Publicado em 13 de maio de 2020 às 19:24
O medo de não conseguir salvar o paciente. Esta é uma das muitas preocupações de Karina Veiga, 32, cuja especialidade tem ajudado a resgatar a capacidade respiratória de dezenas de pessoas. Ela é fisioterapeuta intensivista, uma especialidade que nesta pandemia do novo coronavírus, tem ajudado os que foram infectados pelo vírus a recuperar o direito de respirar. >
Com a experiência de 10 anos na profissão, ela relata que embora no ambiente hospitalar também ocorram mortes, a meta dos profissionais da saúde é sempre salvar vidas. Mas estamos vivendo um momento diferente, com preocupações de nos contaminarmos, mas principalmente de não conseguirmos salvar o paciente. A tensão tem sido muito grande, relata Karina.>
Trabalhando nos plantões da UTI do Hospital Jayme Santos Neves, ela é uma das cerca de 60 profissionais da fisioterapia no local, que é referência no tratamento da Covid-19. E com o aumento do número de novos leitos, tem também registrado um crescimento de pacientes graves. A cada dia este número é maior. E a sensação é de que os plantões estão mais pesados. >
LUTA DIÁRIA PELA VIDA>
>
Uma luta pela vida que impacta os profissionais. Ela recorda de um paciente com pouco mais de 50 anos, sem nenhuma comorbidade (outras doenças que poderiam agravar o quadro). Era uma pessoa nova, com boa saúde, que tínhamos esperança de que superaria a doença de forma rápida, mas ocorreu exatamente o contrário. A gente cria expectativas , relata, emocionada.>
Em duas paradas cardíacas anteriores o paciente havia sido resgatado, mas não suportou a terceira. Eu estava lá, com outros profissionais, e ele não voltou. É muito difícil perder um paciente de forma tão rápida, sem conseguir fazer tudo o que gostaríamos para salvá-lo, conta Karina.>
Já tendo atuado em UTIs de vários hospitais, Karina destaca que a situação, com a Covid-19, tem sido diferente. O número de pacientes graves é maior e alguns evoluem para óbito com muita rapidez. Isto nos desestrutura emocionalmente, mas às vezes a correria é tão grande que temos que seguir para o próximo paciente, relata. >
Segundo Karina, a fisioterapia é fundamental no tratamento da Covid-19, sendo aplicada muito antes do paciente chegar a precisar de um respirador. "Só o remédio não faz milagre", destaca.>
A atuação do fisioterapeuta intensivista vai de avaliação clínica, avaliação de exames, realização da titulação (quantidade) de oxigênio que o paciente deve receber, até técnicas e aplicação de manobras torácicas com o intuito de expandir e aumentar a capacidade pulmonar do paciente. >
Explica que é função do fisioterapeuta avaliar o sistema respiratório para identificar, principalmente, a repercussão nas trocas gasosas, que é a principal função do sistema respiratório. Um monitoramento para identificar o momento em que o paciente pode vir a precisar de ajuda de equipamentos para respirar. Ela explica que nos casos de Covid-19, a piora do quadro do paciente pode ocorrer em um curto intervalo de tempo.>
São ainda os fisioterapeutas que auxiliam os médicos no momento da intubação e que controlam os ventiladores mecânicos, os respiradores, ajustando e adequando o equipamento ao paciente, de forma que o tratamento posso auxiliá-lo a vencer a doença. >
Regulamos os parâmetros do respirador e o adaptamos ao paciente. O equipamento passa a ser o pulmão do paciente. O respirador oferta mais oxigênio, faz pressão para respirar, faz com que ocorram as trocas gasosas, para suprir as necessidades do paciente, explica. >
A medida que o paciente vai se recuperando, ele começa a usar menos o respirador. A gente começa então a preparar a extubação (retirada do tubo). Quando o paciente fica sedado, ele tem uma grande perda de força muscular. E quando ele ainda está na ventilação mecânica, conseguimos treiná-lo, com as próprias pressões do respirador. É um treinamento de força, relata.>
Quando sai do respirador, começa outra etapa para o paciente. É a fase da reabilitação, quando vai aprender a respirar da forma correta. São vários exercícios para que ele possa voltar a respirar com a capacidade pulmonar anterior, explica Karina.>
Há ainda os casos de pessoas que nem chegam a usar o respirador. Ele já chega com falta de ar, mas com os exercícios, às vezes obtemos sucesso e a pessoa não precisa de intubação. Não é o que acontece com maior frequência, por ser uma doença que evolui para um quadro mais grave muito rápido, conta.>
Por lei, explica Karina, as UTIs devem manter a presença de fisioterapeutas intensivistas durante 18h diárias. O que tem sido uma dificuldade para os hospitais, uma vez que há falta de profissionais no mercado, relata.>
No Hospital Jayme Santos Neves, onde atua, é responsável por cerca de 10 pacientes por plantão. Os plantões tem sido muito exaustivos por causa da gravidade dos casos. A gente já chega tendo que apagar incêndio, com parada cardíaca, vendo a saturação de uns, tendo que acordar outros da sedação. Tem sido muito corrido, conta.>
E há ainda, por parte de todos os profissionais de saúde, o medo. É visível nos olhos de todos. É a preocupação em se contaminar ou levar a doença para os familiares, explica. >
E há ainda o medo dos pacientes, principalmente os que chegam para serem sedados. O paciente mal consegue falar e já fica cansado. Mas é visível o medo no olhar dele. Nesta hora pedimos para confiar, para ficar tranquilo que vai conseguir vencer a doença, relata.>
Notou alguma informação incorreta no conteúdo de A Gazeta? Nos ajude a corrigir o mais rápido possível! Clique no botão ao lado e envie sua mensagem.
Envie sua sugestão, comentário ou crítica diretamente aos editores de A Gazeta