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Publicado em 5 de setembro de 2022 às 14:43
Uma decisão da 7ª Vara do Trabalho de Vitória reconheceu o vínculo empregatício entre um motorista e a Uber do Brasil. A decisão foi da juíza Anna Beatriz Matias Diniz de Castilhos Costa.>
No entendimento da magistrada, existe uma relação de trabalho intermitente, previsto no artigo 452-A da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT). Com a decisão, a empresa foi condenada a pagar os direitos trabalhistas ao motorista, como aviso prévio indenizado, férias proporcionais, proporcional do 13° salário, FGTS e multa de rescisão de 40% do valor do fundo.>
A modalidade de trabalho intermitente foi regulamentada na reforma trabalhista em 2017, com o objetivo de dar mais flexibilidade tanto para empregadores quanto para empregados. Com ela, o profissional trabalha de forma esporádica e não contínua. >
Para as empresas, a maior vantagem é poder contar com o profissional somente quando é necessário e pagá-lo de acordo com as horas trabalhadas. Já para os trabalhadores, a modalidade funciona como uma espécie de “bico” formalizado, com os direitos trabalhistas garantidos pela lei 13.467/2017, incluída na CLT nos artigos 443 e 452-A. Os trabalhadores, inclusive, podem prestar serviços a outras empresas. >
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No processo, o motorista alegou ter trabalhado para a Uber do Brasil entre dezembro de 2020 e outubro de 2021, fazendo as corridas de acordo com as demandas fornecidas pela empresa, através do aplicativo. Para a defesa, a situação se encaixa na definição de trabalho intermitente. Ele relatou não ter outro emprego e que foi bloqueado pelo aplicativo. Depois disso, não teve acesso a nenhum direito trabalhista.>
Esse também foi o entendimento da juíza do trabalho. Na decisão, Anna Beatriz destacou aspectos de como se dá a relação da Uber com os motoristas. De acordo com ela, se a prestação de serviço é determinada, ordenada, controlada e fiscalizada pelo contratante, há poder empregatício e hierárquico e, assim, “afloram as figuras empregado x empregador”.>
Já a Uber do Brasil diz, na ação, que faz apenas a “prestação de serviços de intermediação digital pela Uber ao motorista autônomo''. A empresa diz que tem o papel de fornecer o serviço de tecnologia, para que interessados em prestar o serviço de transporte atendam às solicitações dos usuários da plataforma. O motorista, por sua vez, paga à Uber uma taxa de serviço de cerca de 25% do valor da corrida. >
Em nota, a Uber disse que vai recorrer da decisão que, segundo a empresa, representa um entendimento isolado e contrário ao de outros processos já julgados no próprio Tribunal e no Tribunal Superior do Trabalho (TST).>
A Uber também cita outras decisões que foram favoráveis à empresa que, de acordo com a nota, atestam a inexistência do vínculo do empregado com os motoristas. “Além de não existir subordinação jurídica de motoristas parceiros com a Uber, também não se aplicam outros requisitos legais da modalidade de trabalho intermitente, como a definição prévia de jornada e a multa por desistência”, diz a nota.>
O posicionamento da empresa continua dizendo que “de acordo com a lei, nesta modalidade, o empregador deve convocar o funcionário e informar a jornada de trabalho a ser cumprida com pelo menos três dias de antecedência, e pode aplicar multa em caso de descumprimento, condições que são totalmente incompatíveis com o sistema de intermediação dinâmico e flexível operado pela Uber: são os próprios motoristas parceiros que decidem quando ligar o aplicativo, sem nenhum tipo de aviso anterior, podem permanecer conectados pelo tempo que quiserem, e com total autonomia para atender, recusar ou cancelar as solicitações de viagem feitas pelos usuários do aplicativo em tempo real”.>
A nota da Uber pode ser lida na íntegra, abaixo:>
A Uber esclarece que vai recorrer da decisão proferida pela 7ª Vara do Trabalho de Vitória, que representa um entendimento isolado e contrário ao de outros processos já julgados no próprio Tribunal e no TST (Tribunal Superior do Trabalho).>
Em decisão de dezembro de 2021, por exemplo, a 5ª Vara do Trabalho de Vitória identificou 12 "fatos incontroversos" que atestam a inexistência do vínculo de emprego entre motoristas e a Uber, pois "são suficientes para afastar toda e qualquer subordinação, ainda que por programação ou algorítmica, uma vez que restou clara a autonomia do motorista para o desenvolvimento de suas atividades". >
Além de não existir subordinação jurídica de motoristas parceiros com a Uber, também não se aplicam outros requisitos legais da modalidade de trabalho intermitente, como a definição prévia de jornada e a multa por desistência. >
De acordo com a lei, nesta modalidade o empregador deve convocar o funcionário e informar a jornada de trabalho a ser cumprida com pelo menos três dias de antecedência, e pode aplicar multa em caso de descumprimento, condições que são totalmente incompatíveis com o sistema de intermediação dinâmico e flexível operado pela Uber: são os próprios motoristas parceiros que decidem quando ligar o aplicativo, sem nenhum tipo de aviso anterior, podem permanecer conectados pelo tempo que quiserem, e com total autonomia para atender, recusar ou cancelar as solicitações de viagem feitas pelos usuários do aplicativo em tempo real.>
Jurisprudência>
Nos últimos anos, as diversas instâncias da Justiça brasileira formaram jurisprudência consistente sobre a relação entre a Uber e os parceiros, apontando a ausência dos requisitos legais para existência de qualquer tipo de vínculo empregatício (onerosidade, habitualidade, pessoalidade e subordinação). Em todo o país, já são mais de 2.700 decisões de Tribunais Regionais e Varas do Trabalho reconhecendo não haver relação de emprego com a plataforma.>
Os motoristas parceiros não são empregados e nem prestam serviço à Uber: eles são profissionais independentes que contratam a tecnologia de intermediação digital oferecida pela empresa por meio do aplicativo. Os motoristas escolhem livremente os dias e horários de uso do aplicativo, se aceitam ou não viagens e, mesmo depois disso, ainda existe a possibilidade de cancelamento. Não existem metas a serem cumpridas, não se exige número mínimo de viagens, não existe chefe para supervisionar o serviço, não há obrigação de exclusividade na contratação da empresa e não existe determinação de cumprimento de jornada mínima. >
O TST já reconheceu, em seis julgamentos, que não existe vínculo de emprego entre a Uber e os parceiros. Um dos mais recentes, em novembro de 2021, a 4ª Turma afastou o vínculo sob o entendimento de que motoristas trabalham "sem habitualidade e de forma autônoma" e que não existe "subordinação jurídica entre o aplicativo e o trabalhador". Em maio, a 5ª Turma já havia afastado a hipótese de subordinação porque era de escolha do motorista "ligar e desligar o aplicativo na hora que bem quisesse" e "se colocar à disposição, ao mesmo tempo, para quantos aplicativos de viagem desejasse". >
Outro julgamento de 2021, em março, decidiu que o uso do aplicativo não configura vínculo pois existe "autonomia ampla" do parceiro para escolher "dia, horário e forma de trabalhar, podendo desligar o aplicativo a qualquer momento e pelo tempo que entender necessário, sem nenhuma vinculação a metas determinadas pela Uber". >
Esse entendimento vem sendo adotado pelo TST desde 2020, com decisões em fevereiro e em setembro. Também o STJ (Superior Tribunal de Justiça), desde 2019, vem decidindo que os motoristas "não mantêm relação hierárquica com a empresa porque seus serviços são prestados de forma eventual, sem horários pré-estabelecidos, e não recebem salário fixo, o que descaracteriza o vínculo empregatício" - a decisão mais recente neste sentido foi publicada em setembro de 2021.>
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