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Assembleia do ES não tem disputa pela presidência há 18 anos

Assembleia do ES não tem disputa pela presidência há 18 anos

Desde 2003, quando houve a última eleição em que duas chapas disputaram a presidência, em uma sessão turbulenta, escolha é feita com apenas um candidato ao posto e com apoio do governador da ocasião

Publicado em 31 de janeiro de 2021 às 04:00- Atualizado há 3 anos

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Eleição da Assembleia em 2003: oficial tenta entregar ao então presidente, Giovani Silva, liminar que anularia a eleição
Oficial de Justiça entrega liminar ao então deputado Geovani Silva (segundo da esquerda para direita) ao final da sessão turbulenta que o elegeu presidente em 2003. (Reprodução/TV Gazeta)
Rafael Silva
Repórter de Política / [email protected]

Os deputados estaduais vão escolher, nesta segunda-feira (1º), o novo presidente da Assembleia Legislativa do Espírito Santo pelos próximos dois anos. O nome anunciado a partir dos votos dos parlamentares não será surpresa. O atual presidente da Casa, Erick Musso (Republicanos), é candidato à reeleição na única chapa inscrita para comandar a Mesa Diretora e já tem o apoio de ao menos 26 dos 30 colegas de plenário. A ausência de disputa para a presidência do Legislativo estadual não é novidade de 2021: há 18 anos não há confronto para se alcançar o posto. 

A última vez que houve duas chapas de candidatos ao cargo foi em 2003. Em fevereiro daquele ano, o ex-jogador de futebol e então deputado estadual Geovani Silva (na época no PTB) enfrentou o também deputado Cláudio Vereza (PT) pela presidência da Assembleia. Geovani, que na ocasião era apoiado pelo presidente anterior da Casa, José Carlos Gratz (então no PFL), venceu a eleição por 19 votos a 11. O recém-empossado governador Paulo Hartung (na época no PSB, hoje sem partido) apoiou Vereza.

Geovani ganhou, mas a vitória durou poucos dias. O último pleito com disputa na Assembleia ficou marcado por uma sessão conturbada, com direito até a agressões e intervenção da Polícia Militar. No dia da votação, também tomariam posse os deputados estaduais eleitos. Cinco deles, no entanto, foram impedidos pela Justiça, em decisão liminar (provisória), de assumir os cargos. Eram eles Sérgio Borges (PMDB), José Tasso de Andrade (PTC), Gilson Gomes (PFL), Gilson Amaro (PPB), Marcos Gazzani (PGT), Fátima Couzi (sem partido) e Luiz Carlos Moreira (PMDB) – os partidos se referem ao período citado.

Contudo, a oficial de Justiça que entregaria a liminar ao presidente da sessão foi impedido de entrar no plenário. Houve bate-boca entre a oficial, promotores de Justiça que o acompanhavam e a segurança da Casa. Os promotores acusaram os seguranças de terem os agredido. Dois dias depois, a eleição foi anulada e um inquérito policial foi aberto para apurar a confusão. Uma nova eleição foi organizada, dessa vez com chapa única, em que Vereza foi eleito.

"Daí em diante, todas as outras eleições foram em chapa única. Os deputados passaram a discutir com antecedência, e a fazer acordos para a divisão das comissões, e o Poder Executivo passou a fazer uma influência muito forte", recorda Vereza, o último parlamentar a enfrentar um adversário em uma eleição de Mesa Diretora.

O episódio do pleito interno de 2003, somado à instabilidade política vivida durante a Era Gratz, contribuiu para que os dois governadores que se elegeram desde então – Paulo Hartung e Renato Casagrande (PSB) – conferissem maior importância para a disputa entre os deputados, buscando uma conciliação entre os parlamentares, de acordo com o cientista político Antônio Carlos de Medeiros.

O fato de não haver confronto na eleição da Mesa Diretora, para o cientista político, não é um problema, tampouco pode ser considerado algo "positivo" para a Assembleia do Espírito Santo. Medeiros avalia que, com a influência ou não do Executivo, a Casa precisa garantir o equilíbrio, a harmonia e a independência entre os Poderes.

"Esse trauma vivido em 2003 é uma consequência de anos em que o Legislativo capixaba viveu uma hipertrofia. Com o governo estadual desgastado, durante os anos 1990, com Vitor Buaiz e José Ignácio Ferreira, o Legislativo passou a ter uma força muito grande, primeiro com a chamada 'Tropa de Choque', grupo encabeçado por Valci Ferreira e Marcos Madureira (hoje no Patriota), e depois com a Era Gratz. As votações que o governo precisava não aconteciam e quem saía perdendo era a população. A partir de 2003, houve um reequilíbrio entre Legislativo e Executivo", afirma o cientista político.

A "Tropa de Choque" teve início na Assembleia em 1991, durante o governo Albuíno Azeredo (PDT). Na eleição da Mesa Diretora, realizada há 30 anos, foi registrada a última derrota de um candidato do governador para o comando do Legislativo. Valci Ferreira (PTB) venceu Ruzerte Geigher (PDT), que era o parlamentar apoiado por Albuíno.

De 1997 a 2003, as três eleições para a Mesa Diretora da Casa também foram disputadas. Em todas, Gratz saiu vencedor. Em 1997, quem tentou vencê-lo foi o então deputado estadual Lelo Coimbra (na época no PPS, hoje no MDB). Já em 1999 e em 2001, Vereza concorreu como candidato avulso, que se opôs ao grupo formado pelo presidente daquele período. 

Depois de 2003, na eleição seguinte à que Vereza saiu vitorioso, em 2005, não houve chapa contrária. No entanto, nove deputados, incluindo o petista, votaram contrários à candidatura do então deputado estadual César Colnago (PSDB). A oposição não foi suficiente para a derrota do tucano, que contava com o apoio de Paulo Hartung e ficou no cargo até 2007. 

Daí em diante, o "consenso" prevaleceu na Assembleia, sempre com a influência do governador da ocasião. Do mesmo partido de Hartung na época, Guerino Zanon (PMDB) encabeçou a chapa única e foi escolhido para comandar a Casa em 2007.

Eleito para ser prefeito de Linhares a partir de 2009, Guerino deixou o cargo na Assembleia, que foi assumido por um mês por Luiza Toledo (na época no PTB, hoje no MDB), então 1ª vice-presidente da Casa. Na sequência, outro governista foi o eleito para estar na presidência do Legislativo, Elcio Alvares (DEM), que ficou no posto de 2009 a 2011.

Em 2011, já no governo Renato Casagrande, ainda aliado de Hartung, o deputado Rodrigo Chamoun – na época no PSB, partido do governador – foi o escolhido para liderar a Mesa Diretora. Com a abertura de uma vaga no Tribunal de Contas do Estado (TCES), em 2012, Chamoun teve o nome aprovado pelos parlamentares para ser conselheiro e renunciou ao cargo de presidente da Assembleia. 

Com a benção do Palácio Anchieta, Theodorico Ferraço (DEM) foi eleito, em 2012, para presidir o Poder Legislativo. O parlamentar terminou o mandato e se reelegeu duas vezes, em 2013 e 2015.

Em 2017, numa articulação chancelada pelo então governador Hartung, Erick Musso foi escolhido para comandar a Assembleia por dois anos. Com a mudança de governo e de legislatura, também com apoio do governador Casagrande, em 2019, o parlamentar foi reeleito para o cargo.

"Dali (2003) para frente, quando o governo não era cabeça, era pescoço. Sempre havia conciliação. Fui eleito em 2013, com o apoio de Casagrande, e em 2015, apoiado por Hartung. Em 2017, eu e o governador (Hartung) rompemos, e decidi que devia ceder o meu lugar. Foi quando surgiu o Erick, que tem feito um bom trabalho", relembra o deputado estadual e antecessor de Erick na presidência da Casa, Theodorico Ferraço.

Agora, Erick Musso disputa novamente a reeleição em uma chapa única, com a anuência do Palácio Anchieta. O governo até tentou emplacar um único candidato, porém mais alinhado a Casagrande. As investidas não prosperaram. Em contrapartida, o governador deve ter aliados em postos estratégicos na Mesa Diretora e a Assembleia deve revogar uma resolução que confere "superpoderes" ao presidente da Casa.  

RELEMBRE A CONFUSÃO NA ELEIÇÃO DE 2003

Em 2003, a expectativa do governo Hartung era que Vereza fosse eleito presidente da Assembleia Legislativa, já que a maioria dos deputados estaduais tinha feito o compromisso de votar no parlamentar. No entanto, uma semana antes do pleito interno, um grupo de deputados passou seis dias em um hotel de luxo, em Domingos Martins.

O chamado "Grupo dos 20" adotou o sumiço como estratégia para se resguardar de pressões às vésperas da eleição. O objetivo era evitar que parlamentares comprometidos a votar em Geovani fossem assediados pelo Palácio e mudassem de lado. Uma investigação da Polícia Civil descobriu, dias depois, que as despesas do "isolamento" foram pagas por uma empresa ligada a José Carlos Gratz.

No dia do pleito, havia manifestantes nas galerias e na escadaria da Assembleia, que protestavam contra o ex-presidente da Casa e defendiam o voto aberto – naquela época a votação era secreta e em urnas com cédulas de papel. Dentro do plenário, a confusão estava armada. Uma oficial de Justiça foi impedida de entrar no local para barrar a posse de cinco parlamentares, que participaram da eleição e votaram a favor do ex-jogador de futebol. 

Surpreendentemente, pelo número de votos favoráveis a Geovani, até parlamentares que estavam na chapa de Vereza escolheram o adversário. Geovani saiu do plenário escoltado por seguranças da Assembleia Legislativa.

O Ministério Público do Espírito Santo (MPES) acionou a Justiça argumentando que a eleição deveria ser cancelada, já que a liminar que afastaria os cinco parlamentares, por denúncias de que teriam recebido recursos ilícitos no mandato anterior, não foi cumprida. O então desembargador Amim Abiguenem, do Tribunal de Justiça do Espírito Santo (TJES), anulou o pleito e ordenou a abertura de um inquérito policial. Havia suspeita de compra de votos na época, mas o caso foi arquivado.

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