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Chargista Amarildo se despede da Rede Gazeta após 37 anos

Chargista Amarildo se despede da Rede Gazeta após 37 anos

Em conversa com o site, o também ilustrador fez um balanço da própria carreira e falou sobre as metas para o futuro; últimas charges serão veiculadas até o Natal, no dia 25, em A Gazeta

Publicado em 18 de dezembro de 2023 às 19:02

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Amarildo
Amarildo se despede da Rede Gazeta após 37 anos ininterruptos de trabalho. (Carlos Alberto Silva)
Maria Fernanda Conti
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Ouvindo o "tec-tec-tec" das máquinas de escrever e tendo à disposição apenas lápis e papel para retratar assuntos sensíveis aos capixabas. Foi sob esse contexto que o ilustrador e chargista Amarildo pisou pela primeira vez na Rede Gazeta, há mais de 30 anos.

Com charges que retrataram o cotidiano dos capixabas, ele figura na lista dos maiores ilustradores do Espírito Santo – mas cujo "barulho" chegou a ultrapassar as fronteiras nacionais. E após intensa dedicação, o artista deu adeus ao site A Gazeta. Entretanto, as últimas charges de Amarildo serão veiculadas até a próxima semana, com a "saideira" marcada para ocorrer no Natal, dia 25 de dezembro. Em 2024, ele pretende se dedicar a novos projetos. 

Trajetória

Nascido em Baixo Guandu, no interior do Estado, Amarildo cresceu perto de comunidades pesqueiras, ribeirinhas e de muitos artesãos. Um clima bucólico, aliás, que o inspira até hoje. Anos depois, resolveu ir morar em Vitória, para encontrar mais oportunidades de trabalho quando terminasse os estudos. Mas, antes de chegar à ilustração, o chargista teve dúvidas sobre qual carreira iria seguir.

Quando desembarcou na Capital, Amarildo decidiu ser engenheiro eletrônico, embora o curso não fosse ofertado na Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes) nos anos 1980. Partiu para a Física, onde permaneceu por um ano e meio. No entanto, ao invés de fazer contas ou gráficos, ele aproveitava os momentos dentro da sala de aula para desenhar.

Foi após ser pego rabiscando durante as disciplinas que a vida ganhou um novo rumo. Ao ver o talento do aluno, um professor do curso o encorajou a estudar Artes Visuais, também na Ufes. Embora tenha rejeitado a ideia de início, Amarildo resolveu arriscar. Graduou-se pouco tempo depois. Logo nos primeiros anos como profissional, foi indicado por uma professora e recebeu o convite para trabalhar na Rede Gazeta.

A partir dali, começou a tentar ser mais informado, para entrar, de fato, no universo jornalístico. Queria aguçar o olhar sobre os acontecimentos do mundo e passá-los para os leitores através das charges. Não demorou muito até o jeito tão particular de desenhar começar a invadir as casas dos capixabas, o que lhe rendeu reconhecimento, críticas e, além disso, 37 anos de trabalho ininterruptos em um mesmo veículo.

Charge "Sem Asas", feita por Amarildo em 2022, na ocasião da morte de Pelé. (Reprodução | Amarildo)

TV Gazeta

As últimas charges de Amarildo serão veiculadas em A Gazeta até a próxima semana, com a "saideira" marcada para ocorrer no Natal, dia 25 de dezembro. Confira abaixo um bate-papo com o artista sobre os principais desafios dos últimos anos, um balanço da própria trajetória e as metas para o futuro.

Você sente que conseguiu transmitir tudo o que queria?

Sim, sim. Eu deixo de fazer o trabalho no jornal muito agradecido, e muito feliz pela plenitude com que pude exercer meu trabalho aqui dentro. Saio com a sensação de dever cumprido. Estou feliz por fechar, parcialmente, um ciclo.

Qual foi o seu maior desafio nesses mais de 30 anos?

O desafio foi sempre fazer um trabalho que tivesse uma contundência, que não fosse agressivo e que atendesse ao nosso leitor da melhor maneira possível. Na busca por isso, fiz do meu trabalho uma batalha diária. Às vezes me perguntam: qual o seu horário de trabalho? E eu respondo que é de oito da manhã, até oito da noite. Estou muito tranquilo e realizado com o meu trabalho.

Você também acabou vivendo uma faca de dois gumes: a crítica de algumas pessoas, e o elogio de outras. Como fez para conciliar isso tudo?

Amarildo
Amarildo ganhou um quadro e recebeu o carinho dos colegas na despedida dele de A Gazeta. (Carlos Alberto Silva)

Os elogios a gente lê, aceita, agradece e nos faz muito feliz. As críticas, também recebemos, agradecemos e usamos como mais uma ferramenta para melhorar o trabalho. O elogio e a crítica servem para melhorar o trabalho. Uma coisa ruim é que nesses tempos de redes sociais tem uma coisa entre o elogio e a crítica chamada agressão. As agressões eu ignoro. Plenamente, tranquilamente.

E quais foram as mudanças nesse intervalo?

No início era grafite, né? Lápis comum, 2B. Nanquim, que era uma tinta preta que misturava com água. E eu criei uma técnica para fazer os meios tons, em que usava café. Misturava um pouco de café com nanquim que fazia uma 'aguada'. A redação, no início, usava só máquinas de datilografar. Muitas pessoas hoje nem sabem do que se trata, né? [...] Em 37 anos, as coisas mudam muito. Hoje, eu gero minhas referências usando o ChatGPT. Essa travessia foi longa e a gente teve que se adaptar. E uma adaptação não é fácil. As pessoas tendem a sair, mas eu, não. Sempre gostei da inovação, de coisas diferentes. Eu sempre estive à frente. Acho que fui uma das primeiras pessoas a comprar um iPad para desenhar na época – a muito custo, mas corri atrás, para estar nessa vanguarda. 

Quais foram as suas três charges mais marcantes, e por quê?

Não tenho. São 37 anos de trabalho, milhares de charges. Quando eu olho para trás, inclusive, não gosto de muitas coisas que produzi. E o volume é muito grande. Existem charges que gostei, mas a maioria não gostei, de fato. Fico pensando: ''faltou alguma coisa''. E não é nem perfeccionismo. É o 'chatismo' gritando (risos).

O que esperar da última charge de Amarildo em A Gazeta?

Olha, eu ainda não sei. Estou pensando. Como a charge é uma coisa diária, do momento, se eu falar uma coisa agora, provavelmente amanhã já estará velha. Só vou saber na véspera.

Então não será uma despedida?

Pode ser. Mas, também pode não ser (risos)

Quais são os seus próximos projetos?

Ainda vou continuar chargista por um tempo, trabalhando no meu site e na minha rede social. E como também sou artista plástico, vou montar, talvez, um estúdio. Na infância, antes de desenhar legal, eu também trabalhei com cerâmica. Então quero trabalhar com pintura, escultura e caricatura, que são coisas que me dão muito prazer.

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