É corretor e empresário do setor imobiliário com mais de 35 anos de experiência no mercado capixaba, gestor de empresas que integram a maior rede imobiliária do mundo.

A transformação da moradia no século XXI

A casa, afinal, é o museu da sua vida. De que adianta viver em ambientes impessoais, onde não se reconhece a identidade do morador?

Vitória
Publicado em 19/09/2025 às 10h11
Transformação do século XXl
As plantas dos imóveis no Brasil ainda carregam resquícios de um pensamento do século XVIII. Crédito: Shutterstock

A moradia sempre esteve na base da pirâmide de Maslow, a teoria psicológica que organiza as necessidades humanas, das mais básicas até as de realização pessoal. É uma necessidade essencial, tão vital quanto alimento e segurança. Não importa se falamos de um simples casebre de estuque ou de um palácio revestido em ouro e vidro: é nesse espaço que encontramos o nosso habitat, o nosso castelo.

O fato é que, ao longo do tempo, esse castelo mudou de forma. As plantas dos imóveis no Brasil ainda carregam resquícios de um pensamento do século XVIII, com espaços destinados a empregados, áreas de serviço desproporcionais e ambientes sociais compartimentados.

Quem conhece os antigos apartamentos da Praia do Canto sabe bem: cozinhas escondidas, quartos de empregada lá no canto, sem janelas, área de serviço gigantes, plantas de 80 metros quadrados onde, de área útil, mal sobravam 50. Projetos mal resolvidos, preconceituosos, talvez até mesmo burros. Mas os hábitos mudaram. A sala de televisão, que um dia foi símbolo de status, desapareceu. O quarto de empregada, idem.

Salões de festas imensos e quase sempre vazios perderam espaço para áreas realmente utilizadas. A pandemia, apesar da tragédia que representou, serviu como um despertar coletivo: as pessoas entenderam que a vida não é infinita, que o tempo urge. Descobriram que o dinheiro parado no banco não gera alegria, mas o investimento em um bom imóvel, sim, traz usufruto diário e valor seguro. Essa mudança de consciência se refletiu na arquitetura.

Onde antes havia salões de festas abandonados, surgiram academias. Em um prédio antigo onde morei na Praia do Canto, um espaço morto se transformou, de repente, no lugar mais frequentado do edifício. Isso é wellness, isso é qualidade de vida. Uma tendência que não exige milhões, apenas visão.

Outro exemplo emblemático é a cozinha. Antes relegada ao fundo do apartamento, escondida, ela hoje ocupa a frente. E faz todo o sentido. Afinal, ninguém passa a vida olhando a vista da janela da suíte, mas todos se reúnem em torno da mesa. A cozinha tornou-se o coração da casa, integrada à sala e, muitas vezes, à varanda. Ali, a vida acontece.

É ali que a família se encontra, que os amigos se reúnem, que a casa pulsa. Esse movimento revela uma nova lógica: a funcionalidade acima da estética. A beleza continua relevante, mas em segundo plano. O que importa é a usabilidade, a fluidez do dia a dia. Como disse Oscar Niemeyer, “a decoração estraga o imóvel”.

A casa, afinal, é o museu da sua vida. De que adianta viver em ambientes impessoais, onde não se reconhece a identidade do morador? O mercado imobiliário ainda sofre desse mal apesar da mudança: imóveis que parecem clones, sem alma. Precisamos resgatar a consciência de projetar e habitar de forma autêntica.

As moradias devem refletir quem somos, acolher nossos rituais, contar nossas histórias. Se quisermos um futuro de mais qualidade de vida para nossos filhos e netos, é hora de abandonar os modismos e adotar projetos verdadeiramente humanos. O século XXI já mostrou que a moradia deixou de ser apenas abrigo. Ela é, cada vez mais, o espelho do nosso tempo, dos nossos valores e da nossa forma de viver.

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