Publicado em 18 de dezembro de 2023 às 19:02
Ouvindo o "tec-tec-tec" das máquinas de escrever e tendo à disposição apenas lápis e papel para retratar assuntos sensíveis aos capixabas. Foi sob esse contexto que o ilustrador e chargista Amarildo pisou pela primeira vez na Rede Gazeta, há mais de 30 anos. >
Com charges que retrataram o cotidiano dos capixabas, ele figura na lista dos maiores ilustradores do Espírito Santo – mas cujo "barulho" chegou a ultrapassar as fronteiras nacionais. E após intensa dedicação, o artista deu adeus ao site A Gazeta. Entretanto, as últimas charges de Amarildo serão veiculadas até a próxima semana, com a "saideira" marcada para ocorrer no Natal, dia 25 de dezembro. Em 2024, ele pretende se dedicar a novos projetos. >
Nascido em Baixo Guandu, no interior do Estado, Amarildo cresceu perto de comunidades pesqueiras, ribeirinhas e de muitos artesãos. Um clima bucólico, aliás, que o inspira até hoje. Anos depois, resolveu ir morar em Vitória, para encontrar mais oportunidades de trabalho quando terminasse os estudos. Mas, antes de chegar à ilustração, o chargista teve dúvidas sobre qual carreira iria seguir. >
Quando desembarcou na Capital, Amarildo decidiu ser engenheiro eletrônico, embora o curso não fosse ofertado na Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes) nos anos 1980. Partiu para a Física, onde permaneceu por um ano e meio. No entanto, ao invés de fazer contas ou gráficos, ele aproveitava os momentos dentro da sala de aula para desenhar. >
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Foi após ser pego rabiscando durante as disciplinas que a vida ganhou um novo rumo. Ao ver o talento do aluno, um professor do curso o encorajou a estudar Artes Visuais, também na Ufes. Embora tenha rejeitado a ideia de início, Amarildo resolveu arriscar. Graduou-se pouco tempo depois. Logo nos primeiros anos como profissional, foi indicado por uma professora e recebeu o convite para trabalhar na Rede Gazeta.>
A partir dali, começou a tentar ser mais informado, para entrar, de fato, no universo jornalístico. Queria aguçar o olhar sobre os acontecimentos do mundo e passá-los para os leitores através das charges. Não demorou muito até o jeito tão particular de desenhar começar a invadir as casas dos capixabas, o que lhe rendeu reconhecimento, críticas e, além disso, 37 anos de trabalho ininterruptos em um mesmo veículo.>
As últimas charges de Amarildo serão veiculadas em A Gazeta até a próxima semana, com a "saideira" marcada para ocorrer no Natal, dia 25 de dezembro. Confira abaixo um bate-papo com o artista sobre os principais desafios dos últimos anos, um balanço da própria trajetória e as metas para o futuro. >
Você sente que conseguiu transmitir tudo o que queria? >
Sim, sim. Eu deixo de fazer o trabalho no jornal muito agradecido, e muito feliz pela plenitude com que pude exercer meu trabalho aqui dentro. Saio com a sensação de dever cumprido. Estou feliz por fechar, parcialmente, um ciclo.>
Qual foi o seu maior desafio nesses mais de 30 anos?>
O desafio foi sempre fazer um trabalho que tivesse uma contundência, que não fosse agressivo e que atendesse ao nosso leitor da melhor maneira possível. Na busca por isso, fiz do meu trabalho uma batalha diária. Às vezes me perguntam: qual o seu horário de trabalho? E eu respondo que é de oito da manhã, até oito da noite. Estou muito tranquilo e realizado com o meu trabalho.>
Você também acabou vivendo uma faca de dois gumes: a crítica de algumas pessoas, e o elogio de outras. Como fez para conciliar isso tudo?>
Os elogios a gente lê, aceita, agradece e nos faz muito feliz. As críticas, também recebemos, agradecemos e usamos como mais uma ferramenta para melhorar o trabalho. O elogio e a crítica servem para melhorar o trabalho. Uma coisa ruim é que nesses tempos de redes sociais tem uma coisa entre o elogio e a crítica chamada agressão. As agressões eu ignoro. Plenamente, tranquilamente.>
E quais foram as mudanças nesse intervalo?>
No início era grafite, né? Lápis comum, 2B. Nanquim, que era uma tinta preta que misturava com água. E eu criei uma técnica para fazer os meios tons, em que usava café. Misturava um pouco de café com nanquim que fazia uma 'aguada'. A redação, no início, usava só máquinas de datilografar. Muitas pessoas hoje nem sabem do que se trata, né? [...] Em 37 anos, as coisas mudam muito. Hoje, eu gero minhas referências usando o ChatGPT. Essa travessia foi longa e a gente teve que se adaptar. E uma adaptação não é fácil. As pessoas tendem a sair, mas eu, não. Sempre gostei da inovação, de coisas diferentes. Eu sempre estive à frente. Acho que fui uma das primeiras pessoas a comprar um iPad para desenhar na época – a muito custo, mas corri atrás, para estar nessa vanguarda. >
Quais foram as suas três charges mais marcantes, e por quê?>
Não tenho. São 37 anos de trabalho, milhares de charges. Quando eu olho para trás, inclusive, não gosto de muitas coisas que produzi. E o volume é muito grande. Existem charges que gostei, mas a maioria não gostei, de fato. Fico pensando: ''faltou alguma coisa''. E não é nem perfeccionismo. É o 'chatismo' gritando (risos).>
O que esperar da última charge de Amarildo em A Gazeta?>
Olha, eu ainda não sei. Estou pensando. Como a charge é uma coisa diária, do momento, se eu falar uma coisa agora, provavelmente amanhã já estará velha. Só vou saber na véspera. >
Então não será uma despedida? >
Pode ser. Mas, também pode não ser (risos)>
Quais são os seus próximos projetos?>
Ainda vou continuar chargista por um tempo, trabalhando no meu site e na minha rede social. E como também sou artista plástico, vou montar, talvez, um estúdio. Na infância, antes de desenhar legal, eu também trabalhei com cerâmica. Então quero trabalhar com pintura, escultura e caricatura, que são coisas que me dão muito prazer.>
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