O Cordel do Cacau Desencantado contra a Bruxa e o Rio de Lama
Eu não creio em bruxa / Mas que ela existe, existe / Bruxa, lagarta, água suja / Estão nesta história triste / História de uma nobre fruta / Que, após intensa luta, / Em Linhares já não resiste
Ele já foi um dos principais produtos do setor agrícola capixaba. Atingiu o auge da produção em Linhares por volta do ano 2000. Mas, ao contrário dos chocolates de que é matéria-prima, os últimos 20 anos não foram nem um pouco doces para o cacau no Espírito Santo. Pragas, intempéries e até um rio de lama: tudo isso o cacau tem enfrentado, nesta saga que narramos abaixo, tomando emprestada a inspiração da literatura de cordel:
Eu não creio em bruxa Mas que ela existe, existe Bruxa, lagarta, água suja Estão nesta história triste História de uma nobre fruta Que, após intensa luta, Em Linhares já não resiste
De início, devo preveni-lo: Não é o Velho Testamento Não são as dez pragas do Egito Mas parece, em alguns momentos... No lugar do rio de sangue, Temos rio de lama (não do mangue) O Doce que virou amarguento
O nosso protagonista O auge, aqui, atingiu (Plantações a perder de vista) Por volta do ano 2000 Deixando o nosso Estado Como o 2° colocado Do Brasil (era muito plantio!)
Mas acabou-se o que era doce A fonte do chocolate Aos poucos morrendo foi-se De desastre em desastre Às margens do Rio Doce O nosso cacau amargou-se Desculpe, não posso enganar-te
Primeiro vieram as doenças As infestações, as pragas A produção despenca O cacauicultor amarga Após as pragas, a lama E assim, de drama em drama, A história virou uma saga
Pimeiro ela veio até nós Pondo fim a toda a sorte Não é o Mágico de Oz Mas eis a Bruxa do Norte! Chegou rindo, de vassoura, Acabando com a lavoura Levando o cacau à morte
Foi a vassoura-de-bruxa Que desceu lá da Bahia Em Linhares fez das suas Não deixou fio de alegria Causada por um fungo Secou tudo, secou tudo... E a decadência inicia
E a recuperação? Calma lá: Estamos vendo-a... Mas chega outra infestação Só para estragar as amêndoas A broca do cacau fulmina As plantas, traz nova ruína E o produtor já não aguenta...
Quando acaba esse drama Começa o pior dos mundos: O desastre de Mariana Chega para arrasar tudo E as pragas anteriores Vou lhes dizer, meus senhores, Pareceram algo miúdo
Rompe-se, pois, a barragem Da Vale, tragédia insana Que se soma à estiagem Eis o quadro, sente o drama: Quem não tem roça inundada Não consegue irrigar nada Falta água ou sobra lama
As águas ficam laranja Com os rejeitos de minério Tudo em farrapos, em franja O rio é um útero estéril E a produção à margem Vira só funesta imagem Após esse vitupério
Bruxas e outras pragas mais O cacau dignamente enfrentou Mas eram inimigos naturais O homem seu fim decretou Bruxa, lava ou lagarta Derrota-se. Aquilo que mata Somos nós mesmos, doutor!