Advogado trabalhista, coordenador do curso de especialização em Direito do Trabalho da FDV e torcedor fervoroso do Botafogo. Neste espaço, oferece uma visão crítica e abrangente para desmistificar os conceitos trabalhistas e promover um entendimento mais profundo das dinâmicas legais das relações de trabalho

Deixem o trabalhador escolher

O trabalhador deve ter o direito de escolher o modelo de vínculo que melhor se adapta à sua realidade — e não ser refém de um sistema ultrapassado que confunde proteção com controle

Vitória
Publicado em 21/10/2025 às 04h00

A CLT não detém — nem nunca deteve — o monopólio sobre as relações de trabalho no país. Reduzir o trabalho brasileiro ao molde único da CLT é ignorar a própria história da sua transformação. O Supremo Tribunal Federal (STF), em diversas decisões, tem reafirmado que há espaço legítimo para diferentes formas de relação laboral, desde que pautadas na transparência, na boa-fé e sem qualquer intenção de fraudar direitos.

O verdadeiro desafio contemporâneo não está em preservar estruturas antigas, mas em adaptar o Direito do Trabalho à complexidade das novas formas de produção e autonomia profissional. O país precisa decidir se deseja olhar para frente — acompanhando o mundo real — ou permanecer preso à nostalgia de um modelo que já não reflete a pluralidade produtiva de hoje.

O Sindfer argumentou na Justiça do Trabalho que as demissões violavam dispositivos da CLT
CLT ou PJ: é preciso adaptar o Direito do Trabalho à complexidade das novas formas de produção e autonomia profissional. Crédito: Divulgação

A tentativa de recolocar a CLT como único caminho legítimo para as relações de trabalho não representa um avanço social, mas sim um retrocesso ideológico. A terceirização, a pejotização e outras modalidades contratuais não são sinônimo de precarização — são expressões da liberdade econômica, da autonomia profissional e da maturidade das relações produtivas.

O discurso contrário a esses modelos costuma vir embalado como “defesa do trabalhador”. Mas, na prática, o que se quer é proteger as finanças da Previdência Social, não o cidadão que trabalha. Trata-se de uma tentativa de preservar a arrecadação de um sistema que há décadas é mal administrado e que agora quer transferir sua conta para quem menos deveria pagá-la: o próprio trabalhador.

É justo que aquele que dedica o seu suor e o seu tempo para sustentar sua família seja obrigado a financiar os erros de gestão de um Estado ineficiente? Essa conta deve ser dele?

O trabalhador é — e deve ser — livre para escolher como quer se relacionar com o trabalho. Cabe a nós, como sociedade, garantir a ele e ao contratante segurança jurídica, clareza de regras e respeito às opções legítimas. Mas há um ponto que raramente se ouve dos chamados “salvadores dos trabalhadores”: educação.

É dela que nasce a verdadeira autonomia. É a educação que dá ao cidadão a capacidade de entender as consequências das suas escolhas, de planejar o próprio futuro e de transitar entre diferentes formas de inserção no mercado sem medo e sem manipulação. Se o cidadão optar por ser CLT ou PJ, não há pecado nisso. E transitar de um modelo para outro, muito menos.

O verdadeiro pecado é retirar a liberdade e a autonomia do cidadão sob o verniz ideológico de uma tutela estatal que já não serve ao seu propósito. Porque, como canta Toquinho, “o futuro é uma astronave que tentamos pilotar” — e ele deve ser guiado por quem trabalha, não por quem insiste em controlar o destino dos outros no conforto de uma sala com ar-condicionado.

Este texto não traduz, necessariamente, a opinião de A Gazeta.

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