É advogado. Doutor e Mestre em Direito pela Universidade de São Paulo (USP)

Quem precisa da liberdade de imprensa?

O jornalismo paregórico, no estilo “assessoria de imprensa”, não corre qualquer risco de perseguição e não necessita de proteção nenhuma

Vitória
Publicado em 23/11/2023 às 00h40

Quando os poderes instituídos, o governo, membros do ministério, ou do partido no poder, executam manobras, e se valem das posições nas quais instituídos para atacar a liberdade de imprensa, temos sim uma ameaça grave à democracia

A liberdade de imprensa é um dos pilares da República, e de toda e qualquer democracia que já se estabeleceu no planeta Terra. O artigo 5º, IX, da Constituição estabelece a liberdade da “expressão da atividade intelectual (...) independentemente de censura ou licença”.

Assim como a liberdade de expressão, a liberdade de imprensa não existe como garantia constitucional para proteger os sujeitos que pretendem se manifestar de modo ameno, equilibrado ou favorável aos poderes instituídos. Ao contrário, faz sentido prático apenas se pretender proteger o indivíduo que se manifesta contra o poder, contra os representantes eleitos, criticando sua atuação, informando a respeito de relações promíscuas ou mesmo lenientes com o crime, e expondo o que – na visão de quem o declara – seriam graves faltas de caráter ou de moral.

Afinal, o jornalismo paregórico, no estilo “assessoria de imprensa”, não corre qualquer risco de perseguição e não necessita de proteção nenhuma. Quem, de fato, precisa recorrer à garantia constitucional é sempre o indivíduo que apresenta visão “alternativa à explicação ou versão estatal”.

No histórico julgamento da ADF 130, o Supremo Tribunal Federal consagrou a noção de que a garantia da liberdade de imprensa tem como objetivo, exatamente, a contraposição do Estado e da narrativa daqueles instituídos o poder. O voto do ministro Carlos Britto carrega um certo grau de poesia ao reconhecer a “a imprensa como alternativa à explicação ou versão estatal de tudo que possa repercutir no seio da sociedade e como garantido espaço de irrupção do pensamento crítico em qualquer situação ou contingência”. Para arrematar:

“O corpo normativo da Constituição brasileira sinonimiza liberdade de informação jornalística e liberdade de imprensa, rechaçante de qualquer censura prévia a um direito que é signo e penhor da mais encarecida dignidade da pessoa humana, assim como do mais evoluído estado de civilização”.

No precedente, há clara correlação entre essa garantia e o pensamento crítico. Pensar criticamente é ter a capacidade de nadar contra a corrente, diferentemente de assumir um esquadro ideológico previamente formatado. Pensamento crítico é conceito relativo, e depende do ambiente no qual se o expressa.

Aqueles que no passado buscavam sua liberdade para contrariar as versões oficiais e trazer os fatos de acordo com aquilo que entendiam como verdade podem hoje estar em posição antagônica, serem os titulares das versões oficiais no governo, nas universidades. Importante que tenham em mente que a liberdade de expressão e a liberdade de imprensa, tanto antes como hoje, estão relacionadas ao direito de discordar e desafiar o poder instituído. Não existe, afinal, censura do bem.

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