Publicado em 23 de setembro de 2020 às 15:13
O ministro Paulo Guedes (Economia) informou a aliados que sua equipe deve discutir com ministros do Palácio do Planalto nomes indicados por políticos do centrão. Os congressistas têm interesse em ocupar cargos de estatais e outros órgãos.>
O movimento ocorre após a saída de Salim Mattar (ex-secretário de Desestatização), integrante da equipe de Guedes responsável por privatizações e por barrar indicações consideradas perigosas -de candidatos sem experiência para o cargo ou com ficha criminal.>
Salim saiu há pouco mais de um mês em meio ao esgotamento da vontade do governo em privatizar e ao conflito entre a agenda de Guedes e os interesses políticos de Bolsonaro, que busca a reeleição e acena ao centrão.>
A saída de Salim ocorreu com a de Paulo Uebel (também ex-secretário especial de Guedes), no episódio chamado publicamente pelo ministro de debandada da pasta.>
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Guedes confirmou os pedidos de demissão na sequência de uma reunião com o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), e com o líder do PP na Casa, deputado Arthur Lira (AL).>
A avaliação oficial do trabalho de Salim é que não houve privatizações conforme esperado, mas também não houve escândalos no período. Agora, a visão é que Salim saiu e o centrão chegou.>
Por isso, Guedes avalia uma atuação dos novos secretários especiais com a ala militar do governo. O objetivo é que os currículos dos indicados sejam analisados em conjunto para verificar se eles têm perfil adequado ao exigido pela vaga e também se há registros criminais.>
A equipe seria liderada por dois membros da equipe econômica e dois ministros palacianos. Entre os integrantes do Planalto, ficariam responsáveis Walter Braga Netto (Casa Civil) e Luiz Eduardo Ramos (Secretaria de Governo).>
Ramos é responsável direto pela negociação entre governo e Congresso. Mais recentemente, inclusive, ele passou a cuidar da agenda econômica na interlocução com congressistas (no lugar do próprio Ministério da Economia).>
Já no time de Guedes, os responsáveis pelas avaliações seriam os novos secretários especiais Caio Andrade (de Desburocratização, Gestão e Governo Digital) e Diogo Mac Cord (de Desestatização). Justamente os nomes que substituíram Uebel e Salim, respectivamente.>
O quarteto substituiria a tarefa de Salim, que costumava se encontrar mais de uma vez ao mês com o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) para conversas no Palácio do Planalto.>
Era comum Salim levantar a ficha corrida dos candidatos aos cargos para questionar as indicações, além de verificar se uma determinada pessoa tinha formação profissional para determinada vaga.>
Conforme a versão oficial, Salim foi colocado para cuidar das estatais justamente porque a Localiza, locadora de veículos fundada por ele, tinha governança considerada boa.>
A visão oficial no ministério é que a indicação política não necessariamente significa permitir a entrada de criminosos no governo e que, em muitos casos, é necessário indicar algum nome.>
Segundo essa visão, políticos do Nordeste, por exemplo, poderiam indicar engenheiros daquela região para conduzir trabalhos, como obras de infraestrutura.>
Salim saiu do governo, segundo ele, por avaliar que seu esforço pelas privatizações dali em diante seria muito grande em comparação ao resultado. Para ele, as vendas não andaram conforme o planejado por culpa do "establishment".>
Hoje, o ex-secretário é mais explícito ao culpar também o presidente por não privatizar empresas que precisam apenas de aval do Executivo.>
"Depende só dele. Falta vontade", disse Salim na segunda-feira (21) em live com Marcos Cintra, ex-secretário especial da Receita Federal, em evento promovido pelo Instituto Indigo (do PSL).>
"Bolsonaro foi cercado por assessores e ministros que o influenciam. A influência do Guedes transformando Bolsonaro num liberal teve como contraefeito uma série de outros assessores e ministros tirando dele [presidente] a ideia liberal, levando para a social-democracia intervencionista, estatista, de gastar mais do que pode e de fazer obra", afirmou.>
Segundo disse Salim, cinco bancos não serão mais privatizados. São eles Basa (Banco da Amazônia), BNB (Banco do Nordeste), Caixa, Banco do Brasil e BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social).>
Cintra também lamentou que o presidente tenha abandonado as ideias de Guedes. "É resultado dessa fé débil do presidente nesses conselhos liberais", disse Cintra.>
A visão oficial no ministério, segundo interlocutores, é que adversários e até a própria imprensa teriam "empurrado" Bolsonaro para o centrão ao discutirem a possibilidade de impeachment. Por esse motivo o presidente teria, conforme essa interpretação, procurado sustentação política.>
Para amarrar a base de apoio para que suas propostas avancem no Congresso, Bolsonaro negocia com representantes de partidos como PP e Republicanos, que integram o centrão em troca de cargos ou de verbas em obras em seus redutos eleitorais.>
Hoje, a interlocução política do governo é feita entre o ministro Ramos, o deputado Ricardo Barros (PP-PR), o senador Fernando Bezerra (MDB-PE) e o senador Eduardo Gomes (MDB-TO).>
Os três últimos são líderes do governo na Câmara, no Senado e no Congresso, respectivamente. Eles têm influência nas discussões com o deputado Arthur Lira (PP-AL) e o senador Ciro Nogueira (PP-PI).>
O movimento em torno das indicações acontece após um enfraquecimento político de Guedes no governo.>
Enquanto divide o ônus do tema com o Planalto, também estaria fazendo um aceno aos ministros palacianos nas escolhas.>
Guedes teve atritos com ministros militares durante a pandemia, como na formulação do plano Pró-Brasil -programa que teria obras públicas, algo que contraria o chefe da equipe econômica.>
Antes da eleição, Bolsonaro disse que trataria de votações diretamente com os parlamentares, "evitando a liderança partidária que hoje em dia ainda funciona como um sindicato, que, de acordo com o número de deputados, aquele líder partidário procura o governo e fala 'eu quero tantos ministérios, eu quero diretoria de estatais, diretoria de bancos oficiais' e, daí, o problema vem".>
Mas a situação política de Bolsonaro se agravou, e o presidente começou a conversar com dirigentes partidários sobre o tema.>
"Conduzi a conversa ao longo dos dois últimos meses. Conversei com praticamente todos os presidentes e líderes de partidos. Sim, alguns querem cargos, não vou negar. Alguns, não são todos", disse em sua live de 28 de maio deste ano.>
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