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É médico sanitarista e secretário de Estado da Saúde do Governo do Espírito Santo

Secretário de Saúde lista 4 cenários para o futuro da pandemia no ES

Neste artigo, Nésio Fernandes explica que, ao observar as perspectivas, vale considerar o comportamento das ameaças que podem fornecer subsídios para o gerenciamento da crise

  • Nésio Fernandes de Medeiros Junior É médico sanitarista e secretário de Estado da Saúde do Governo do Espírito Santo
Publicado em 14/05/2021 às 02h03
À frente da Secretaria Estadual de Saúde (Sesa), está o secretário Nésio Fernandes
O secretário Nésio Fernandes está à frente da Secretaria Estadual de Saúde (Sesa). Crédito: Divulgação | Secretaria de Saúde do Espírito Santo

Estado do Espírito Santo vislumbra três cenários possíveis para os próximos 60 dias no comportamento da pandemia da Covid-19 e um quarto cenário que pode ocorrer ao longo da evolução da pandemia ainda este ano no Espírito Santo e no Brasil.

Para considerar estes cenários, é importante entender a curva sazonal de doenças infecciosas respiratórias no Estado, a dinâmica das interações sociais, a organização dos serviços de saúde, a repercussão da cobertura vacinal e levar em conta o comportamento do vírus e suas variantes.

Até a semana epidemiológica 25 (20 a 26/06/2021), viveremos ainda o período de sazonalidade das síndromes respiratórias graves, quando a transmissão de doenças respiratórias, como Influenza, é mais frequente.

Nos últimos três anos, julho foi o mês com padrão de recuperação da incidência das doenças respiratórias graves. Em 2020, a Covid, durante sua primeira onda, também seguiu esse padrão de recuperação - que ocorreu na segunda quinzena de julho.

Se o padrão de sazonalidade observado na primeira onda (abr-jul/20) e na terceira onda (fev-mai/21) for preservado, mantendo as características já conhecidas do comportamento epidemiológico das cepas circulantes no Espírito Santo e no mundo, poderemos ter os seguintes cenários:

Primeiro, uma estabilidade na curva de novos casos com pequenas oscilações em diferentes períodos em microrregiões do Estado e com predominância das variantes originárias na transmissão comunitária. Devemos dar atenção à região de montanhas, às rotas rodoviárias nacionais e também à Grande Vitória. Esse cenário exige alta adesão ao uso de máscaras, ampla testagem de casos respiratórios/contatos, respeito aos protocolos/distanciamento e avanços na vacinação. 

No segundo cenário, poderemos viver uma nova onda de casos, com muitos registros novos, porém sem a ampla repercussão na internação de idosos e de pessoas com comorbidades, que já estariam imunizadas. Neste cenário, também haveria predominância das variantes originárias na transmissão comunitária. A ampliação das interações sociais no período sazonal incrementa o risco de nova expansão.

Em um terceiro cenário, também é possível uma nova onda de casos, porém com impacto de internações/óbitos afetando a população não vacinada entre 30-59 anos de idade, com predominância de novas variantes, semelhante ao que ocorreu nos Estados do Sul, Minas Gerais São Paulo, dadas a maior internação e gravidade observadas nessa faixa etária com algumas destas novas variantes.

E, por fim, um quarto cenário possível, não restrito à territorialidade do Espírito Santo e aos próximos 60 dias, seria aquele caracterizado por uma nova onda por introdução de nova variante com escape vacinal (variante sul-africana ou outra nova), atingindo população já coberta pela vacinação. Novas variantes já existem e estão em plena circulação intercontinental.

Diante de novidades e incertezas, vale aprofundar nossa análise sob alguns aspectos. Alguns desses passam pelas medidas de proteção. Máscaras funcionam e todas incrementam algum grau de proteção e barreira física. Quanto maior o poder filtrante (PFF2/N95), melhor a eficácia da proteção. O uso massivo de máscaras possui efeito redutor coletivo na velocidade de transmissão do vírus e protetor individual de quem usa.

Máscaras do tipo N95 (equivalentes às PFF2 brasileiras) — Foto:
Quanto maior o poder filtrante (PFF2/N95), melhor a eficácia da proteção . Crédito: CDC/Pexels

Vacinas evitam individualmente casos, internações e óbitos, no entanto, como estratégia coletiva a cobertura alcançada no Brasil e no Espírito Santo não é suficiente para bloquear a circulação comunitária do vírus e reduzir drasticamente a incidência de novos casos. No entanto, a cobertura vacinal da população idosa, que mais foi afetada pela pandemia, deverá repercutir na redução da mortalidade desse grupo etário, com redução de óbitos/internações desses em novas fases de aceleração.

Ao observar os cenários possíveis, vale considerar o comportamento das ameaças que podem nos fornecer subsídios para o gerenciamento dessa crise. Algumas respostas precisam ser comunicadas.

Somente com novas variantes é que teremos novas ondas?

Não. As interações sociais na população suscetível em ambiente de circulação das cepas originárias por si só são capazes de alimentar novas expansões da doença.

A predominância de novas variantes na transmissão comunitária é evitável?

Sim. Com o uso de massivo de máscaras, etiqueta respiratória, distanciamento, vacinação, isolamento de sintomáticos/contatos e testagem em massa é possível controlar a transmissão das diversas cepas.

O tratamento e a prevenção são diferentes dependendo da cepa?

Até agora não. Trata-se da mesma doença, com as mesmas formas de transmissão e que são evitáveis com as medidas já conhecidas.

A qualidade da atenção básica pode influenciar no comportamento da pandemia evitando ou atrasando novas ondas?

Sim, principalmente nos momentos de “cava” (nível mais baixo entre duas ondas), com foco no diagnóstico precoce com isolamento de sintomáticos e rastreamento de contatos.

É possível proteger o meu município se o vizinho estiver crítico?

Depende do grau de conurbação e do padrão de interação social. Pequenos municípios com ampla capacidade de testagem e isolamento poderão ter melhor desempenho que grandes cidades do Estado. Quanto maior o grau de integração na ação política regional e uniformidade das medidas qualificadas de enfrentamento a pandemia, melhor será a capacidade de enfrentar novas ondas.

Quanto tempo dura o efeito da quarentena?

 Não é possível precisar, temos muitas variáveis. Entendemos que ela interrompe o mecanismo de aceleração da curva, caracterizado pelo crescimento exponencial de casos e acelera a fase de recuperação. Não é sustentável em longo prazo e não tem efeito protetor pleno nos contextos de descontrole pandêmico como o caso brasileiro. Ampla testagem associada a duros fechamentos temporários foram capazes de controlar focos iniciais da transmissão na China.

A melhora do padrão de testagem pode desenhar uma nova onda sem repercussão proporcional de internações e óbitos?

Sim. É possível que a massificação dos testes de RT-PCR e antígeno melhorem a capacidade de observar o comportamento real de casos sintomáticos e assintomáticos, sem representar necessariamente uma nova onda de casos, internações e óbitos, especialmente na percepção da positividade de contatos assintomáticos.

Já ter vivido três ondas e com o avanço da vacinação da população será possível já ter alcançado algum grau de "imunidade de rebanho" no Espírito Santo?

Cenário pouco provável, incerto e perigoso. Não deve ser considerado para tomada de decisão, podendo colocar em risco toda a comunidade.

De uma coisa sabemos. A forma mais segura e eficiente de proteção contra diversas doenças é a vacinação e há evidências incontestáveis quanto à segurança oferecida a quem se imuniza. Se chegar a sua vez de se vacinar, vacine-se. Não arrisque trocar a vacina pelo ventilador pulmonar.

Use máscara. Se tiver sintomas, isole-se e procure a atenção básica para testar e ser avaliado por um profissional da saúde. Não participe de atividades sociais com aglomerações. Não acabou. Adote a disciplina nas medidas de prevenção e proteção. O comportamento de alto risco aumenta a probabilidade de infecção, mesmo em contextos de baixo risco.

Este texto não traduz, necessariamente, a opinião de A Gazeta.

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