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Cuidados paliativos: precisamos derrubar tabus e falar a respeito

Pelo preconceito que envolve o termo, profissionais de saúde cada vez mais trazem à tona essa discussão, a fim de melhorar a qualidade de vida do paciente e de seus familiares, diante de uma doença que ameace a vida

  • Marina de Loureiro Maior É médica
Publicado em 09/06/2021 às 14h01
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Cuidados paliativos buscam alívio para dor do paciente e apoio para a família. Crédito: Stories/ Freepik

Em nosso idioma, o termo paliativo é um adjetivo referente àquilo que tem a qualidade de acalmar, abrandar temporariamente um mal ou protelar uma crise. Em geral, quando utilizamos o termo “paliativo”, a palavra sugere que estamos mediante uma situação em que não há mais nada definitivo a ser feito, estamos fazendo uma “gambiarra” ou algo que só trará um benefício temporário.

Pelo preconceito que envolve o termo, sobre essa ideia de que “não há mais nada a ser feito”, profissionais de saúde que trabalham na área dos Cuidados Paliativos vêm cada vez mais trazendo à tona a discussão para a sociedade médica/civil sobre o que realmente seriam tais cuidados.

Longe de ser sinônimo de eutanásia ou suicídio assistido, os Cuidados Paliativos são aqueles em que, segundo a definição da Organização Mundial de Saúde (OMS) em conceito definido em 1990 e atualizado em 2002, deve haver assistência promovida por uma equipe multidisciplinar. O objetivo é a melhoria da qualidade de vida do paciente e de seus familiares, diante de uma doença que ameace a vida, por meio da prevenção e do alívio do sofrimento, avaliação impecável e tratamento de dor e demais sintomas físicos, sociais, psicológicos e espirituais.

Ainda segundo o Instituto Nacional de Câncer (INCA), a abordagem paliativa deve seguir sempre os seguintes princípios gerais: alívio para dor e outros sintomas, reafirmação da vida e da morte como processos naturais, integração dos aspectos psicológicos, sociais e espirituais ao estado clínico do paciente, e a oferta de um sistema de apoio para ajudar a família a lidar com a doença do paciente, auxiliando-o a viver o mais ativamente possível até sua morte. Além disso, abarca também a utilização de uma abordagem interdisciplinar, incluindo o aconselhamento e suporte ao luto e, principalmente, não apressar ou adiar a morte.

Em meio a tantos avanços tecnológicos na medicina e com o envelhecimento da população, urge trazermos esta temática para discussão, a fim de divulgarmos as reais indicações dos cuidados paliativos, esclarecendo a sociedade e sensibilizando os profissionais da área da saúde acerca do assunto. Essa abordagem visa não somente a evitar a prática de terapias ineficientes, como também proporcionar aos pacientes portadores de doença sem possibilidade de cura, e aos seus familiares, o cuidado mais adequado.

Cabe ressaltar que tais cuidados devem sempre se basear nos princípios básicos da Bioética: a não maleficência, que visa a oferecer o menor prejuízo ao indivíduo; a beneficência, em que há a obrigação ética de maximizar o benefício e minimizar o prejuízo; a autonomia que deve sempre promover aos indivíduos capacitados de deliberarem sobre suas escolhas pessoais, e ainda, que os mesmos devam ser tratados com respeito pela sua capacidade de decisão.

Devemos sempre ressaltar que todas as pessoas têm o direito de decidir sobre as questões relacionadas ao seu corpo e à sua vida. Além desses citados, devemos sempre nos basear no princípio da justiça, que estabelece como condição fundamental da equidade a obrigação ética de tratar cada indivíduo conforme o que é moralmente correto e adequado. O médico deve atuar com imparcialidade, evitando ao máximo que aspectos sociais, culturais, religiosos, financeiros ou outros interfiram na relação médico-paciente.

Em meio à pandemia da Covid-19, com a escassez de recursos em muitos países e tendo em vista que a parcela da população que apresentava o maior risco de morte era a de idosos, fez-se necessária mais uma vez a discussão acerca dos Cuidados Paliativos e da sua oferta a pacientes já sem indicação de terapias curativas. Sabendo-se que o atendimento por equipes especializadas em Cuidados Paliativos favorece um fim de vida com maior qualidade, é de suma importância a sua divulgação, quer seja para profissionais de saúde, quer seja para o público leigo. O conhecimento dessa abordagem poderá ser sempre uma ferramenta de discussão entre paciente e médico, permitindo ao paciente fazer as escolhas mais adequadas e de acordo com o que ele acredita ser o melhor para si.

Ao se falar de Cuidados Paliativos, cabe ressaltar que, em 2020, o Estado de São Paulo teve promulgada a lei 17.292, que instituiu a Política Estadual de Cuidados Paliativos. A divulgação de leis como essa traz a nós, profissionais de saúde que trabalhamos nesta área, a esperança de que cada vez mais a sociedade traga à tona essa discussão, conheça efetivamente o que são os Cuidados Paliativos e, assim, informados sobre todas as possibilidades terapêuticas, possam enfim exercer o princípio da autonomia e decidir junto aos seus médicos o que é plausível e factível em seus casos.

Saber o que é melhor para si até o fim de nossas vidas é mais que um direito. Deve ser realmente um dever. Vamos falar sobre isso?

Este texto não traduz, necessariamente, a opinião de A Gazeta.

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