Um país mais organizado é também um país sem fome

Governos em todas as esferas não podem se descuidar: justamente para evitar que se continue penalizando os mais pobres, o Brasil deve ter o compromisso com mais justiça econômica

Publicado em 21/09/2020 às 06h00
A crise provocada pela pandemia de Covid-19 aumentou a fome no Brasil e no mundo
A crise provocada pela pandemia de Covid-19 aumentou a fome no Brasil e no mundo. Crédito: Divulgação

disparada dos preços dos alimentos está fomentando discursos de todas as cores ideológicas em torno da atribuição de responsabilidades e competências. Na marcha da economia que se autorregula, persiste a convicção de que qualquer intervencionismo será letal para uma reacomodação dos valores.

O drama real, contudo, não ocorre nos andares mais altos das discussões macroeconômicas, mas no solo, onde  quem batalha em meio a tantas adversidades sucessivas para colocar comida na mesa sente diretamente os impactos do arroz vendido a preço de ouro, só para ficar naquele que se tornou o símbolo da carestia atual.

Não se deve fechar os olhos para o fantasma da fome no país. Mesmo que os números considerem o período entre junho de 2017 e julho de 2018, ainda sob o impacto da recessão que assolou o país na segunda metade da década, assusta saber que três a cada dez famílias no Espírito Santo se encontram em algum nível de  insegurança alimentar.  A Pesquisa de Orçamentos Familiares (POF 2017-2018), do IBGE, aponta que existem no Estado 45 mil lares em situação grave. 

No Brasil, já são 10,3 milhões de pessoas em situação de insegurança alimentar grave, em vias de atingir o patamar da fome, segundo a mesma pesquisa. O número indica um crescimento de 43,7% em relação a 2013, o que mostra um retrocesso indiscutível em cinco anos. E a pandemia de 2020 impõe mais algum suspense sobre a continuidade ou não desse avanço.

Um levantamento realizado pelo pesquisador Daniel Duque, do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (Ibre/FGV) usou dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio Covid 19 (Pnad Covid-19) de junho e conseguiu quantificar o impacto da crise sanitária na mobilidade social do país.

O resultado apontou que a faixa da população que vive em extrema pobreza foi a menor dos últimos 40 anos, entre os meses de maio e junho deste ano. Não é preciso fazer muito esforço para entender esse êxito: o período coincide com o auge do pagamento do auxílio emergencial, que atingiu mais de 65 milhões de brasileiros nos últimos meses.

Os dados mostram que a distribuição do benefício, mesmo que cercada de controvérsias quanto a valores e duração, foi fundamental para evitar uma tragédia social no país durante a pandemia. Conseguiu-se, assim, evitar a disseminação da fome entre as classes desfavorecidas, inclusive com o importante feito de encontrar grupos até então invisíveis para o cadastro do governo. Contudo, o auxílio emergencial só vigora até dezembro, e mesmo assim com metade do valor original. O assombro da fome, assim, pode ter seu retorno.

Governos em todas as esferas não podem se descuidar: justamente para evitar que se continue penalizando os mais pobres, o país deve ter o compromisso com mais justiça econômica, o que só se atinge com menos gastos destinados a privilégios e supérfluos.

As reformas (tributáriaadministrativa e a já aprovada previdenciária) têm foco em campos específicos, mas seus fins são basicamente os mesmos: reconstruir o Estado brasileiro para que, além de mais equânime, seja fértil ao desenvolvimento econômico que gere empregos e oportunidades. Um país mais organizado é também um país sem fome.

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