ao tempo de serviço e pode ser reintegrado à carreira.>
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