É advogado especialista em direito tributário, CEO da Caetano e Caetano Advogados Associados. Neste espaço, aborda questões relevantes do direito tributário e seus impactos para o contribuinte brasileiro

Bitributação em debate: a polêmica inclusão da CBS e do IBS no ICMS

Tal postura, adotada inclusive por Pernambuco e São Paulo, revela uma interpretação que contraria a lógica de simplificação e racionalização do sistema, perpetuando a sobreposição de tributos e a insegurança jurídica que a reforma busca mitigar

Vitória
Publicado em 07/12/2025 às 05h05

A bitributação é um dos desafios mais persistentes e prejudiciais do sistema tributário brasileiro. Ela ocorre quando dois entes federativos, União, estados ou municípios cobram tributos distintos sobre o mesmo fato gerador. Esse fenômeno decorre tanto da fragmentação das competências tributárias previstas na Constituição Federal quanto da falta de uniformidade nas legislações locais, o que abre brechas para interpretações conflitantes e disputas arrecadatórias.

Na prática, a bitributação cria insegurança jurídica, amplia custos operacionais para empresas e contribuintes, e estimula uma verdadeira corrida entre estados e municípios na tentativa de maximizar suas receitas, mesmo que isso comprometa a coerência do sistema.

Um dos exemplos mais recorrentes é o conflito entre o ISS, de competência municipal, e o ICMS, de competência estadual. Em atividades como comunicação, softwares, construção civil e transportes, a linha que separa serviço de mercadoria é frequentemente tênue, o que leva ambos os entes a reivindicarem o direito de tributar.

Nesse cenário de complexidade e sobreposição, a reforma tributária surge como uma resposta estruturada para eliminar a bitributação e simplificar o sistema. O modelo aprovado adota o IVA Dual, com a criação da CBS (de âmbito federal) e do IBS (gerido por estados e municípios). Esses tributos unificam diversos impostos que incidem sobre bens e serviços como ICMS, ISS, PIS, COFINS e IPI sob regras únicas, transparentes e harmonizadas em todo o território nacional.

A principal inovação trazida por esse modelo é a incidência no destino e a não cumulatividade plena. Isso significa que o imposto será cobrado no local onde o consumo ocorre, e não onde a produção é realizada, eliminando incentivos para guerras fiscais e reduzindo drasticamente disputas sobre competência tributária. Ao mesmo tempo, a existência de legislações padronizadas para o IBS garante que estados e municípios perderão a capacidade de criar normas próprias que geram divergências e conflitos.

Na contramão do espírito da reforma tributária, algumas unidades federativas já sinalizaram a intenção de incluir a CBS e o IBS na base de cálculo do ICMS. Tal postura, adotada inclusive por Pernambuco e São Paulo, revela uma interpretação que contraria a lógica de simplificação e racionalização do sistema, perpetuando a sobreposição de tributos e a insegurança jurídica que a reforma busca mitigar.

São Paulo, por exemplo, entende que o ICMS deve ter sua base de cálculo formada pelo valor total da operação, incluindo todos os tributos que compõem o preço. O entendimento afirma que o IBS e a CBS, criados pela Emenda Constitucional nº 132/2023 como parte da reforma tributária do consumo, integram esse valor quando se tornarem efetivamente exigíveis.

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Reforma tributária. Crédito: Shutterstock

Pernambuco, por sua vez, em sua fundamentação sustenta uma interpretação estrita da legislação vigente. A Sefaz-PE argumenta que, na ausência de uma norma expressa em contrário, prevalece o disposto no art. 13 da Lei Complementar n. 87/96 (Lei Kandir). Para o órgão “a base de cálculo do ICMS é o valor da operação, o que inclui o montante de outros tributos incidentes.

Salvo melhor juízo, a conclusão adotada por alguns estados mostra-se totalmente equivocada. É importante destacar que o STF, na chamada “tese do século”, firmou entendimento pela exclusão do ICMS da base de cálculo do PIS e da Cofins. Assim, qualquer tentativa de ampliar a base de cálculo do próprio ICMS sem respaldo legal tende a ser questionada e, inevitavelmente, levada ao Judiciário. Em última análise, o STF tem reiterado posição contrária a iniciativas meramente arrecadatórias que desvirtuam o sistema tributário e afrontam a segurança jurídica.

Este texto não traduz, necessariamente, a opinião de A Gazeta.

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