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Por que defender o Nazismo é crime? Saiba o limite da liberdade de expressão

Por que defender o Nazismo é crime? Saiba o limite da liberdade de expressão

Lei de 1989 sobre racismo tem punição específica para uso de símbolos ligados ao nazismo. STF já definiu que liberdade de expressão não abarca apologias ao regime de Adolf Hitler

Publicado em 12 de fevereiro de 2022 às 13:00

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Monark fez defesa de um partido nazista no Brasil reconhecido em lei
Bruno Aiub, mais conhecido como Monark fez defesa de um partido nazista no Brasil reconhecido em lei. (Reprodução)
Vinícius Brandão
Estagiário / [email protected]

Na ultima semana voltou à tona a discussão sobre os limites da liberdade de expressão e do por que o Nazismo é crime.  As declarações pró-nazismo do influencer Monark no podcast Flow e, poucos dias depois, o ato do comentarista da Jovem Pan Adrilles Jorge fazer uma suposta saudação nazista provocaram dúvidas sobre como essas manifestações são enquadradas na lei brasileira.

Mas afinal, nossa legislação permite que uma pessoa se declare como antijudeu? Ou que defenda a existência de um partido nazista? Ou mesmo uma manifestação negando a existência do Holocausto? A Gazeta foi atrás dessas respostas.

De acordo com a advogada criminalista Ana Maria Bernardes, é preciso que se estabeleça os limites entre aquilo que configura mera discussão e contextualização de ideias daqueles comentários que podem indicar, em tese, a prática de crimes.

Nesse sentido, se deve observar se eventuais comentários proferidos são capazes de incitar, ou não, a discriminação étnica e religiosa.

Lei 7.716 de 1989

Artigo 20 - Define os crimes resultantes de preconceito, raça ou cor, dentre eles o de incitar a discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional (pena de reclusão de um a três anos e multa).

A advogada explica que esses atos estão inseridos dentro da categoria chamada de crimes de ódio, entre os quais se insere também o feminicídio e todos os crimes que se direcionam não a características próprias do indivíduo, mas sim a características de um determinado grupo.

Ana Maria Bernardes pontua que, considerando o que a história mostra sobre as ideologias nazistas e a crença em uma raça superior formada exclusivamente pelos arianos - ideias essas que apontam para a necessidade de exclusão de outros grupos da sociedade -, a apologia a alguns aspectos do nazismo pode sim configurar a prática do crime descrito no artigo 20 da Lei 7.716.

Ana Maria Bernardes - Advogada criminalista
Ana Maria Bernardes - Advogada criminalista. (Divulgação/Acervo pessoal)

A lei ainda prevê ser crime no Brasil fabricar, comercializar, distribuir ou veicular símbolos, emblemas, ornamentos, distintivos ou propagandas que utilizem a cruz suástica ou gamada, para fins de divulgação do nazismo, sob pena de dois a cinco anos de prisão e multa.

No mesmo programa que Monark afirmou ser a favor da existência de um partida Nazista no Brasil e que antijudeus podem se manifestar dessa forma, o deputado federal Kim Kataguiri (DEM-SP) disse concordar com o influencer e que considera um erro a Alemanha ter criminalizado o nazismo.

"O que eu defendo, que acredito que o Monark também defenda, é que por mais absurdo, idiota, antidemocrático, bizarro, tosco que o sujeito defenda, isso não deve ser crime. Porque a melhor maneira de você reprimir uma ideia é (…) você dando luz naquela ideia, para ela seja rechaçada socialmente e então socialmente rejeitada", afirmou o deputado.

LIBERDADE DE EXPRESSÃO?

Segundo o historiador, professor da Universidade Vila Velha (UVV) e membro da Transparência Capixaba, Rafael Simões, apesar da liberdade de expressão ser um direito fundamental, ela não é absoluta e é limitada pela própria legislação brasileira. ​

Entre os motivos de restrição estão situações que incluem condutas que promovem a discriminação de certos grupos ou segmentos da população.

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O nazismo é crime porque é um regime de morte, que propõe abertamente a destruição de grupos de pessoas, que são conhecidos. Por isso que a propagação dele foi colocado na ilegalidade

Rafael Simões
Historiador, professor da UVV e membro da Transparência Capixaba
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Como política de Estado, essa ideologia foi posta em prática por Adolf Hitler na Alemanha nas décadas de 1930 e 1940. Foi nesse período que foi promovido um genocídio de judeus em campos de extermínio, conhecido como Holocausto, que também incluiu negros, homossexuais, ciganos e pessoas com deficiência física ou mental.

Rafael Simões completa que dentro do contexto do Estado Democrático de Direito, que é baseado em direitos civis, direitos políticos e direitos sociais, parte-se do pressuposto de que todo indivíduo tem direito à vida, e esse direito à vida deve ser resguardado pelo Estado.

Logo, não é concebível um modelo de partido ou de qualquer outro tipo de organização política que defenda o genocídio de povos.

O que pode caracterizar discriminação e os limites da liberdade de expressão no Brasil

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    Não há uma definição na legislação brasileira, mas existem diferentes leis - nacionais e internacionais - que envolvem a criminalização de condutas como a discriminação a determinados grupos e segmentos da população por questões raciais, sociais, étnicas e religiosas.

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    Prevê a promoção do "bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação" como um dos objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil. A Carta também diz que a lei punirá qualquer discriminação atentatória dos direitos e liberdades fundamentais e que o racismo é crime inafiançável e imprescritível, sujeito à pena de reclusão.

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    O artigo 20 da Lei 7.716, de 1989, diz que é crime "praticar, induzir ou incitar a discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional". A pena é de reclusão de um a três anos e multa, que aumenta para dois a cinco anos quando praticado por intermédio de meios de comunicação ou publicações. No Judiciário, há o entendimento de que só se aplicaria o crime de racismo em caso de a conduta atingir uma coletividade, deste modo, casos de racismo que sejam entendidos como dirigidos a uma pessoa específica acabam sendo enquadrados como crime de injúria racial. Tal diferenciação é criticada por especialistas no tema, que entendem que injúria racial é racismo. No ano passado, o STF decidiu que a injúria racial é equiparada ao crime de racismo e, portanto, imprescritível.

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    Condutas de defesa do nazismo podem ser enquadradas como incitação ou indução ao preconceito conforme previsto no art. 20 da lei 7.716/89. Para o Instituto Brasileiro de Ciências Criminais (IBCCRIM), a fala de Monark pode vir a ser tipificada dessa maneira. "A defesa da criação de um partido político voltado à discriminação e extermínio de pessoas pode vir a caracterizar, em tese, a incitação a essa prática. No caso discutido, ainda poderia se aplicar a causa de aumento de pena do §2º, já que a declaração se deu por intermédio dos meios de comunicação", disse o instituto. Há um trecho da lei que cita especificamente o nazismo, com pena de reclusão de dois a cinco anos, além de multa. Ele tem aplicação restrita, contudo, a casos que envolvam a utilização da "cruz suástica ou gamada".

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    Embora não haja na legislação brasileira a criminalização da homofobia e da transfobia, ela é possível pela decisão do STF, que equiparou ambas as condutas ao crime de racismo até que o Congresso Nacional aprove uma legislação sobre o tema.

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    O caso Ellwanger é citado como emblemático na discussão sobre o tema. Em 2003, o STF condenou o proprietário da Editora Revisão, Siegfried Ellwanger, a dois anos de reclusão por crime de incitação ao racismo por obras em que questionava a existência do Holocausto. O entendimento dos ministros foi de que "escrever, editar, divulgar e comerciar livros fazendo apologia de ideias preconceituosas e discriminatórias contra a comunidade judaica constitui crime de racismo''.

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