É sabido por todos que a imigração sempre foi um tema controverso e central na política americana. Contudo, nos últimos anos, a questão ganhou uma nova perspectiva, com ênfase após a posse de Donald Trump como presidente em detrimento de sua postura radicalmente diferente de seus antecessores, visando fortalecer o controle imigratório.
Assim, as medidas adotadas impactam de forma significativa a vida de milhões de imigrantes residentes no país, especialmente daqueles que se encontram em situação irregular.
Nesse contexto, é impreterível a contextualização das políticas de imigração americanas, bem como do direito dos Estados Unidos enquanto Estado de deportar os imigrantes ilegais, e da mesma forma reconhecer a necessidade de um tratamento digno durante o deporte, com respeito aos direitos humanos e às obrigações internacionais pactuadas.
De acordo com a Constituição dos Estados Unidos, no Art. 1°, Seção 8, o país possui o direito resguardado de proteger suas fronteiras e regular livremente a entrada e a permanência de estrangeiros em seu território, permitindo que o Congresso estabeleça as regras necessárias para a naturalização e a imigração no país.
Além disso, a Lei de Imigração e Nacionalidade (Immigration and Nationality Act - INA), a legislação imigratória fundamental nos EUA, estabelece que a entrada no país sem o devido processo legal é passível de deportação. Portanto, o deporte de estrangeiro que esteja nos EUA sem permissão legal não possui qualquer ilegalidade.
No entanto, embora os Estados Unidos tenham o direito de deporte, é fundamental que esse processo seja conduzido de forma que respeite os princípios dos direitos humanos, conforme previsto em convenções internacionais.
Nesse sentido, a Convenção Americana sobre Direitos Humanos, à qual os EUA permanecem signatários, estabelece que a deportação não deve resultar em tratamento ultrajante, conforme o Art. 5°, que assegura a inviolabilidade da dignidade humana.

Da mesma forma, a Declaração Universal dos Direitos Humanos, no Art. 9°, estabelece que ninguém poderá ser arbitrariamente preso, detido ou exilado. Assim, é imperativo que os imigrantes ilegais, ao serem deportados, não sejam tratados de forma degradante, visto que tratar imigrante irregular com viés criminoso de forma arbitrária é imputar ao indivíduo estigma social e situação desumana.
Assim, durante a administração de Trump, as condições nos centros de detenção, a separação de famílias e o tratamento impiedoso geraram indignação tanto no cenário internacional quanto nacional por irem além de mera desídia. Com a utilização de “cercas de arame” e prisões superlotadas em situações precárias para imigrantes, tornou-se contraditória a relação entre o direito de deportação do Estado e a necessidade de respeito à dignidade humana, uma vez em que o deporte em massa sem a devida consideração dos direitos individuais contrasta com os princípios fundamentais do direito internacional.
Por isso, é impreterível destacar que os Estados Unidos possuem uma obrigação internacional de acolher imigrantes refugiados, conforme pactuado pela Convenção das Nações Unidas sobre o Estatuto dos Refugiados de 1951, da qual o país é assinante. Nesse viés, o Art. 33 da convenção proíbe a deportação de refugiados para países onde sua vida ou liberdade estariam ameaçadas, seja por motivos de raça, religião, nacionalidade, grupo social ou opiniões políticas.
Portanto, enquanto os Estados Unidos têm o direito de deportar imigrantes ilegais, eles também têm a responsabilidade de proteger aqueles que estão fugindo de conflitos armados ou perseguições.
Dessa forma, a política de "tolerância zero" de Trump, apesar de ser legalmente respaldada no que tange ao endurecimento das normas de asilo, seu excesso é uma violação direta aos direitos humanos pois, ao negar acolhimento às pessoas que fogem de situações de perigo, o governo americano não cumpre seu compromisso internacional de proteção, além de contrariar os princípios constitucionalmente consagrados, que afirmam a necessidade de garantir um devido processo legal e o direito a um julgamento justo, conforme estipulado na Quinta Emenda.
No debate sobre a imigração, um ponto pilar é o tratamento desigual entre imigrantes ilegais e indivíduos acusados de crimes, situações jamais análogas. A retórica de Trump frequentemente associa imigrantes ilegais a criminosos, criando uma dicotomia entre "bons" e "maus" imigrantes, além de fomentar um desnecessário terror social generalizado ao criar a personificação de um inimigo nacional, tal como fizera o ex-presidente George W. Bush ao criar a “Guerra ao Terror” no início dos anos 2000, criando sentimento de ódio aos islâmicos e muçulmanos após o ataque às torres gêmeas, fenômeno que promoveu discursos de ódio e xenofobia no país.
No entanto, é necessário ressaltar que, de acordo com a Constituição dos Estados Unidos, em sua Quarta Emenda, todos os indivíduos, independentemente de seu status migratório, têm direito ao devido processo legal e devem ser tratados com dignidade, repelindo “buscas e apreensões irregulares”.
Assim, deportar imigrantes ilegais não deve ser confundido com punição à indivíduos que cometeram crimes graves uma vez em que, o fato de um indivíduo estar em situação irregular não o torna automaticamente culpado de atos criminosos e, portanto, a aplicação das leis de imigração não deve ser utilizada de maneira punitiva ou discriminatória.
Por outro lado, o Brasil tem sido exemplo no assunto, pela adoção de diversas práticas benéficas aos imigrantes. Dessa forma, a Constituição Brasileira de 1988, no Art. 3º, estabelece que um dos objetivos fundamentais da República é "consolidar a justiça social", e no Art. 5º, garante a inviolabilidade dos direitos humanos, estabelecendo que "ninguém será submetido à tortura nem a tratamento desumano ou degradante".
Além disso, a Lei nº 13.445/2017, a Lei de Imigração do Brasil, reafirma o compromisso do país com os direitos dos imigrantes, garantindo acesso à saúde, à educação e à dignidade para os que buscam refúgio, sem discriminação.
Nesse viés, o Brasil tem se destacado por adotar uma postura mais acolhedora em relação aos imigrantes, especialmente em comparação com políticas mais restritivas de países como os Estados Unidos. Contudo, isso não significa que o Brasil esteja livre de desafios, como a discriminação contra imigrantes, a escassez de recursos para acolher um número crescente de refugiados e as dificuldades logísticas para garantir o cumprimento dos direitos dos imigrantes.
Porém, mesmo com aperfeiçoamentos a serem feitos, a legislação brasileira reflete um compromisso com os princípios de solidariedade internacional, que também deveriam ser seguidos pelos Estados Unidos.
Em um contexto globalizado de crescente migração, é essencial que grandes potências como os Estados Unidos equilibrem o direito de controlar suas fronteiras com a responsabilidade de garantir que o processo de deportação respeite os direitos humanos.
Logo, a utilização de medidas de deportação deve ser conduzida de maneira transparente, garantindo que os direitos dos imigrantes ilegais não sejam violados, com tratamento distinto do aplicado a criminosos.
Assim, para harmonia entre a sociedade e o Estado, é impreterível que ambas as partes priorizem o respeito e a boa-fé, sempre reconhecendo os limites de seus direitos e a necessidade de cumprir com os seus deveres.
Por fim, as lições que devem ser aprendidas da política de imigração dos Estados Unidos, com suas falhas e excessos, são inúmeras, pois todos os países devem sempre buscar a construção de um sistema de imigração que respeite os direitos humanos, que acolha de maneira digna os imigrantes e que trate todos os indivíduos com equidade e justiça, independentemente de sua origem pátria.
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