Publicado em 11 de janeiro de 2021 às 08:27
- Atualizado Data inválida
O ministro da Justiça e Segurança Pública, André Mendonça, afirmou neste domingo (10) que vai requisitar a abertura de inquérito policial para apurar publicações de dois jornalistas neste fim de semana. >
A declaração foi dada após a publicação de texto do colunista do jornal Folha de S.Paulo Ruy Castro com o título "Saída para Trump: matar-se". O autor afirma que, se o presidente americano optar pelo suicídio, Jair Bolsonaro (sem partido) deveria imitá-lo.>
Outro jornalista alvo das críticas é Ricardo Noblat, da revista Veja. Em rede social, ele compartilhou um link para o texto de Castro e reproduziu alguns trechos.>
"Alguns jornalistas chegaram ao fundo do poço. Hoje dois deles instigaram dois presidentes da República a suicidar-se. Apenas pessoas insensíveis com a dor das famílias de pessoas que tiraram a própria vida podem fazer isso", escreveu Mendonça em uma rede social.>
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O ministro chamou as publicações de crimes contra chefes de Estado e de desrespeito à pessoa humana e à nação.>
"Por isso, requisitarei a abertura de inquérito policial para apurar ambas as condutas. As penas de até 2 anos de prisão poderão ser duplicadas (§ 3º e 4º do art. 122 do Código Penal), sem prejuízo da incidência de outros crimes", escreveu Mendonça, ainda na rede social.>
André Mendonça
Ministro da Justiça e Segurança PúblicaO artigo citado pelo ministro diz que "induzir ou instigar alguém a suicidar-se ou a praticar automutilação ou prestar-lhe auxílio material para que o faça" geraria pena de reclusão de 6 meses a 2 anos.>
O parágrafo 3º do artigo afirma que a pena é duplicada se o crime é praticado por motivo egoístico, torpe ou fútil ou se a vítima é menor ou tem diminuída a capacidade de resistência.>
Já o parágrafo 4º diz que a pena é aumentada até o dobro se a conduta é realizada por meio da internet, de rede social ou transmitida em tempo real.>
Não é a primeira vez que Mendonça pede abertura de inquéritos contra profissionais da imprensa.>
Em junho de 2020, o próprio Noblat foi alvo de um pedido de apuração feito pelo ministro à Polícia Federal e ao Ministério Público Federal com base na Lei de Segurança Nacional (LSN), após o jornalista ter compartilhado a imagem de uma charge do cartunista Aroeira que ilustrava Bolsonaro pintando uma suástica nazista.>
À época, Noblat disse que o governo estava usando a LSN para perseguir críticos.>
No mês seguinte, Mendonça requisitou a abertura de um inquérito pela PF, com base na mesma lei --um resquício da ditadura militar--, para investigar o colunista da Folha de S.Paulo Hélio Schwartsman em razão de um artigo publicado no jornal.>
O texto "Por que torço para que Bolsonaro morra" foi publicado depois de o presidente anunciar que havia contraído o novo coronavírus.>
No mês seguinte, o ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ) Jorge Mussi suspendeu o inquérito para investigar Schwartsman. Mussi atendeu a um pedido da Folha de S.Paulo e concedeu liminar que suspendia o procedimento até o julgamento do habeas corpus.>
Em nota, a Folha de S.Paulo afirmou que, "como no caso de texto anterior de Hélio Schwartsman, que teve inquérito aberto pelo mesmo ministro e depois suspenso pelo STJ, o colunista emitiu uma opinião; pode-se criticá-la, mas não investigá-la".>
Questionado pelo UOL, Castro afirmou: "Foi só uma sugestão para Trump e Bolsonaro, eles não precisam aceitar. E todos vamos morrer um dia, não? Além disso, não sou coveiro", parafraseando declaração de Bolsonaro sobre a pandemia do coronavírus.>
Luis Mileo, professor de direito penal do Instituto Brasileiro de Mercado de Capitais (Ibmec-SP), afirma que não há crime nas publicações. "Absolutamente nada. Nada, nada, nada.">
Segundo ele, os jornalistas só poderiam ser apontados como infratores do artigo 122 se enviassem diretamente a Bolsonaro uma ou mais mensagens para que ele se suicidasse - e não escrever em uma publicação que o presidente poderia ou não acessar.>
"O direcionamento da minha informação teria que ser direto, teria que induzir ou instigar alguém diretamente. Ele não está falando diretamente ao Bolsonaro, está escrevendo em uma matéria", diz.>
O professor ressalta ainda que a mensagem teria de ser apta o suficiente para que a pessoa realmente sofresse a influência dessa informação.>
"Tem que ser uma mensagem absolutamente idônea e capaz. Tenho que buscar uma vítima propensa a isso. Sem isso, jamais eu conseguirei levar adiante o plantar da ideia. A vítima tem que ser receptiva e apta a sofrer influência dessa informação.">
"A requisição de inquérito por parte do ministro é absolutamente inviável. Porque a informação não é apta e idônea a levar adiante uma ação por parte da vítima, que seria em tese o Bolsonaro, e não é direta. Vejo como uma matéria crítica, mas jamais criminosa", afirma Mileo.>
Outros membros do governo criticaram as publicações de Castro e Noblat.>
Luis Mileo
Professor de direito penal"Criminoso e canalha, que atenta contra o país, afetando a segurança nacional. Isso deve ser repudiado não só pela Veja, mas também por todos os brasileiros. São pessoas que fomentam a guerra e o caos", escreveu o ministro das Comunicações, Fábio Faria, que disse ainda que incitação ao suicídio é crime e discurso de ódio.>
A ministra Damares Alves (Mulher, Família e Direitos Humanos) defendeu que a conta de Noblat no Twitter fosse encerrada. "Além do mais incitar o suicídio é crime!", escreveu.>
Noblat teve suas postagens sobre o tema apagadas pelo Twitter. Segundo a empresa, as postagens violaram as regras de uso da rede social.>
Além disso, suas funções foram desabilitadas pela rede social e ele ficou sem poder tuitar, retuitar ou curtir nada por até 12 horas.>
Procurado, o Twitter Brasil afirmou que "tem regras que determinam os comportamentos e conteúdos permitidos na plataforma, e violações a essas regras estão sujeitas às medidas cabíveis".>
A rede social apontou que tem entre suas diretrizes regras que não permitem "se envolver no assédio direcionado a alguém nem incitar outras pessoas a fazer isso". O Twitter não informou se o jornalista teve espaço para se defender.>
A revista Veja chegou a afirmar que repudia com veemência a declaração de seu colunista. "Não achamos que esse tipo de opinião contribua em nada para a análise política do país", publicou a revista em rede social.>
Noblat enfatizou que apenas reproduziu o conteúdo do texto de Castro. "Não desejo a morte de ninguém. Minha religião o impediria", publicou em rede social após a repercussão.>
"Mas, ao fazer, como faço aqui, um clipping diário da mídia, não posso nem devo ignorar o que me pareça que repercutirá, mais ainda quando publicado em um grande jornal. Seria uma forma odienta de autocensura", afirmou Noblat. "Por fim: vida longa ao presidente Jair Bolsonaro para que ele possa colher o que plantou", escreveu.>
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