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PGR é contra prisões de Armandinho e mais três no inquérito das Fake News

PGR é contra prisões de Armandinho e mais três no inquérito das Fake News

Órgão federal não reconhece a competência do Ministério Público do Espírito Santo para fazer petições diretamente ao gabinete do ministro Alexandre de Moraes, do STF

Publicado em 15 de dezembro de 2023 às 09:56

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Sede da Procuradoria-Geral da República, em Braília
Sede da Procuradoria-Geral da República, em Brasília, de onde foram emitidos pareceres contra as prisões. (Divulgação/João Américo)

O Ministério Público Federal (MPF) se manifestou contra as prisões do vereador de Vitória Armandinho Fontoura, do jornalista Jackson Rangel, do pastor Fabiano Oliveira — detidos em 15 de dezembro de 2022 — e também do radialista Maxcione Pitangui, preso em setembro deste ano, após decisão do ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), tomada no âmbito do Inquérito das Fake News.

Nos pareceres da Procuradoria-Geral da República (PGR) a que A Gazeta teve acesso, e que estão anexados ao inquérito, é requisitado que o processo de investigação contra os alvos seja arquivado. Todos são assinados pela então vice-procuradora-geral da República Lindôra Maria Araújo.

O primeiro documento data de outubro de 2022, ou seja, antes das prisões determinadas por Moraes, que é o relator do inquérito.

Nele, a PGR se manifesta a respeito dos pedidos de prisão, busca e apreensão, de quebra de sigilo telefônico/telemático e bancário feitos pelo Ministério Público do Espírito Santo (MPES) diretamente ao gabinete do ministro Alexandre de Moraes.

Narra o documento que uma investigação aberta pelo MPES em 2020 para verificar supostos crimes de lavagem de dinheiro e milícia digital, praticados por Jackson Rangel e outras 19 pessoas, teria revelado “virulentas postagens contra a Suprema Corte”.

Diante disso, o MPES pediu que fossem tomadas medidas contra 14 dessas pessoas investigadas e que a investigação local fosse anexada à apuração em curso no STF sobre o tema.

Nesse primeiro parecer, a PGR ressalta que o MPES não tem legitimidade para fazer esses pedidos ao STF. Isso porque, segundo a legislação, cabe à PGR atuar na função de Ministério Público junto ao STF.

“Trata-se de pleito que afronta o ordenamento jurídico, especialmente a esfera de atribuição de cada ramo do Ministério Público, não encontrando respaldo, ainda, na jurisprudência do Pretório Excelso (STF)”, diz a manifestação.

Ainda segundo a PGR, a inclusão da investigação estadual no inquérito tocado pelo STF criaria duas frentes investigativas que apuram as mesmas questões.

“A prevalecer o entendimento contrário (de que o MPES poderia requerer medidas de investigação ao STF), chegar-se-ia à esdrúxula situação de 26 ministérios públicos dos Estados poderem atuar concomitantemente e até mesmo composições contrapostas, em alijamento, à Procuradoria-Geral da República, em um mesmo inquérito de competência originária do Supremo Tribunal Federal”, escreveu o órgão.

Diante disso, a PGR pede que as petições do MPES não tenham seguimento e que os autos sejam arquivados.

Contrariando o parecer inicial da PGR, Alexandre de Moraes determinou as prisões e quebras de sigilo pedidas pelo MPES.

PGR NÃO VÊ MILÍCIA DIGITAL OU ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA

No fim de fevereiro deste ano, a PRG se manifestou sobre os pedidos de revogação das prisões preventivas de Armandinho, Jackson e Fabiano. Naquela data, Max Pitangui ainda estava foragido.

Além de voltar ao argumento da ausência de legitimidade do MPES para requisitar as medidas diretamente ao STF, disse que as postagens feitas em redes sociais, na tribuna da Câmara de Vereadores e nas publicações no site “Folha do ES”, não permitem identificar uma associação estável e permanente entre eles a ponto de qualificar a relação como milícia privada, ou organização criminosa.

“[...] inviável se mostra tipificar como constituição de milícia privada ou associação criminosa a conduta dos sujeitos investigados que se utilizaram, individualmente, a seu tempo e modo, de suas redes sociais e de suas posições políticas, sociais, religiosas para macular a honra alheia [...] notadamente contra o ministro relator e os ministros do Supremo Tribunal Federal.”

Diante disso, restaria a eles a imputação de supostos crimes contra a honra (injúria, calúnia e difamação) sobre os quais não se admite prisão preventiva, visto que as penas máximas previstas são inferiores a quatro anos.

Diante disso, pediu a revogação das prisões preventivas dos três suspeitos.

RECURSO

A PGR apresentou ainda ao STF um agravo regimental, tipo de recurso que visa fazer com que os tribunais provoquem a revisão de suas próprias decisões. É um dos recursos que podem ser usados contra decisões monocráticas em tribunais. Assim, a decisão tomada por um magistrado é reanalisada por um colegiado.

O órgão aponta “inconstitucionalidades e ilegalidades” da investigação e pede, novamente, que sejam anuladas as decisões tomadas até o momento, trancada investigação desenvolvida a partir do pedido do MPES e que os autos sejam enviados à primeira instância (Estado) para que os alvos sejam processados e julgados porque não haveria elementos que indicassem o envolvimento de autoridade com prerrogativa de função. Dessa forma, não haveria porque a investigação ocorrer no STF.

O agravo regimental foi protocolado ainda em dezembro de 2022, após as prisões, mas até o momento não foi apreciado pelo relator. Via de regra, ele deveria dar um parecer sobre o recurso, que deveria ser votado por outros ministros. Contudo, quem escolhe o momento de dar andamento a esse procedimento é o próprio relator.

MPES diz que tem legitimidade

A Gazeta tentou por três semanas contato com a procuradora-geral de Justiça, Luciana Andrade, mas ela não quis dar entrevista. Já o Ministério Público do Espírito Santo disse, em nota, que o procedimento tramita em segredo de Justiça no Supremo Tribunal Federal (STF) e que, por isso, não vai se pronunciar sobre o assunto.

Luciana já havia se pronunciado sobre o assunto em entrevista à colunista Letícia Gonçalves, em julho de 2023. Na ocasião, ela disse que o MPES tem legitimidade para atuar na questão. "O próprio Supremo já estabeleceu precedentes nesse sentido, de que podemos atuar. É compreensível eventual crítica porque é uma estratégia de defesa. Mas se o Supremo recebeu petições (do MPES), analisou e deferiu medidas..."

O STF e a PRG também afirmaram que não vão se pronunciar por conta do sigilo aplicado sobre os autos.

PROCURADORA É CONSIDERADA CONSERVADORA E BOLSONARISTA

Lindôra Araújo exerceu o cargo de vice-procuradora da República entre 2022 e 2023. Ela era considerada o braço direito do Procurador-Geral da República Augusto Aras, escolhido pelo ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) para o cargo .

Ela é uma das principais vozes da ala conservadora da instituição e foi criticada por sua proximidade com o bolsonarismo. Lindôra, com aval de Aras, atuou em investigações que atingem aliados do ex-presidente, mas também enfrentou desgaste durante a pandemia ao colocar em dúvida a eficácia do uso de máscaras.

Em junho deste ano, documentos sigilosos divulgados pela revista Veja revelaram críticas da procuradora à atuação do STF e de Alexandre de Moraes nos processos envolvendo Bolsonaro e seus aliados.

Neles, a Procuradoria-Geral da República insinua que Alexandre de Moraes autorizou procedimentos ilegais, decretou prisões sem fundamento e tentou promover o que na Justiça se chama de “pesca probatória”, que é quando é feita uma diligência sem justificativa plausível e que permite que sejam recolhidas provas aleatórias do crime investigado ou qualquer outro.

NOVO PGR PODE MUDAR DESTINO DE INVESTIGADOS

O mandato de Aras já acabou e o presidente Lula (PT) indicou para o posto o procurador-geral eleitoral interino, Paulo Gonet Branco. Ele foi sabatinado nesta quarta-feira (13) pela Comissão de Constituição e Justiça do Senado, e seu nome foi aprovado para comandar a PGR.

Ele é conhecido por ser “ultracatólico” e conservador. Na sabatina, foi questionado pelos parlamentares sobre o inquérito das Fake News, mas evitou comentar o assunto justificando que não teve acesso à integralidade dos autos, pois estão em sigilo. Ele falou, porém, que considera que a liberdade de expressão deve ser “modulada”.

"A liberdade de expressão, portanto, não é plena. E a liberdade de expressão pode e deve ser modulada de acordo com as circunstâncias", disse.

Uma vez concluídas as investigações sobre os alvos do inquérito no Espírito Santo, caberá à PGR decidir se eles serão denunciados ou não.

Procurado, o advogado do vereador Armandinho, Carlos Zaganelli, disse que não tinha autorização de seu cliente para conceder entrevistas e, pelo fato dos processos serem sigilosos, não poderia se manifestar. Ele reiterou, contudo, que seu cliente "permanece confiando no bom senso de justiça das autoridades em nosso país e que a verdade continuará sendo perseguida nos autos dos processos."

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