
Comprei uma placa daquelas decorativas, feita de acrílico, letras brancas em alto relevo e, sobre um fundo vermelho vivíssimo, um pedacinho do verso famoso:
- O que a vida quer da gente é coragem.
É um clichê, eu sei. Mas mal não há de fazer. Seu cantinho vai ser entre os livros, eles que também impulsionam os dias em que a firmeza engasga, a determinação desaparece, o chão parece fora do lugar.
Às vezes a ausência está em pequenas coisas, na força para levantar cedo e cuidar dos músculos, ossos e articulações; no corpo que demora a obedecer quando o despertador toca; na disposição de olhar primeiro para si, depois para o restante.
Às vezes o buraco é mais embaixo, e a gente não sabe se toma a decisão que deve, apesar das consequências, ou se espera, até que a bravura baste.
Tem dias em que a coragem falta em pitadas: experimentar um ingrediente fora da receita, combinar estampas descombinadas, deixar o carro em casa e pedalar por ruas cheias de imprudência.
Tem dias que são justo o oposto, e ela desaparece diante de feitos que entregariam tudo não fosse a vitória do medo.
Nos dias em que falta coragem, a gente não sabe se pede trégua aos autoritários, sossego aos inconvenientes, afeto aos amargos, paz aos incendiários ou se enfrenta, um por um, o autoritarismo, a inconveniência, a amargura, os incêndios.
Vai ver o que falta é tomar o impulso dos passos iniciais, querer de fato, saber das metas, analisar os objetivos, pensar nos propósitos, avaliar as possibilidades e começar, como se qualquer dia fosse um auspicioso primeiro de janeiro.
Vai ver o que falta é lembrar que Guimarães Rosa sabia mesmo das coisas:
- O correr da vida embrulha tudo, a vida é assim: esquenta e esfria, aperta e daí afrouxa, sossega e depois desinquieta. O que ela quer da gente é coragem.
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