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O ano na Assembleia Legislativa do ES: polêmicas e testes na relação com governo

O ano na Assembleia Legislativa do ES: polêmicas e testes na relação com governo

Deputados estaduais assumiram neste ano o cargo e protagonizaram situações polêmicas em plenário. Governo Casagrande conseguiu a aprovação de matérias sem dificuldades

Publicado em 23 de dezembro de 2019 às 06:30

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Plenário da Assembleia Legislativa: ano foi de polêmicas e testes na relação com o governo. (Tati Beling/Ales)

Assembleia Legislativa ocupou posição de destaque no cenário político durante o ano de 2019, tanto por ter sido palco para a aprovação de projetos considerados sensíveis para o governo do Estado quanto pela própria instituição ter protagonizado situações polêmicas ao longo das 163 sessões ordinárias e extraordinárias no período.

O ano legislativo chegou ao fim na semana passada, com o início do recesso parlamentar, e no saldo da Casa foram contabilizadas novas medidas para tentar fortalecer a atual direção da Assembleia e o presidente Erick Musso (Republicanos); momentos de tensão com outras instituições, como o Ministério Público e o Executivo, no alinhamento de determinados interesses; e votações de projetos do governo Renato Casagrande (PSB) com placar folgado, sem muitas alterações e, geralmente, de forma célere.

Em janeiro, antes da posse da atual legislatura, em 1º de fevereiro, a Assembleia precisou se reunir para votar o Orçamento de 2019, recalculada pelo governo Casagrande, que discordou do texto elaborado pela gestão de Paulo Hartung (sem partido). Na ocasião, também aprovou a anistia administrativa para os policiais militares punidos pela greve de 2017, um projeto polêmico enviado pelo governador no primeiro mês de mandato.

Em fevereiro, além da posse, a Assembleia reelegeu Erick Musso para presidir a Mesa Diretora por mais um biênio, sem divergências. Poucos dias depois, o jovem deputado conseguiu o apoio de mais de dois terços dos pares para um projeto que concentrou nas mãos do presidente as atribuições de competência da Mesa Diretora e delegou atribuições administrativas ao diretor-geral da Casa, que vem a ser Roberto Carneiro, seu aliado de primeira ordem. Meses depois, outra norma foi alterada, ampliando os poderes do presidente. Agora, ele pode criar CPIs acima do número máximo permitido na Casa e pode, sozinho, indicar os membros das comissões especiais.

Ainda no primeiro mês de trabalho, o Legislativo estadual deu outra demonstração de aliança com o governador: elegeu Luiz Carlos Ciciliotti, ex-presidente do PSB e candidato apoiado pelo governo, como novo conselheiro do Tribunal de Contas do Estado (TCES). Para tanto, houve o recuo inclusive de parlamentares interessados na vaga, como Marcelo Santos (PDT).

PRIMEIRA POLÊMICA: RELATÓRIOS DOS ASSESSORES EXTERNOS

Em março, o Ministério Público Estadual (MPES) apertou o cerco contra os assessores externos dos gabinetes dos deputados, para que houvesse transparência na divulgação dos relatórios de atividades, única ferramenta utilizada para comprovar os serviços prestados. Em inquérito, o órgão cobrou que esses relatórios fossem publicados no Portal da Transparência, para evitar brechas, como a existência de servidores fantasmas.

Como resposta, a Assembleia formulou e aprovou uma lei obrigando todos os demais Poderes a publicar tais relatórios, criando um primeiro mal-estar. No fim, o texto foi vetado pelo governador, e o veto foi mantido pelos deputados. Poucas semanas depois, a Assembleia conseguiu acabar, por meio de resolução, com a obrigação de servidores externos da Assembleia de gerarem relatórios sobre os serviços. A medida não sofreu mais nenhum questionamento por parte dos órgãos de controle.

A resolução foi votada às vésperas do recesso parlamentar de julho, a toque de caixa, na mesma sessão em que os deputados aprovaram um polêmico projeto do Ministério Público, que criou 307 novos cargos comissionados para a instituição, mesmo após críticas de entidades e organizações.

INCITAÇÃO AO CRIME NO PLENÁRIO

A Assembleia também ocupou espaço nas manchetes nacionais em 2019 devido a um discurso de incitação pública ao crime, feito em setembro pelo deputado Capitão Assumção (PSL). Ele ofereceu R$ 10 mil a quem matasse o suspeito de um homicídio, em Cariacica.

Capitão Assumção, hoje no PSL, começou sua trajetória política no PSB de Casagrande. (Tati Beling)

A fala gerou críticas e motivou representações contra ele na Corregedoria da Casa e no Ministério Público, com questionamentos sobre a linha tênue entre imunidade parlamentar e quebra de decoro. Ainda não houve desfecho sobre o caso.

APROVAÇÃO DE PROJETOS DO GOVERNO

Ao longo do ano, os parlamentares votaram também projetos importantes para o governo do Estado: na segurança, aprovaram a reorganização dos quadros da Polícia Militar e a alteração dos critérios de promoção dos militares. Na saúde, referendou cinco leis que alteraram o sistema público, como a que buscou reduzir a judicialização na área e a que criou uma fundação estatal para geri-lo.

Na área econômica, a Casa aprovou o Fundo Soberano e o Fundo de Infraestrutura, que servirão para o Estado fazer poupança e investimentos com os recursos de royalties de petróleo. Os projetos passaram sem votos contra e sem emendas.

Também houve a aprovação de outras três importantes matérias referentes à reforma da Previdência Estadual, sendo uma delas uma proposta de Emenda à Constituição (PEC). Elas ocorreram no último e, certamente, mais turbulento mês para o Parlamento.

Isso porque tramitou outra PEC que autorizou que a eleição da Mesa Diretora da Casa pudesse ocorrer de maneira antecipada, e não em fevereiro de 2021, conforme a regra anterior. A data ficaria a critério do presidente. As duas PECs foram votadas de maneira relâmpago, com os dois turnos realizados num mesmo dia, após a convocação de seis sessões, uma atrás da outra, e apreciação somente por uma comissão especial.

A POLÊMICA DA ELEIÇÃO ANTECIPADA

Dois dias depois da aprovação das PECs, um novo fato político surpreendeu boa parte do Parlamento, o governo e os capixabas: Erick Musso realizou a eleição para a Mesa Diretora nos últimos dias de novembro, 14 meses antes do que seria anteriormente, e se reelegeu para a presidência. Esta votação rompeu um acordo feito com o governo, de que a eleição seria ao longo de 2020, e gerou críticas de diversas organizações da sociedade civil. A Assembleia foi alvo de ações judiciais para suspender tais manobras. Por fim, a chapa eleita renunciou, e a Justiça decidiu que a emenda constitucional que permite a eleição antecipada está suspensa.

Deputados realizaram eleição surpresa para a Mesa Diretora de 2021/2023 no mês de novembro. (Tati Beling)

A última semana de trabalhos legislativos teve sinal de pacificação entre Assembleia e governo. Projetos de interesse do Executivo, como a lei orçamentária do próximo ano, o plano plurianual e as regras de transição da reforma da Previdência foram votados em ritmo célere e sem grandes dificuldades. Agora, os trabalhos retornam somente em 1º de fevereiro, para um ano que também não deve ser calmo, já que haverá eleições municipais e mais da metade dos parlamentares está de olho em vagas nas prefeituras.

ANÁLISE: ACORDO DE CÚPULA

O cientista político Fernando Pignaton avalia que a condução dos trabalhos na Assembleia ao longo do ano de 2019 demonstrou a existência de um acordo de cúpula entre o governo e a direção da Assembleia, mas que por trás ainda há uma relação altamente instável. "Foram feitas concessões incoerentes tanto por um lado quanto por outro. O governo, por exemplo, aprovou projetos para a área de saúde, cujo perfil é estatizante. Já para a Previdência, o formato é liberal. E isso não passou por um debate na Assembleia. A Casa, por sua vez, ao perceber que poderia ter mais protagonismo, fez aquela eleição extemporânea, desconsiderando outros atores", analisou.

Para o analista, em 2020, esse formato de exercer a política tende a continuar. "Acredito que a Assembleia vai continuar fazendo o jogo de poder de cúpula e de costas para o desafio de melhorar a qualidade de representação. É difícil que se torne o centro dos debates do Espírito Santo. Tanto governo quanto a cúpula do Legislativo não poderão perder de vista essa base que o Erick conseguiu para a eleição antecipada", afirmou.

OS DESTAQUES DO ANO DE 2019 NA ASSEMBLEIA DO ES

  • 01

    Trabalhos antecipados

    Os deputados da legislatura anterior foram convocados no mês de janeiro para votar um novo Orçamento de 2019 para o Estado e a anistia administrativa para os policiais militares punidos após a greve de 2017.

  • 02

    Vaga no Tribunal de Contas

    A Assembleia escolheu um aliado de Casagrande, Luiz Carlos Cicilioti, para a vaga de conselheiro do Tribunal de Contas. Marcelo Santos desistiu de concorrer à vaga. Se ele fosse o indicado, daria lugar na suplência à Luiz Durão, então investigado por estupro.

  • 03

    Mais poderes para o presidente

    Ao longo dos meses, o presidente Erick Musso aprovou projetos que concentraram o poder decisório nas mãos da presidência, esvaziando a competência dos outros membros da Mesa Diretora.

  • 04

    Assessores externos

    Após uma cobrança por mais transparência e fiscalização nas atividades dos servidores de gabinete que fazem serviços externos e não batem ponto, a Assembleia acabou com a obrigatoriedade da apresentação de relatórios de atividades por eles.

  • 05

    Projetos do governo

    Nos projetos enviados para votação, o governo do Estado não sofreu nenhuma derrota expressiva. As propostas foram votadas, em sua maioria, em regime de urgência, enfrentando poucos entraves e com aprovação folgada. Entre eles, a reestruturação da PM, projetos da área de saúde e a criação do Fundo Soberano.

  • 06

    Eleição antecipada

    O presidente Erick Musso liderou a aprovação de uma PEC para permitir que a eleição da Mesa Diretora pudesse ser em qualquer data definida por ele e se reelegeu 400 dias antes do previsto. Depois, alvo de pressões do governo e da sociedade, a chapa renunciou. A emenda constitucional também está suspensa por decisão judicial.

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