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Pesquisa da Ufes e UFV mostra que hidroxicloroquina afeta o DNA

Pesquisa da Ufes e UFV mostra que hidroxicloroquina afeta o DNA

Estudo aponta que a interação do medicamento com o DNA é semelhante a ocorrida com fármacos utilizados em tratamentos contra o câncer

Publicado em 25 de novembro de 2020 às 12:31

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Hidroxicloroquina interage e afeta o DNA
Hidroxicloroquina interage e afeta o DNA, aponta pesquisa. (Divulgação/Raniella Bazoni )

Uma nova pesquisa realizada sobre a hidroxicloroquina evidencia que é necessário ter ainda mais cuidado com o uso do medicamento. O estudo realizado na Universidade Federal de Viçosa (UFV), em parceria com uma professora da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes), mostra que existe uma importante interação entre a droga e as moléculas que carregam nossos códigos genéticos, a molécula de DNA ou ácido desoxirribunucleico. 

O trabalho realizado na universidade mineira tem participação da professora capixaba Raniella Falchetto Bazoni, ex-aluna do Programa de Pós-Doutorado em Física da UFV, junto com Tiago de Assis Moura, que atualmente é doutorando no programa, e o professor Márcio Santos Rocha, do Departamento de Física da universidade em Viçosa.

O estudo não tem por objetivo mostrar os efeitos colaterais provocados pelo uso da hidroxicloroquina, mas apresenta uma importante constatação: a de que o medicamento tem a capacidade de interagir com o DNA humano. O que eleva as preocupações sobre o consumo do remédio, tanto feito por conta própria, como realizado com prescrição médica.

"Existem vários estudos da utilização do fármaco em tratamentos de doenças, mas o seu mecanismo de ação molecular no tratamento das mesmas ainda é desconhecido. Além disso, os resultados existentes são muitas vezes contraditórios. A cloroquina é muito semelhante a hidroxicloroquina e já foi muito estudada cientificamente. Alguns trabalhos da cloroquina indicaram que a eficácia dela no tratamento da malária poderia estar relacionada com a sua interação com o DNA. De forma semelhante, isso pode acontecer com a hidroxicloroquina também. Logo, um estudo sobre essa interação hidroxicloroquina e DNA deve ser realizado detalhadamente e o mais rápido possível", conta Márcio.

A cloroquina e a hidroxicloroquina são originários de uma mesma classe de fármacos, sendo muito semelhantes. A diferença é que a hidroxicloroquina possui um grupo (OH), uma hidroxila, a mais em uma das extremidades. Com isso,  se torna um derivado menos tóxico da cloroquina, com menos efeitos colaterais, e considerada um pouco mais segura.

Após a conclusão, o estudo foi publicado em um dos periódicos científicos mais importantes da área, o The Journal of Physical Chemistry Letters. A pesquisa é importante pois acende alerta para os riscos da hidroxicloroquina à saúde humana. Em meio à pandemia da Covid-19, a discussão sobre o uso do medicamento foi politizada. Sem comprovação científica de que pudesse ser utilizada para a cura do vírus, diversos políticos, inclusive capixabas, trataram a cloroquina como uma solução imediata, alegando que o uso do medicamento poderia levar à cura da doença. "É urgente o melhor entendimento da droga, possibilitando seu manejo com a maior segurança possível para o paciente", salienta Raniella.

COMO FUNCIONA A INTERAÇÃO DA HIDROXICLOROQUINA COM O DNA?

Segundo a professora Raniella, a interação do medicamento pode ocorrer de duas formas: quando usado em baixa concentração, a droga se acomoda em uma das fendas da molécula de DNA, na fenda menor para ser mais exata. As fendas podem ser consideradas como as partes mais acessíveis do DNA, sendo usualmente alvo de moléculas que apresentam cargas elétricas positivas.

Quando o medicamento é usado em alta concentração, a molécula da hidroxicloroquina se encaixa entre os pares de base, no meio da fita, aumentando a distância desses pares e causando uma distorção. Esse tipo de interação pode atrapalhar o processo de formação de outra molécula de DNA que levaria a criação de uma nova célula.

INTERAÇÃO COM O DNA É SEMELHANTE A DOS REMÉDIOS USADOS NA QUIMIOTERAPIA

O estudo se centra nas interações com o DNA e não detalha quais são os efeitos colaterais provocados por essa ligação com a hidroxicloroquina. Pesquisas globais, no entanto, mostram que esse o tipo de interação que ocorre entre a hidroxicloroquina e o DNA é muito semelhante à interação ocorrida quando o corpo está diante de drogas que interagem muito, como as do tratamento contra o câncer. Algumas drogas usadas na quimioterapia têm por objetivo diminuir a mitose, continuação da divisão e criação das células cancerosas.

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Notamos que a afinidade entre o fármaco e o DNA é alta, compatível com alguns fármacos quimioterápicos. Essa interação forte é muito preocupante

Márcio Rocha
Professor doutor no Departamento de Física da Universidade Federal de Viçosa (UFV)
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CAUTELA NO CONSUMO DA HIDROXICLOROQUINA 

Esse é um estudo pioneiro da interação entre a droga hidroxicloroquina e a molécula de DNA, sendo que com seu nível de detalhes não existem outros na literatura. Alguns estudos anteriores a este já sinalizavam que o uso do medicamento pode gerar consequências graves ao organismo. Com essa nova pesquisa, acende-se ainda mais o alerta, já que essas alterações no DNA também podem trazer consequências à saúde humana.

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Drogas que interagem com o DNA precisam de um alerta maior para se utilizar e medicar. Qualquer droga tem que ser tomada com cautela, mas essas que mexem no DNA tem que ser tomadas de forma muito mais cautelosa

Raniella Bazoni
Profaessora doutora no Ceunes - Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes)
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MELHORIAS NO PRÓPRIO MEDICAMENTO

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Com essa descoberta da interação do medicamento com o DNA, a pesquisa pode posteriormente servir de apontamento para melhorias na própria hidroxicloroquina. Foi através de um estudo sobre a relação da cloroquina com a malária, que descobriu-se que a cura da doença pode estar atrelada a essa ligação do medicamento com o DNA. “Com a descoberta da nossa pesquisa, talvez seja possível encontrar alguma droga até mais efetiva que a hidroxicloroquina. Talvez uma alteração possa ser feita para melhorar a interação dela com o DNA. Conhecer essas interações é importante porque você pode ajudar a melhorar a atuação delas”, conta Raniella.

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